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Covid-19

Crise carcerária causada pelo coronavírus chega ao Brasil; veja como foi em outros países

coronavírus: efeitos nas penitenciárias
Crise carcerária causada pelo coronavírus chega ao Brasil e vira desafio para autoridades evitarem fugas e rebeliões. (Foto: G Dettmar/Ag.CNJ)

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Uma onda de revoltas desencadeou quatro rebeliões em presídios de São Paulo na segunda-feira (17). Os motins de presos ocorreram em Mongaguá, Tremembé, Mirandópolis e Porto Feliz; e o motivo foi a decisão da Justiça paulista de suspender as saídas temporárias de presos na Páscoa para conter a disseminação do novo coronavírus dentro das cadeias. A crise carcerária causada pela Covid-19 não é uma exclusividade brasileira: países como Itália, França e Irã também enfrentaram problemas parecidos.

Segundo a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) de São Paulo, 1.389 detentos fugiram das quatro penitenciárias – 573 já haviam sido recapturados pela Polícia Militar até a terça-feira. Em três dos quatro presídios onde aconteceram as rebeliões há presença de integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC).

De acordo com o sindicatos dos agentes prisionais, a razão das revoltas seria o fato de os presos temerem perder o direito à saída temporária de Páscoa, em razão da epidemia de coronavírus.

"O motivo parece que é a situação de que o TJ [Tribunal de Justiça de São Paulo] proibiu as saidinhas e o trabalho externo de presos", diz o presidente do Sindicato dos Funcionários do Sistema Prisional, Fabio Cesar Ferreira. "Amanhã seria a primeira saidinha. E quase 20 mil presos queriam sair no feriado da Páscoa.”

Decisão judicial tenta barrar contágio por coronavírus

O Tribunal de Justiça de São Paulo divulgou na segunda-feira (16) que a Corregedoria-Geral da Justiça, a pedido da SAP, suspendeu a saída temporária que estava prevista para os próximos dias. A Corte disse em nota que a decisão levou em consideração "a grave crise da saúde pública enfrentada pelos órgãos de gestão e população em geral quanto à disseminação do novo coronavírus".

De acordo com a decisão divulgada, a saída dos detentos seria remarcada pelos juízes corregedores dos presídios, "conforme os novos cenários e em melhor oportunidade".

A SAP disse, em nota, que "a medida foi necessária pois o benefício contemplaria mais de 34 mil sentenciados do regime semiaberto que, retornando ao cárcere, teriam elevado potencial para instalar e propagar o coronavírus em uma população vulnerável, gerando riscos à saúde de servidores e de custodiados".

Coronavírus também gerou crise nas cadeias de outros países

Os dois países com mais mortes por causa da Covid-19, depois da China, também registraram crises com presos: Itália e Irã.

Segundo a Reuters, agência de notícias internacionais, no Irã, 70 mil presos foram colocados em liberdade provisória por causa do risco de contrair o vírus nas prisões. A medida foi tomada depois que a ONU informou que a doença chegaria aos estabelecimentos prisionais do país. De acordo com o chefe do Judiciário iraniano, Ebrahim Raisi, a libertação de detentos continuaria "a ponto de não criar insegurança na sociedade". Pelo menos oito pessoas teriam sido contaminadas em presídios do país.

Já na Itália, 12 presos morreram na semana passada por causa de rebeliões se espalharam por mais de 25 prisões em todo o país devido a medidas impostas para conter o avanço do novo coronavírus. Também houve fuga de presos. Foram registradas 16 fugas, além de cerca de 40 agentes penitenciários feridos.

Segundo o jornal italiano Il Messagero, distúrbios graves foram registrados em várias regiões do país: Milão, Roma, na província de Foggia e Modena.

De acordo com a agência de notícias Ansa, os presos reclamavam das medidas restritivas impostas para a contenção da Covid-19 no sistema prisional – tais como o isolamento de detentos que apresentam sintomas da doença, a restrição do contato durante as visitas, a permissão para conversas por telefone ou vídeo, e um maior controle no caso de presos que estão em regime de liberdade condicional. Familiares dos presos também protestaram do lado de fora das instalações.

Além disso, no fim de semana foi identificado o primeiro caso de coronavírus em um presídio francês. O país tem reservado celas individuais para o tratamento dos presos doentes. A limpeza dos espaços comuns tem sido reforçada e higienizadores de mãos e sabão têm sido disponibilizados aos presos, segundo o boletim Fonte Segura desta semana.

Nos Estados Unidos, segundo o boletim, "todos os 122 presídios federais e a maior parte dos cerca de 1.700 presídios estaduais suspenderam a entrada de visitantes e voluntários, inclusive o contato através das divisórias de vidro. Nos presídios federais, estão suspensas também, por 30 dias, as visitas de advogados. Nos estados, em geral, as visitas dos advogados estão mantidas, com a realização de testes para detecção do coronavírus. Para compensar as restrições, muitos estados afirmam ter aumentado a quantidade de telefonemas que os presos podem fazer. Até sábado (14), nenhum estado havia reportado rebeliões após a medida”.

Na China, epicentro da pandemia, mais de 500 casos foram confirmados nas prisões e as autoridades públicas montaram um hospital especializado com equipes de inspeção para realizar os testes nas prisões.

Nas Filipinas, as visitas foram banidas por uma semana após a confirmação de que presos estariam com o coronavírus.

Depen diz que não há evidências de mais rebeliões prestes a ocorrer

Segundo o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, não há evidências de que novas rebeliões estejam sendo orquestradas em outros estados brasileiros. O Depen conta com uma diretoria de inteligência, implementada no início da gestão do ministro Sergio Moro.

“O evento em São Paulo não guarda vínculo com orquestração em massa. Decorreu da notícia da suspensão da saída temporária ter chegado ao conhecimento da população carcerária no momento em que retornavam às unidades”, afirmou o Depen, em nota. “As medidas ora tomadas pelas administrações prisionais visam à proteção da saúde de detentos e profissionais que laboram nos estabelecimentos prisionais, sendo da autonomia dos entes federados as respectivas decisões. Não há, até o presente, registro de tal orquestração”, completa o órgão.

Segundo o Depen, até o momento não há nenhum pedido do estado de São Paulo de atuação da Força Tarefa de Intervenção Penitenciária.

Recomendações contra coronavírus em presídios

No Brasil, segundo o Depen, há pelo menos 8 mil presos com mais de 60 anos, enquadrando-se no grupo de risco. Dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública mostram que 62% das mortes de presos são provocadas por doenças transmissíveis, como a tuberculose, a sífilis e o HIV.

Depois de uma reunião de emergência na última quinta-feira (12), o Depen e o Conselho Nacional dos Secretários de Estado da Justiça (Consej) emitiram uma nota com recomendações para os estados enfrentarem o coronavírus dentro dos estabelecimentos prisionais.

Entre as medidas estão atenção a medidas preventivas de higiene, principalmente em relação aos visitantes das unidades; e restrição de visitas, de transporte e de remoção de detentos e isolamento de presos em caso de suspeitas de contágio.

O Consej e o Depen também recomendam que os presos e servidores do sistema penitenciário façam parte do primeiro grupo que receberá a vacina contra a gripe.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) também emitiu na terça-feira (17) uma série de recomendações a juízes e tribunais. Entre as medidas recomendadas, está a revisão das prisões provisórias por todos os juízes do país.

Segundo o Depen, o Brasil tem 753.676 presos. Dentre eles, 253.963 (ou 33,47%) encontram-se em prisão provisória, quando ainda não há condenação definitiva conforme o Depen. Pela recomendação do CNJ, os magistrados devem revisar se ainda há motivos para cada prisão provisória, nos termos do Artigo 316 do Código de Processo Penal (CPP).

Nesse processo, devem ser priorizadas gestantes, lactantes, mães ou pessoas responsáveis por criança de até 12 anos, idosos, indígenas, pessoas deficientes ou que se enquadrem no grupo de risco. Após esses grupos, devem ser priorizadas pessoas presas em estabelecimentos superlotados, que não disponham de equipe de saúde própria ou que disponham de instalações que favoreçam a propagação do novo coronavírus.

A recomendação prevê ainda “a máxima excepcionalidade de novas ordens de prisão preventiva”. O documento, assinado pelo presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, foi enviado para que os presidentes de todos os tribunais do país distribuam a seus magistrados. As medidas devem vigorar por 90 dias com possibilidade de prorrogação.

O Depen suspendeu, nesta segunda-feira (16), nos presídios federais, as visitas sociais por 15 dias, os atendimentos de advogados por 5 dias – salvo necessidades urgentes ou que envolvam prazos processuais não suspensos, e escoltas – com exceção de requisições judiciais, inclusões emergenciais e daquelas que por sua natureza.

Moro defendeu a medida nas redes sociais. "As suspensões das visitas nos presídios federais são temporárias e visam proteger os presos e os seus familiares da contaminação pelo novo coronavírus. Não se trata de punição, mas de cuidado", disse.

Além dos presídios federais, as visitas também estão suspensas em algumas unidades da federação como Distrito Federal, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Goiás, Amazonas, Roraima, Tocantins, Alagoas, Sergipe e Ceará. O Ceará tem atendimentos com advogados com horários e prazos determinados. Em Minas Gerais, Santa Catarina, Pernambuco e Rio Grande do Sul, foram suspensas parcialmente as visitas.

Mato Grosso, Sergipe, Maranhão e Paraná elaboraram uma nota técnica com orientações sobre a doença. Paraíba, além da nota técnica, informou que fará triagens de visitas. São Paulo, Ceará, Piauí e Mato Grosso do Sul também farão triagens.

O Depen também solicitou que cada gestor de saúde do sistema prisional das unidades federativas preenchessem uma planilha, até esta quarta-feira (18), com as necessidades de insumos de saúde necessários para prevenção contra a Covid-19 no sistema prisional. O objetivo é computar levantar a demanda de álcool em gel, máscaras, lenços de papel entre outros, por unidade da federação para reforçar a aquisição, caso seja necessária.

Nesta quarta-feira (18), foi a vez de os ministros Sergio Moro (Justiça e Segurança) e Luiz Henrique Mandetta (Saúde) editarem uma portaria interministerial estabelecendo regras para enfrentar o risco do coronavírus no sistema prisional. Dentre as medidas previstas, está a possibilidade de as visitas aos encarcerados serem reduzidas ou suspensas a critério da administração dos presídios.

A administração das penitenciárias também ficará responsável por identificar presos que apresentem sintomas da Covid-19. A prioridade de monitoramento serão os detentos acima de 60 anos e com doenças crônicas ou graves. Também fazem parte desse grupo prioritário as grávidas, mulheres que deram à luz há pouco tempo e obesos.

A portaria determina que o preso com sintomas deverá ser isolado em cela individual, sempre que possível. Se for confirmada a suspeita de coronavírus e o quadro estiver grave, o detendo tem de ser levado a um hospital.

A administração penitenciária também tem de avaliar a possibilidade de afastar do trabalho servidores que voltaram de viagens ao exterior, que tenham mais de 60 anos, que sejam portadores de doenças crônicas ou respiratórias e que estejam grávidas.

Ministro do STF emite recomendações a juízes penais

Nesta quarta-feira (18), o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), também sugeriu que os juízes penais de todo o país adotem oito medidas:

1) liberdade condicional a encarcerados com idade igual ou superior a 60 anos, nos termos do artigo 1º da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso);

2) regime domiciliar aos soropositivos para HIV, diabéticos, portadores de tuberculose, câncer, doenças respiratórias, cardíacas, imunodepressoras ou outras suscetíveis de agravamento a partir do contágio pelo Covid-19;

3) regime domiciliar às gestantes e lactantes, na forma da Lei 13.257/2016 (Estatuto da Primeira Infância);

4) regime domiciliar a presos por crimes cometidos sem violência ou grave ameaça;

5) substituição da prisão provisória por medida alternativa em razão de delitos praticados sem violência ou grave ameaça;

6) medidas alternativas a presos em flagrante ante o cometimento de crimes sem violência ou grave ameaça;

7) progressão de pena a quem, atendido o critério temporal, aguarda exame criminológico; e

9) progressão antecipada de pena a submetidos ao regime semiaberto.

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