O governo federal pretende transferir R$ 400 bilhões que ficariam com a União para todos os estados e municípios ao longo de 15 anos. O repasse será feito através de uma nova política de distribuição do que é arrecadado com salário-educação e, principalmente, com recursos de exploração de petróleo (royalties e participações especiais). A medida consta da proposta de emenda à Constituição (PEC) do Pacto Federativo, em discussão no Senado.
“É o primeiro governo em 40 anos que fala em descentralizar recursos e fortalecer a democracia”, afirmou o ministro da Economia, Paulo Guedes, durante apresentação à imprensa. A ideia vai ao encontro da promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro de “Mais Brasil, menos Brasília”, ou seja, de redistribuir recursos aos entes subnacionais, dentro do chamado redesenho do pacto federativo.
O objetivo do governo é que estados e municípios passem a administrar duas receitas que são hoje da União, fortalecendo a federação. O ministro diz que o Estado precisa devolver à classe política, incluindo governadores e prefeitos, a responsabilidade sobre o orçamento e administração da verba pública. "Governo centralizado anda fazendo muita besteira com o dinheiro público. Eu confio nessa descentralização, ao invés de ficar meia dúzia de pessoas decidindo tudo em Brasília", afirmou Guedes.
Recursos do petróleo
Pela proposta em tramitação no Senado, a União vai transferir aos estados e municípios parte dos royalties e participações especiais que recebe. Royalties e participações especiais são uma compensação paga pelas empresas exploradoras de óleo e gás pela extração de recursos naturais.
A possibilidade dessa transferência consta nos parágrafos terceiro e quarto do artigo 20 da PEC. A proposta, porém, apenas permite que a União faça essa transferência e determina que lei posterior estabeleça os percentuais, base de cálculo e condições, bem como discipline critérios de distribuição que contemplem, entre outros, indicadores de resultado. A ideia foi não engessar a Constituição com parâmetros que podem ser definidos em lei.
A PEC também estabelece que os recursos transferidos não poderão ser usados para pagamento de despesa com pessoal ativo, inativo e pensionista. O objetivo é incentivar que os governos locais usem o dinheiro para investimento.
Atualmente, a União fica com 70% dos recursos de extração do pré-sal. O que o governo quer, segundo o secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, é inverter os percentuais: fazer que estados e municípios fiquem com 70% e a União com os 30% restantes. A inversão seria feita gradualmente.
Esses percentuais, assim, como a base de cálculo e os critérios de distribuição dos recursos entre estados e municípios estarão em um projeto de lei complementar, a ser enviado pelo governo após a aprovação da PEC.
Contrapartidas para ter os recursos do petróleo
Para ter direito aos recursos do petróleo, o governo estabelece uma série de contrapartidas. A mais importante delas é o fim das ações judiciais que pedem a compensação da Lei Kandir, que desonerou as exportações de ICMS.
A União também deixará de ser fiadora de empréstimos feitos por estados e municípios, com exceção das operações de crédito realizadas com organismos internacionais. Também fica proibida a União de socorrer estados e municípios em dificuldades financeiras. Outra vedação é para operações de crédito entre entes da federação, diretamente ou por meio de fundo, autarquia, fundação ou estatal. Todas essas vedações entrariam em vigor somente a partir de 2026.
Essas contrapartidas são exigidas porque, segundo o governo, ao transferir bilhões para estados e municípios os entes subnacionais ficarão fortalecidos financeiramente.
Salário-educação e contrapartida
A PEC do Pacto Federativo também transfere a estados e municípios o que a União arrecada hoje com o salário-educação. A transferência é integral, ou seja, de 100% dos recursos. A distribuição dos recursos será feita considerando o número de alunos matriculados na educação básica nas respectivas redes públicas de ensino. A medida consta nos parágrafos quarto e sexto do artigo 212 da PEC.
O salário-educação é uma contribuição paga pelas empresas e serve para financiar programas de material didático escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde na rede básica de ensino. O dinheiro arrecadado fica com a União, que paga esses programas, que beneficiam as redes públicas estaduais e municipais.
A intenção do governo é deixar o dinheiro arrecadado direto com estados e municípios para que eles paguem os programas. Em contrapartida, os estados e municípios terão de administrar e se responsabilizar pelos programas abarcados pelo salário-educação.
E como chegaram a R$ 400 bilhões?
O secretário especial adjunto de Fazenda, Esteves Colnago, explicou que os R$ 400 bilhões são uma estimativa de transferência feita pela equipe econômica com base em projeções do que será arrecadado para o salário-educação ao longo de 15 anos e estimativas da Agência Nacional de Petróleo (ANP) sobre receitas de royalties e participações especiais que passariam gradativamente para as mãos de estados e municípios também ao longo do mesmo período.
Vale ressaltar que as transferências vão continuar, se aprovada a PEC do Pacto Federativo, mesmo depois de passados os 15 anos. Mas o governo não traçou estimativas para acima desse período.
A proposta está em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Para ser aprovada no plenário da Casa, precisa ter o aval de três quintos dos senadores em dois turnos. Depois, também precisa da mesma aprovação na Câmara.