Deputados oposicionistas, como Rui Falcão e Luzianne Lins, têm ditado o ritmo da comissão.| Foto: Jane de Araújo/Agência Senado

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Fake News, que integra Câmara dos Deputados e Senado, nasceu sob contestação de apoiadores do governo de Jair Bolsonaro (PSL), que veem nesse movimento uma tentativa de criar um "tribunal de exceção". A ideia de uma comissão para investigar a disseminação de supostas notícias falsas durante o período eleitoral foi interpretada por aliados de Bolsonaro como um ataque direto ao presidente e a seus defensores, principalmente por ter como um dos focos a divulgação de informações via redes sociais, uma das principais armas do PSL durante o período eleitoral.

CARREGANDO :)

O que já era delicado aos governistas, porém, se acentuou diante de duas situações: a crise que aflige o PSL e o baixo interesse de parlamentares da base do governo em se fazerem representados na comissão. Melhor para a oposição, que tem ampliado sua influência na condução do colegiado. Nesta quarta-feira (23) foi aprovada a convocação da deputada e ex-líder do governo, Joice Hasselmann (PSL-SP), e do empresário Luciano Hang, dono da Havan e bolsonarista declarado.

A briga no PSL fez com que o partido trocasse, temporariamente, seus membros na comissão. Caroline de Toni (SC) e Filipe Barros (PR) chegaram a dar lugar a Julian Lemos (PB) e Nereu Crispim (RS), ambos ligados à ala “bivarista” do PSL. Com a chegada de Eduardo Bolsonaro (SP) à liderança do partido, Caroline e Barros voltaram a seus postos.

Publicidade

A baixa participação de membros da base aliada foi um elemento de destaque na comissão na sessão da terça-feira (22). À exceção da senadora Soraya Thronicke (PSL-MS), a quase totalidade dos parlamentares que se pronunciaram são contrários ao governo – como Rui Falcão (PT-SP), Luzianne Lins (PT-CE), Natália Bonavides (PT-RN) e a relatora da comissão, Lídice da Mata (PSB-BA).

A situação fez com que, com a sessão ainda em andamento, a senadora Soraya protestasse nas redes sociais. “Na audiência pública da CPI da FakeNews, proposta pelo DEM, partido mais prestigiado da base aliada, e avalizada pela liderança do GovSenado, para combater fakes contra o PR. Mas na hora da bronca sobra para os soldados da trincheira. Sem problemas! Vamos matar no peito!”, escreveu a parlamentar, em seu perfil no Twitter.

“Não basta votar com o governo, é preciso articular”

À Gazeta do Povo, a senadora reforçou as críticas à base aliada do governo, em especial ao DEM. A parlamentar lembrou que o partido detém ministérios no governo Bolsonaro – Saúde, com Luiz Henrique Mandetta; Casa Civil, com Onyx Lorenzoni; Agricultura, com Tereza Cristina – e contou com o apoio do PSL nas eleições para as presidências da Câmara e do Senado.

“É um partido que tem muito espaço no governo Bolsonaro, mas eu não percebo essa reciprocidade. Não basta votar com o governo, é preciso articular. Nós do PSL somos poucos. E, além disso, não somos base; somos governo. Por isso deveria haver uma contrapartida”, disse.

Publicidade

A senadora disse que, na sua avaliação, a CPI teve seu objetivo inicial “desvirtuado”. “Estão tentando desvirtuar o escopo inicial da CPI. Queremos fazer uma lei que não coíba a liberdade de expressão, que faça com que os mentirosos sejam punidos", apontou. Durante a audiência da terça, Soraya Thronicke questionou participantes que disseram ver no aumento das fake news o resultado de um crescimento da influência da direita no cenário político. "Isso independe de ideologia", declarou.

Riscos colocados para o governo

As turbulências no PSL e a conversão de aliados em adversários do governo são fatores que podem influenciar na lista de depoentes da CPI das Fake News. A ex-líder do governo no Congresso e antiga apoiadora de primeira hora de Bolsonaro, a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), tem dito publicamente que os filhos do presidente gerenciam "milícias virtuais" na internet. E o ex-ministro Santos Cruz, que foi titular da Secretaria de Governo e caiu após embates com Carlos Bolsonaro, disse que aceitará o convite para falar à comissão – o requerimento foi apresentado pelo deputado Marcelo Ramos (PL-AM).

A oposicionista Natália Bonavides (PT-RN) reconhece que a instabilidade no PSL tem deixado o partido do governo mais fragilizado nos trabalhos da comissão. "Eles têm trocado membros, o que gera uma mudança de cenário caso ocorram votações. Teremos que aguardar 'as cenas dos próximos capítulos' para ver como vai ficar, em definitivo, a composição do PSL", disse a petista.

A deputada destacou que, mesmo sendo contrária ao governo, não considera positiva para a CPI a crise no PSL. "A gente gostaria que o PSL, com quem quer que seja, ajudasse nos trabalhos da comissão, nos fizesse compreender os fatos. Queremos que a CPI possa ouvir os membros das empresas, como Facebook, Twitter e Whatsapp", destacou.

Publicidade

PSL planeja contra-ataque na CPI das Fake News

Recolocada na comissão e integrante da ala 'bolsonarista' do PSL, a deputada Caroline de Toni avalia que a tática que planeja adotar para reverter o que considera um viés "antigoverno" na comissão é o de expor possíveis irregularidades cometidas por adversários de Jair Bolsonaro.

"Se eles querem bater no Bolsonaro, vamos então mostrar o que os outros fizeram. Dizer quem está propagando coisas falsas. Nós pautamos requerimentos com este objetivo", disse a parlamentar. Segundo Caroline, a acusação de que a direita se beneficiou de redes de notícias falsas é inverídico. "Tudo sempre foi orgânico, espontâneo. É a notícia enviada pela vovozinha, pela tia, pelas pessoas que queriam mudança".

A deputada avalia que a CPI tem se tornado um "tribunal de exceção" contra o governo e acredita que os veículos de mídia tendem a se prejudicar se as ideias apresentadas na CPI prosperarem. "Nós vamos continuar defendendo o direito de todos de propagar notícias, ainda que elas sejam depois desmentidas", apontou.