O resultado do julgamento no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) que analisou a conduta do procurador da República Deltan Dallagnol, nesta terça-feira (13), manteve a força-tarefa da Lava Jato no Paraná sob pressão. Deltan escapou do pior – havia expectativa de que o conselho pudesse aproveitar duas ações que tramitam contra ele para afastá-lo da operação –, mas o coordenador da força-tarefa sofreu algumas derrotas.
Deltan virou alvo de críticas por causa de reportagens publicadas na imprensa desde o início de junho sobre mensagens do Telegram atribuídas a ele e outros membros da Lava Jato, inclusive ao ex-juiz e atual ministro da Justiça, Sergio Moro.
A primeira derrota do procurador no CNMP foi a rejeição de um recurso, que pedia a suspensão de um processo administrativo disciplinar (PAD) contra o procurador. O procedimento foi instaurado depois de uma entrevista concedida por Deltan à radio CBN, em 2018. Ele disse que os ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski, formavam uma "panelinha" que passava mensagem de leniência a favor da corrupção em suas decisões.
O CNMP foi provocado a investigar a conduta de Deltan pelo ministro Dias Toffoli, atual presidente do STF. Deltan pedia que o processo fosse suspenso, mas os conselheiros decidiram, por unanimidade, rejeitar o pedido do coordenador da Lava Jato. O procedimento pode resultar em advertência, censura à conduta do procurador, ao afastamento dele das funções e, em último caso, a uma aposentadoria compulsória.
Pedido de desarquivamento é derrota de Deltan
Outro revés imposto à Lava Jato foi o pedido para que o conselho revise a decisão de arquivamento de uma reclamação disciplinar contra Deltan por causa das supostas mensagens do Telegram divulgadas pela imprensa. O pedido de revisão de decisão monocrática de arquivamento foi feito pelos conselheiros Erick Venâncio Lima do Nascimento e Leonardo Accioly da Silva – ambos ocupam vagas destinadas à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Os dois recorreram de uma decisão monocrática do corregedor nacional do Ministério Público, Orlando Rochadel Moreira, que arquivou o pedido de abertura de sindicância contra Deltan e outros procuradores. A expectativa é que o caso seja sorteado para definição de um novo relator, que vai analisar se o pedido deve continuar arquivado ou se a sindicância deve ser instaurada. A decisão final caberá ao plenário do CNMP. Se o plenário não decidir arquivar novamente o pedido, a reclamação pode virar um PAD.
O pedido de providências foi o primeiro que chegou ao conselho depois que veículos de imprensa começaram a divulgar conversas atribuídas a Deltan e outros membros da Lava Jato. Ao arquivar o pedido, Rochadel ressaltou que não é possível atestar a autenticidade das mensagens.
Interferência na eleição do Senado
Deltan ainda é alvo de uma reclamação disciplinar proposta pelo senador Renan Calheiros (MDB), que acusa Deltan de interferir indevidamente nas eleições da Mesa Diretora do Senado ao fazer campanha no Twitter contra a reeleição do emedebista à presidência da Casa. O argumento de Deltan e de outros membros da Lava Jato era que a eleição de Renan representaria um retrocesso no combate à corrupção, já que ele é alvo de inquéritos no STF. Em uma sessão tumultuada, que durou dois dias, Renan Calheiros acabou retirando sua candidatura e Davi Alcolumbre (DEM), que também é alvo no STF, foi eleito presidente do Senado.
A reclamação estava prevista para ser analisada na sessão desta terça-feira (13), mas foi retirada da pauta logo no início da reunião do CNMP e deve ser analisada posteriormente. A reclamação também pode acabar virando um PAD.
Ex-membro da Lava Jato na berlinda
Outra derrota para a Lava Jato foi a instauração de um PAD contra outro membro da força-tarefa, o procurador Diogo Castor de Mattos. Ele pediu afastamento da força-tarefa em abril deste ano, alegando que o afastamento foi uma recomendação médica. Mesmo assim, o CNMP abriu uma reclamação disciplinar contra o procurador poucos dias depois.
O pedido de instauração da reclamação foi feito por Toffoli, depois que Diogo publicou um artigo no portal O Antagonista criticando duramente a decisão do STF que definiu a competência da Justiça Eleitoral para investigar e julgar crimes cometidos ao mesmo tempo que o caixa 2 eleitoral, inclusive corrupção e lavagem de dinheiro. No artigo, o procurador afirma que o STF ensaia “um golpe” contra a Lava Jato e chama os ministros que votaram pela competência da Justiça Eleitoral de “turma do abafa”. Diogo também afirma que a Justiça Eleitoral não tem estrutura, nem especialização, para investigar crimes de colarinho branco.
Nesta terça-feira (13), o plenário do CNMP decidiu abrir um PAD para investigar a conduta de Diogo. O procedimento pode levar à sanções contra o procurador. Segundo a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, “a liberdade de expressão tem limites” e é preciso investigar se houve excessos por parte de Diogo em suas críticas.
Morde e assopra
Apesar dos reveses sofridos pela Lava Jato no CNMP, Dodge defendeu a operação ao abrir a sessão do plenário. “Retomamos as atividades desse Conselho Nacional com os olhos da sociedade voltados para nós”, disse a procuradora, que preside o colegiado.
“O Brasil quer e precisa de um Ministério Público com coragem para enfrentar a corrupção, esse vício humano que corrói os recursos públicos, maltrata o devido processo legal e é capaz de corroer projetos de vida e interferir na realização do direito à saúde, à moradia, dentre tantos outros, que é capaz de degradar o meio ambiente, impedir que terras indígenas sejam demarcadas e estimular a destruição de seus bens, suas culturas, suas vidas", completou.
Ela também falou sobre a prorrogação, por mais um ano, da atuação da força-tarefa da Lava Jato no Paraná, autorizada nesta segunda-feira (12). “Ontem comuniquei a prorrogação de uma das mais importantes frentes de atuação do Ministério Público Federal”, disse Dodge. Segundo a procuradora, a força-tarefa “se constitui em um dos casos mais importantes no combate à corrupção de verbas públicas”.
Apesar do apoio, Dodge fez um alerta aos procuradores. “A Procuradoria Geral da República apoia a atuação institucional de todos os seus membros, para o cumprimento da missão [de combate à corrupção]. Mas igualmente exige que o desempenho da atuação institucional se dê inteiramente dentro dos marcos da legalidade”, ressaltou a chefe do MPF.
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