O governo decidiu abrir negociação com sindicatos e poderá sacrificar a MP (medida provisória) que proíbe o desconto automático da contribuição que incide sobre a folha salarial.
Lideranças das principais centrais dizem que, do jeito que está, a MP pode asfixiá-las. Por isso, pressionam seus parlamentares a barganhar um acordo com o governo em troca da reforma da Previdência.
Neste momento, lideranças parlamentares e assessores do governo afirmam que não se trata de uma troca. Reconhecem, no entanto, que a oposição à MP uniu as centrais e os deputados que representam a causa trabalhista no Congresso, e esse bloco pode atrapalhar o avanço da Previdência.
Na segunda-feira (29), o presidente Jair Bolsonaro se reuniu com o dirigente nacional da UGT, Ricardo Patah, e prometeu marcar uma reunião com técnicos do governo para, segundo o sindicalista, "abrir diálogo". A UGT é a mais próxima do governo entre as grandes centrais. "Essa MP é péssima para o movimento sindical, é inconveniente. O ideal seria que ela caducasse", disse Patah.
Publicada em março, a medida provisória 873 não tem comissão instalada, presidente nem relator. O prazo para o governo aprová-la no Congresso expira no início de julho. Aliados já avaliam deixá-la expirar e, após a tramitação da Previdência, apresentar um projeto de lei tratando do assunto.
O Ministério da Economia, responsável pela formulação da MP, resiste, e a líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP), promete desengavetar o projeto indicando um relator ainda nesta semana. A maioria dos líderes partidários é contra a volta do imposto sindical, afirmou ela.
A MP foi apresentada pelo governo para fechar brechas usadas por sindicatos e empresas para burlar o fim do imposto sindical, eliminado na reforma trabalhista. A contribuição passou a ser optativa e feita com autorização prévia dos trabalhadores.
Alguns sindicatos, porém, interpretaram que a autorização pode ser feita por meio de assembleias da categoria sem a necessidade do consentimento de cada trabalhador. Eles negociaram essas condições com os patrões em acordos coletivos firmados no segundo semestre de 2018.
Os bancos, por exemplo, acordaram descontar automaticamente 1,5% do salário dos funcionários para se livrar do pagamento de gratificação sobre horas extras. Esse é um dos principais motivos que levam os bancos a serem processados na Justiça do Trabalho.
O acordo foi feito após a Vale obter autorização do Tribunal Superior do Trabalho para descontar em folha uma contribuição sindical equivalente à metade de um dia de trabalho, após negociar com sindicatos de ferroviários.
Embora representasse 50% do antigo imposto sindical, a contribuição foi descontada automaticamente, ferindo o princípio da reforma trabalhista, de acordo com o Ministério da Economia.
Por pressão do secretário especial da Previdência, Rogério Marinho – que foi relator da reforma trabalhista –, Bolsonaro baixou então a MP. Ela estipula que a autorização deve ser individual, e o pagamento, feito por boleto bancário. Com isso, tanto a Vale quanto os bancos suspenderam o repasse, o que está sufocando os sindicatos.
O presidente da UGT considera que a MP é péssima para o movimento sindical, mas afirma que, se a negociação com o governo seguir adiante, exigirá a retirada da contribuição por boleto (mantendo o desconto em folha) e que as regras das relações entre patrões e empregados sejam definidas por livre negociação. "A Constituição diz que o governo não pode interferir em questões sindicais", disse Patah.
Segundo o advogado Otavio Pinto e Silva, professor da USP e sócio do escritório Siqueira Castro, empresas que acordaram recolher a contribuição fizeram valer outro pilar da reforma trabalhista: a prevalência do negociado sobre o legislado. Ou seja, tem mais poder o acordado entre patrões e empregados do que a própria lei.
Por isso, sindicatos já recorreram ao STF para invalidar a medida provisória, alegando sua inconstitucionalidade. "Estamos em um momento de insegurança jurídica, as empresas não sabem se devem ou não descontar a contribuição", disse Silva, que tem entre seus clientes companhias que negociaram o recolhimento da contribuição em folha.
A reportagem consultou os principais bancos do país. Bradesco, Itaú e Santander disseram que a Febraban, que representa o setor, se manifestaria.
Via assessoria, a federação disse que os bancos cumprem a lei trabalhista em vigor e que não comentaria sobre a MP. A Vale informou que interrompeu em fevereiro o recolhimento da cota negocial.
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