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Líderes do governo já admitem que algumas pautas que estavam sendo negociadas pelo Palácio do Planalto com o Congresso Nacional poderão ser travadas por causa da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid. O grupo que irá investigar as possíveis omissões da gestão do presidente Jair Bolsonaro e de estados e municípios na condução da pandemia será instalado na próxima semana e deverá seguir como foco pelos próximos 90 dias.
O principal empecilho para a tramitação de matérias deverá ocorrer no Senado, onde a CPI da Covid irá funcionar. Na Casa, projeto como o BR do Mar, a discussão sobre o novo Refis e até uma proposta que poderia permitir a compra de vacinas pela iniciativa privada deverão ser suprimidos pelas investigações contra o governo federal.
Aguardando para ser analisado desde dezembro de 2020, o BR do Mar (PL 4.199 de 2020), é tido como prioridade pelo Executivo. A medida altera as regras para o transporte de cabotagem –navegação entre portos– no país. A ideia é ter mais concorrência e ampliar o uso da modalidade.
A base governista vinha desde o último mês tentando levar o tema para votação do plenário do Senado, no entanto, o acordo acabou sendo deixado de lado após a decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou a instauração da CPI. Além disso, um impasse sobre a redação final do projeto ainda não foi superado.
O Ministério da Infraestrutura tem defendido que o BR do Mar seja aprovado pelo Senado na forma como foi votado pelos deputados, pois uma eventual mudança faria com que o texto retornasse à Câmara. Na contramão, senadores afirmam que não serão “carimbadores”.
“Tem pontos do projeto BR do Mar que devem ser melhorados. O setor nacional se arrebenta com esse projeto, você tem vários investimentos que foram feitos com o modelo legislativo em vigor e que de uma hora pra outra você muda”, defende o líder do DEM, senador Marcos Rogério (RO).
Na mesma linha, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), vinha defendendo que a Casa aprovasse um pacote de socorro às empresas neste momento da pandemia. Entre essas medidas, a edição de um novo programa de renegociação de dívidas tributárias (Refis) vinha sendo estudado junto ao Ministério da Economia.
A ideia de Pacheco era incluir as medidas em um projeto apresentado por ele mesmo em 2020. O relator da proposta é o senador Fernando Bezerra (MDB-PE), líder do governo no Senado. A articulação com os senadores chegou a avançar logo depois do feriado de Páscoa, mas acabou recuando nos últimos dias.
Compra de vacinas pelo setor privado enfrenta “resistências”
Além desses projetos, outra matéria que trata da compra de vacinas contra a Covid-19 pelo setor empresarial tem enfrentado resistências por parte dos senadores. O texto foi aprovado pelos deputados no começo de abril após uma articulação entre o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco com representantes do mercado financeiro.
O texto prevê que empresas privadas podem comprar imunizantes com aval de uso concedido por qualquer autoridade sanitária estrangeira "reconhecida e certificada" pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O dispositivo libera a compra mesmo sem o consentimento da Anvisa, que faz análises próprias sobre segurança e eficácia de vacinas ainda que elas já tenham sido aprovadas em outros países.
Em jantar com diversos empresários, também neste mês, o presidente Jair Bolsonaro sinalizou que iria defender a proposta. O setor empresarial argumenta que com a compra de imunizantes poderia vacinar seus funcionários e com isso acelerar a retomada da economia.
Agora, segundo o presidente do Senado, a matéria ainda está em análise pelos parlamentares. "Esse projeto está sendo discutido ainda no âmbito do colégio de líderes do Senado. Reconheço muita resistência dos senadores em relação ao andamento do projeto. Mas estamos trabalhando no diálogo, no colégio de líderes, para avaliar a oportunidade de pauta no Senado Federal", disse Pacheco na última semana após reunião no Palácio do Planalto.
CPI da Covid vai impactar nas reformas
Autor de um requerimento que pede o adiamento da CPI da Covid para outubro, o senador Luiz do Carmo (MDB-GO) afirma que haverá um “tumulto” nas votações do Senado neste momento. Apesar de defender as investigações, o emedebista argumenta que, neste momento, outras matérias deveriam ser privilegiadas pela Casa.
“Justamente por esse motivo (não votação de matérias) que pedi para adiar a CPI para outubro. No meu entender não é hora de fazer CPI, pois ela vai tumultuar o ambiente que já está terrível. Temos pautas importantes para votar, mas que serão deixadas de lado, pois todo mundo vai querer saber o que está acontecendo na CPI”, avaliou o senador.
A mesma ideia é defendida pelo senador Ângelo Coronel (PSD-BA), suplente da CPI da Covid e presidente da CPI Mista (CPMI) das Fake News, que está suspensa desde abril do ano passado por conta da pandemia. “Defendo que iniciemos os trabalhos para ouvir todos os convocados assim que a pandemia desacelerar em nosso país”, disse.
Para a senadora Simone Tebet (MDB-MS), líder da bancada feminina, por conta das crises e do curto período de tempo não haverá mais espaço para avançar com reformas como a Administrativa e a Tributária. Além disso, a emedebista avalia que falta interesse do governo federal.
“A diferença desse momento para o momento que aprovamos a reforma da Previdência é muito grande. Temos agora a dificuldade de um governo que está enfraquecido e um governo que está diante de posicionamentos tão equivocados em relação à pandemia. Temos um governo que não tem planejamento, não tem vontade política de fazer mais, a não ser questões pontuais visando 2022”, avaliou Tebet durante live da XP Investimentos.
O senador Esperidião Amin (PP-SC) também avalia que reformas e matérias que não sejam consenso não deverão avançar no período em que a CPI da Covid estiver em funcionamento. Entretanto, o parlamentar acredita que outros temas como o Refis, por exemplo, poderão ter celeridade na Casa.
“Claro que pode surgir uma faísca na comissão da Covid, principalmente como começar a disputa política. Vai incomodar e haverá controvérsia. Mas acho que isso não vai impedir uma agenda econômica se desenvolva no Senado. É mais fácil se debater um Refis ou outra pauta que tenha como foco a geração de empregos. Agora debater uma reforma como a tributária, por exemplo, é complicado”, afirmou Amin.