Surpreendida pela adesão de um número de deputados suficiente parar criar a CPI da Lava Jato, a bancada da bala, formada por apoiadores do ministro e ex-juiz Sergio Moro, ensaiou um movimento para retirar assinaturas do pedido de criação da comissão parlamentar de inquérito. Não deu tempo. Os procedimentos formais para criar a CPI foram cumpridos antes que o número necessário de parlamentares desistentes tirassem seu apoio à investigação.
A oposição pretende se reunir nesta segunda-feira (16) com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para pedir a instalação da comissão – etapa na qual a CPI ainda pode ser barrada. Segundo a líder da minoria na Casa, deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), líderes da oposição devem ir à Brasília para tentar superar entraves políticos à CPI.
“Eu estou indo para Brasília hoje, muitos líderes da oposição também, na tentativa de articular a instalação [da CPI da Lava Jato]”, disse a deputada. Ela afirma que agora é preciso superar resistências políticas. “Do ponto de vista regimental, a decisão é instalação imediata por força do regimento. Agora vamos tentar superar a questão política”, afirmou a parlamentar.
O presidente Rodrigo Maia disse, nesta segunda-feira (16), que ainda não viu o requerimento de criação da CPI, mas que precisa ter um "fato determinado" para justificar a instalação da comissão.
Por que já não é mais possível retirar o apoio à CPI da Lava Jato
A oposição protocolou o requerimento de abertura da CPI da Lava Jato na última quinta-feira (12). Depois de uma conferência das assinaturas, a Secretaria Geral da Mesa identificou 175 apoiadores à instalação da CPI – o número mínimo exigido no regimento é de 171 assinaturas.
A bancada da bala chegou a entrar em campo para tentar esvaziar o apoio à comissão. Mas já era tarde demais – mesmo não havendo um consenso na Câmara de qual é o momento limite para um deputado tirar seu apoio a uma CPI.
Segundo a consultoria legislativa da Câmara, depois que as assinaturas são conferidas pela Secretaria Geral da Mesa, não é mais possível retirar ou acrescentar apoios. Já a Secretaria Geral informou que o regimento interno da Câmara prevê que já não é possível retirar assinaturas a partir da apresentação do requerimento. Nos dois casos, contudo, esses requisitos foram cumpridos.
Dois deputados protocolaram pedidos na última sexta-feira (13) – depois da conferência pela Secretaria Geral – para retirar as assinaturas do requerimento: Alexis Fonteyne (Novo-SP) e Lucas Vergílio (SD-GO). No requerimento, Alexis alegou que sua expectativa era outra em relação ao objeto de investigação da CPI.
“Assinei na expectativa que esta CPI fosse investigar o que e quem está por trás dos ataques à Lava Jato, quem foram os responsáveis pela invasão, a quem interessa, a motivação, a forma, se houve pagamento, quem pagou e qual a origem do dinheiro que estruturou a operação dos hackers”, alegou o deputado.
O deputado afirmou que a saída, se Maia instaurar a CPI, é ocupar espaços na comissão para tentar direcionar as investigações para longe de Moro e da força-tarefa. "A composição dessa CPI será toda tomada para que [aliados de Moro] tenham maioria e aí PSL e outros partidos vão ocupar as vagas para poder direcionar a discussão", disse Alexis.
Ainda assim, mesmo que as duas assinaturas fossem retiradas, a CPI estaria de pé, pois seria necessários mais dois parlamentares desistirem.
Qual é o objeto de investigação
A CPI tem como objetivo “investigar a violação dos princípios constitucionais e do Estado Democrático de Direito, em razão da suposta articulação entre os Membros da Procuradoria da República no Paraná e o então Juiz Sergio Moro da 13ª Vara Federal de Curitiba, tornadas públicas pelo site The Intercept” (leia a justificativa na íntegra aqui).
Os deputados querem investigar se houve conluio entre o Ministério Público Federal (MPF) e o ex-juiz Sergio Moro, atual ministro da Justiça no governo Bolsonaro, “que pode ter acarretado processos interrompidos em termos de violações a garantias fundamentais e à negativa de direitos”.
A oposição também quer investigar “a existência de autoridade tentando usar a estrutura do Poder Judiciário em proveito próprio e para fins políticos”, e a eventual existência de crimes como fraude processual, prevaricação, advocacia administrativa e abuso de autoridade.
Em entrevista à Gazeta do Povo, Deltan Dallagnol fala das ameaças à Lava Jato e vazamentos do Intercept
Deputados dizem ter sido enganados
A líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann (PSL-SP) disse no Twitter que alguns deputados que assinaram o requerimento de criação da CPI foram enganados. “Muitos deputados alegam que foram enganados, que assinaram a CPI da Lava Jato sem saber do que se tratava”, disse a deputada. “Estou com minha equipe da Liderança do Governo no Congresso buscando medidas regimentais e jurídicas para enterrar essa aberração que quer transformar o mocinho em bandido”, completou.
Jandira rebate e diz que os deputados estão com medo de pressões do governo. “Ficou 24 horas no sistema, aberto [o pedido de CPI]. Os deputados, que agora estão dizendo que foram enganados, estão com medo da pressão do governo”, afirmou a deputada da oposição.
Segundo Jandira, a decisão para instalar a CPI cabe ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Do ponto de vista formal, não há impeditivos, segundo a deputada. “Do ponto de vista político, ele pode dizer: ‘Não tem fato determinado, então vou arquivar’. Mas seria uma excrescência, porque o fato determinado é óbvio. São as denúncias objetivas do comportamento do juiz [Sergio Moro] e do [procurador Deltan] Dallagnol, amplamente denunciadas pelas divulgações do Intercept”, afirma. “Não existe nenhuma limitação regimental, formal e jurídica, o problema é político e vamos tentar superar”, diz a deputada da oposição.