O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, que sofreu impeachment depois de ser alvo da Operação Placebo.| Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
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Desde o começo da pandemia de Covid-19 até hoje, os órgãos públicos do Brasil já editaram mais de 4.800 atos normativos – entre medidas provisórias, decretos e leis – para facilitar o combate ao coronavírus no Brasil, de acordo com o CERI.LAB, Centro de Estudos em Regulação e Infraestrutura da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Muitos desses atos, necessários, entre outras coisas, para agilizar processos no momento de emergência sanitária, ajudaram a salvar vidas. Mas também deixaram brechas para a corrupção.

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Até o dia 20 de abril deste ano, a Polícia Federal já tinha deflagrado 77 operações contra a corrupção relacionada ao uso de recursos para enfrentamento à pandemia. O montante total dos contratos investigados totalizava R$ 2,27 bilhões.

A maior fatia desse valor vem da Operação Placebo, que envolve R$ 835 milhões de contratos com supostas irregularidades vinculados ao enfrentamento da pandemia no estado do Rio de Janeiro. Foi por causa dos desdobramentos dessa operação que Wilson Witzel (PSL) deixou o cargo de governador do Rio.

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“Quando você não tem licitação, tem uma vulnerabilidade nesses gastos”, diz Roberto Livianu, fundador do Instituto Não Aceito Corrupção e procurador de Justiça em São Paulo. A falta de transparência na prestação de contas, segundo ele, ocasionou “uma situação de verdadeira terra sem lei”.

Segundo a ONG Transparência Internacional, o Rio de Janeiro tem o terceiro pior portal de transparência entre as 27 unidades federativas do Brasil, atrás somente de Acre, pior colocado, e Piauí, segundo pior. Os estados mais transparentes são Alagoas, Ceará, Espírito Santo e Rondônia.

“Essa pandemia nos deixa um legado triste de má gestão, de falta de seriedade, de falta de competência e, infelizmente, de muita corrupção. Um legado desastroso, que vai gerar um número gigantesco de investigações”, afirma Livianu.

Conheça os principais casos que já estão sendo investigados pela Polícia Federal, em ordem de quantidade de recursos desviados.

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Operação contra corrupção no Rio derrubou governador

Uma das primeiras ações policiais relacionadas com a pandemia foi a Operação Placebo, deflagrada em maio de 2020. É o maior esquema de corrupção que veio à tona até agora no Brasil durante a pandemia.

O esquema envolve o Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde (Iabas), uma organização social contratada para a instalação de hospitais de campanha, e sua relação com servidores da cúpula da gestão do sistema de saúde do estado do Rio de Janeiro.

Entre as irregularidades estão orçamentos fraudados para serviços de montagem e desmontagem de tendas, instalação de caixas d’água, geradores de energia e piso para os hospitais de campanha.

Ao ex-governador Witzel, que sofreu impeachment em abril de 2021, foram imputados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) “indícios de participação ativa quanto ao conhecimento e comando das contratações realizadas com as empresas hora investigadas, mesmo sem ter assinado diretamente os documentos, uma vez que sempre divulgou todas as medidas em sua conta no Twitter".

Doze mandados de busca e apreensão foram cumpridos no Rio de Janeiro e em São Paulo pela Operação Placebo. Além de Wilson Witzel, a ex-primeira-dama do Rio Helena Witzel é suspeita de envolvimento no caso.

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Operação S.O.S., no Pará e em São Paulo

A Operação S.O.S., envolvendo contratos no valor de R$ 500 milhões, foi deflagrada em setembro de 2020. Mais de 64 pessoas foram presas temporariamente e 237 mandados de busca e apreensão foram cumpridos em Belém e alguns municípios do interior do Pará, além de diversas cidades do interior de São Paulo, como Araçatuba.

Os desvios na área da saúde envolvem, entre outros, os hospitais de campanha montados para enfrentamento da Covid-19. O grupo envolvido nas denúncias já atuava antes da pandemia, e era investigado pela Polícia Federal desde agosto de 2019.

Entre os crimes cometidos estão fraudes em licitações, falsidade ideológica, peculato, corrupção passiva, corrupção ativa, lavagem de dinheiro e organização criminosa.

Operações Contágio e Entre Amigos, em São Paulo e Minas

Uma das operações deflagradas mais recentemente, em abril de 2021, foi a Operação Contágio, que investiga irregularidades em contratos de cerca de R$ 100 milhões. Os desvios teriam ocorrido em recursos para saúde nos municípios de Hortolândia, Embu das Artes e Itapecerica da Serra, no interior paulista. Crimes de peculato, fraude em licitação, lavagem de dinheiro e organização criminosa são investigados.

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Uma organização social que firmou os contratos estava subcontratando diversas empresas sem nenhuma experiência na área de saúde. Algumas delas fizeram centenas de saques em espécie para burlar o controle contra lavagem de dinheiro do sistema financeiro nacional. Segundo a Polícia Federal, o transporte do dinheiro era feito sob escolta armada de um guarda civil municipal que era sócio de uma das empresas subcontratadas.

A Operação Contágio cumpriu cinco mandados de prisão temporária e 38 mandados de busca e apreensão nos estados São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.

Em dezembro de 2020, uma organização social responsável pela gestão de um hospital de campanha no município de Divinópolis (MG) também foi suspeita de desvios em contratos de valor em torno de R$ 100 milhões, o que fez a PF deflagrar a Operação Entre Amigos.

Análises da Controladoria Geral da União (CGU) identificaram indícios de superfaturamento, além de suspeita de favorecimento da Secretaria Municipal de Saúde de Divinópolis no processo de qualificação da organização social em questão.

A Entre Amigos resultou em quatro mandados de prisão temporária, 26 mandados de busca e apreensão, 50 quebras de sigilo fiscal e bancário, um afastamento de função pública, quatro afastamentos do exercício de atividade econômica, além do congelamento imediato de recursos no valor de mais de R$ 2 milhões de nove empresas investigadas.

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Para Bellum, Desvid-19, Sangria e Vírus Infectio: as operações no Norte

A região Norte do Brasil foi alvo de várias operações policiais relacionadas à pandemia nos últimos meses.

Uma delas, a Para Bellum, investiga o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), entre outras pessoas. A operação foi deflagrada em junho de 2020 e envolve um contrato de R$ 50,4 milhões sem licitação. Segundo a PF, metade do valor total da compra de respiradores teria sido paga de forma antecipada, mas os aparelhos foram entregues com grande atraso, eram diferentes do modelo comprado e não serviam para o tratamento da Covid-19.

Já o governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), é alvo da Operação Sangria, que já teve três fases, ocorridas em junho, outubro e novembro de 2020. Entre os crimes apurados estão associação criminosa, corrupção, fraude em licitação e desvio de recursos públicos federais repassados para o combate à pandemia.

A PF chegou a pedir ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) a prisão de Lima. Mas o STJ negou. Na primeira fase da operação, foi determinado o bloqueio de R$ 2,9 milhões em bens de 13 pessoas físicas e jurídicas. Foram cumpridos oito mandados de prisão de pessoas que integram ou integraram o governo do Amazonas.

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Em Roraima, ocorreu em outubro a operação Desvid-19, que apura indícios de irregularidades em contratações feitas com dinheiro público que teriam gerado sobrepreço de quase R$ 1 milhão em ações de combate à pandemia do coronavírus. As contratações suspeitas de irregularidades envolveriam aproximadamente R$ 20 milhões.

No Norte do Brasil também ocorreu uma das primeiras grandes operações policiais sobre desvio de recursos da pandemia: a Vírus Infectio, no Amapá, deflagrada em três fases, começando em abril de 2020. Os contratos investigados totalizam R$ 6,8 milhões. Entre outras irregularidades, a Vírus Infectio apontou variações de até 814% no preço de máscaras compradas pelo fundo estadual de saúde no Amapá.

Operação Pleumon: governador de SC foi alvo de operação contra a corrupção

No começo de maio, o governador de Santa Catarina, Carlos Moisés (PSL), escapou por um voto de sofrer impeachment. Ele respondia a processo por crime de responsabilidade pela compra de 200 respiradores no valor de R$ 33 milhões que não foram entregues pela empresa Veigamed, contratada pelo governo catarinense.

O processo contra Moisés começou na Operação Pleumon, deflagrada em setembro pela PF. São investigados crimes de fraude em licitação, peculato, corrupção, concussão, organização criminosa e lavagem de dinheiro.

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