O ministro da Defesa, Fernando Azevedo, e os comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica divulgaram neste sábado (14) uma nota oficial conjunta em que tentam superar, no meio político e entre os militares, a avaliação de que há um descolamento e uma tensão entre o presidente Jair Bolsonaro e o comando das Forças Armadas.
O texto destaca "a característica fundamental das Forças Armadas como instituições de Estado", diz que isso "em nada destoa do entendimento do governo e do Presidente da República" e ressalta que o "apreço" do presidente pelas Forças é "correspondido".
O documento, assinado pela cúpula das três Forças e o ministro, fecha uma semana marcada por declarações do comandante do Exército, Edson Leal Pujol, que buscaram distanciar as Forças Armadas de disputas no governo e deixar claro que elas não têm interesse em participar da política.
"Não queremos fazer parte da política governamental ou do Congresso Nacional e muito menos queremos que a política entre em nossos quartéis", disse Pujol na quinta-feira durante evento do Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa, do qual participaram os ex-ministros da Defesa Raul Jungmann e do Gabinete de Segurança Institucional general Sérgio Etchegoyen.
O governo Bolsonaro tem forte presença militar em várias áreas, inclusive na articulação política com o Congresso, tarefa executada pelo general Luiz Ramos. À frente da Saúde, que coordena as ações contra a pandemia do novo coronavírus, também está outro militar, o general Eduardo Pazuello.
Na sexta-feira, Pujol voltou a se manifestar em um seminário organizado pela Escola Superior de Guerra. "Somos instituições de Estado, não somos instituição de governo, não temos partido. Nosso partido é o Brasil", disse. "Independente de mudanças ou permanência de um determinado governo por um período longo, as Forças Armadas cuidam da Nação. São instituições permanentes, não mudamos a cada quatro anos a nossa maneira de pensar e como cumprir nossas missões".
Ainda ontem, depois da nova manifestação de Pujol, Bolsonaro sentiu necessidade de lembrar que fora ele quem nomeara Pujol para o cargo em uma espécie de "chamado de unidade" às fileiras. Bolsonaro escreveu nas redes sociais: "A afirmação do General Edson Leal Pujol (escolhido por mim para Comandante do Exército) que 'militares não querem fazer parte da política', vem exatamente ao encontro do que penso sobre o papel das Forças Armadas no cenário nacional".
O vice-presidente da República, general Hamilton Mourão, também reforçou esse entendimento. "Política não pode estar dentro do quartel. Se entra política pela porta da frente, a disciplina e a hierarquia saem pela dos fundos. O comandante do Exército coloca claramente o que é a nossa posição", destacou Mourão ao falar com jornalistas na portaria da Vice-Presidência no Palácio do Planalto na tarde de ontem. Segundo ele, as Forças Armadas sofreram, antes de 1964, com uma politização "que só serviu para causar divisão".
O general Mourão e o capitão Bolsonaro têm se estranhado nas últimas semanas. Bolsonaro não aceita que o vice omita opiniões, não aprova sua relação com a imprensa, com atores políticos, como o ex-ministro Sérgio Moro, com quem rompeu, o que tem causado o estranhamento entre eles a ponto de o presidente dizer publicamente que não fala com seu vice sobre "qualquer assunto".
Para três oficiais generais ouvidos pelo Estadão – dois generais e um brigadeiro –, a reação de Bolsonaro demonstra um mal-estar. Um deles creditou o problema às pessoas próximas do presidente que apagam incêndio com gasolina. Seriam integrantes do Planalto que estariam intrigando o presidente com Pujol, sugerindo que as falas do general – que só havia afirmado o óbvio – seriam um recado à Bolsonaro ou que Pujol estaria querendo aparecer. Exploram o notório ciúmes que Bolsonaro tem de ver seus auxiliares retratados na imprensa.
Na nota deste sábado, a Defesa reforça que, quando os comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica se manifestam, "sempre falam em termos institucionais, sobre as atividades e as necessidades de preparo e emprego das suas Forças, que estão voltadas exclusivamente para as missões definidas pela Constituição Federal e Leis Complementares".
No entanto, o texto de hoje foi visto no meio político como uma forma de o ministro da Defesa, Fernando Azevedo, desautorizar Pujol e deixar claro que quem responde pelas Forças Armadas é ele. "O único representante político das Forças Armadas, como integrante do governo, é o Ministro da Defesa", cita um dos pontos da nota.
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