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Fórum Econômico Mundial

Qual foi a imagem do Brasil em Davos para os estrangeiros

O ministro da Economia, Paulo Guedes, foi o principal representante do governo brasileiro no Fórum Econômico Mundial de 2020, em Davos, na Suíça. (Foto: World Economic Forum/Ciaran McCrickard)

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O Fórum Econômico Mundial é uma das principais vitrines globais para a atração de investimentos internacionais. Por isso, a repercussão das falas do ministro da Economia, Paulo Guedes, durante a reunião anual da organização, que ocorreu em Davos entre os dias 21 e 24, pode ser decisiva para o futuro do Brasil.

Em 2020, a participação do Brasil no Fórum Econômico recebeu cobertura discreta da mídia estrangeira. Diferentemente do ano passado, quando o presidente Jair Bolsonaro foi ao evento como uma das atrações principais, e o Brasil recebeu ampla cobertura jornalística do exterior, Guedes ganhou pouca repercussão internacional. Mas não foi totalmente ignorado.

A declaração que mais recebeu atenção de fora foi a da projeção para o PIB brasileiro – o que é natural, tendo em vista a importância desse prognóstico para as decisões de investidores. Já a afirmação de Guedes de que o “pior inimigo do meio ambiente é a pobreza” foi praticamente ignorada pela imprensa de outros países, ao contrário do que ocorreu no Brasil.

Projeção do PIB é vista com desconfiança

Na terça-feira (21), o ministro Guedes fez uma projeção de crescimento de 2,5% para o PIB brasileiro em 2020 durante o painel “Perspectiva Estratégica: América Latina”. Uma semana antes, o governo tinha falado em 2,4%. A notícia foi publicada pela agência Reuters e reproduzida por diversos meios estrangeiros.

O jornalista britânico Jamie McGeever, da Reuters, tratou com ceticismo a fala e disse que os investidores estrangeiros têm superestimado o Brasil nos últimos anos.

“O crescimento do PIB do Brasil 2020 deve atingir 2,5%, diz o ministro da Economia, Guedes, em Davos. Ousado, acima do consenso de 2,1% e da previsão oficial do governo de 2,4%. Mas acho que já vimos isso antes – há um ano, o consenso do mercado para 2019 era 2,6%, mas é provável que mal chegue a 1%”, comentou via Twitter.

Comentário sobre pobreza e meio ambiente recebe pouca atenção

Um comentário de Guedes no primeiro dia do Fórum Econômico Mundial ganhou muita atenção da imprensa nacional, mas foi pouco repercutido globalmente. “O pior inimigo do meio ambiente é a pobreza. As pessoas destroem o meio ambiente porque precisam comer”, disse o ministro.

Nenhum grande jornal estrangeiro reproduziu a fala. O repórter britânico Dom Phillips, que atua no Brasil como correspondente e escreve para o jornal The Guardian, ironizou a declaração pelo Twitter.

“O ministro brasileiro da Economia, Paulo Guedes, falou a Davos que o ‘pior inimigo do ambiente é a pobreza’. No ano passado, ele falou a repórteres, inclusive a mim, que ele não estava convencido sobre a ciência da mudança climática. Acho que ele esqueceu de mencionar isso”, afirmou.

Al Gore, ex-vice-presidente dos Estados Unidos, também criticou a fala de Guedes em um dos painéis do evento. “Hoje é amplamente entendido que o solo na Amazônia é pobre. Dizer às pessoas no Brasil que elas vão chegar à Amazônia, cortar tudo e começar a plantar, e que terão colheitas por muitos anos, isso é dar falsa esperança a elas”, disse ele.

Guedes ironizou o comentário do americano: “O Al Gore deve ter muita noção disso, porque foi no país dele que houve uma redução importante de algumas etnias, muita coisa complicada”. A troca de farpas Guedes e Al Gore não recebeu atenção da mídia estrangeira.

Fala sobre corrupção chama atenção

Durante o painel “Strategic Outlook: Latin America”, o ministro exaltou a aprovação da lei de liberdade econômica pelo governo Bolsonaro, afirmando que a menor intervenção do governo sobre recursos públicos diminui o risco de corrupção.

Nessa fala, o ministro fez uma comparação do Brasil com os Estados Unidos que foi reproduzida por dois grande meios norte-americanos: os sites do jornal The Washington Post e da emissora de televisão CNBC. Segundo Guedes, “nos Estados Unidos, tudo é permitido até ser proibido; no Brasil, tudo é proibido até ser permitido”.

Autor da reportagem do Washington Post que citou Guedes, o jornalista Ishaan Tharoor fez o seguinte comentário via Twitter: “Paulo Guedes, ministro da Economia do Brasil, lamenta os gastos públicos ‘não controlados’ por sucessivos governos civis, em oposição à restrição relativa dos conselhos militares anteriores”, disse ele, usando um emoji de monóculo ao fim da mensagem, provavelmente para indicar desconfiança com a fala do ministro.

Tharoor também criticou uma metáfora usada por Guedes para explicar a situação da economia brasileira. O ministro comparou o Brasil a uma baleia ferida por diversos arpões, que o atual governo tenta salvar. “Metáfora forçada”, disse o jornalista.

“Para um país lutando por recuperação econômica, um pouco de decoro ajudaria”, diz Bloomberg

Mac Margolis, da agência norte-americana Bloomberg, fez um texto analítico sobre a participação de Guedes em Davos que fala mais sobre a situação social do Brasil do que propriamente sobre a economia do país.

Margolis comenta o envolvimento de evangélicos no governo Bolsonaro e cita até a polêmica do Porta dos Fundos, afirmando que a tolerância e a harmonia de que os brasileiros se gabavam deixou de existir no país, e que a situação de instabilidade social do Brasil deve ser levada em consideração pelos participantes do fórum de Davos.

“Ainda não está claro até que ponto essa nova incivilidade prejudicará a posição internacional do Brasil. Talvez esfrie a recepção que Guedes receberá nos salões politicamente corretos do centro de conferências de Davos. Mas, para um país lutando por recuperação econômica, com um fosso crescente entre ricos e pobres e com profundas fissuras sociais, um pouco de decoro ecumênico ajudaria a impulsionar a democracia, assim como um bom e velho apreço pelos limites entre igreja e estado”, diz o texto.

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