O primeiro semestre de 2021 acentuou as contradições que têm marcado o DEM. O partido caminha para a metade do ano sem resolver as disputas entre as alas mais próximas e mais afastadas do presidente Jair Bolsonaro. Parte do partido quer apoiar a reeleição de Bolsonaro. Outra ala defende candidatura própria; e o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta é um nome cogitado. Além disso, o DEM vive o impasse com o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (RJ), que ameaça se desfiliar desde o racha que marcou sua sucessão.
A CPI da Covid do Senado, que nesta semana registrou seus primeiros depoimentos, se mostrou um ambiente ideal para evidenciar a divisão do partido. O ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, filiado ao DEM, falou à comissão nesta terça-feira (3) e seu depoimento teve série de críticas à gestão Bolsonaro. No plenário da comissão, porém, a defesa do governo tinha como um dos pivôs o senador Marcos Rogério (RO), que é o líder do DEM no Senado.
As contradições do DEM se dão em um partido que passou por uma expressiva fase de recuperação nos últimos anos, mas que registra dificuldades em consolidar sua identidade e definir seus rumos para o período eleitoral de 2021.
Ser base ou não ser: o dilema do DEM
O principal dilema em torno do DEM é o seu relacionamento com a gestão Bolsonaro. O partido tem membros que endossam o governo em sua totalidade e manifestam publicamente o interesse em apoiar a candidatura à reeleição do presidente. Neste grupo estão os ministros Onyx Lorenzoni (Secretaria-Geral) e Tereza Cristina (Agricultura) e deputados federais como Pedro Lupion (PR), Sóstenes Cavalcante (RJ) e Luis Miranda (DF), entre outros.
Já outros segmentos defendem o distanciamento do Palácio do Planalto – e, como alternativa principal, uma candidatura própria. Mandetta, que criticou Bolsonaro em seu depoimento na CPI, apresentou-se como nome.
"Essa é uma realidade que terá que ser resolvida até 2022. O partido tem pessoas ligadas a Bolsonaro, outras mais afastadas. Depende da área de formação, do posicionamento de cada um. Não considero que o que exista hoje seja um confronto, mas é um grande desafio", afirmou a deputada federal Dorinha Seabra (DEM-TO), que é presidente do diretório do partido em seu estado.
A parlamentar disse ver "com bons olhos" a pré-candidatura de Mandetta. Em sua opinião, o ex-ministro se saiu muito bem no cargo que ocupou e a indicação do seu nome na disputa presidencial contribuiria também para o projeto de crescimento do partido. "Seria muito bom para o DEM ter essa opção", declarou a deputada.
Presidente do DEM em São Paulo, o deputado federal Alexandre Leite também considera positivo o debate sobre a candidatura do ex-ministro. "Vejo duas hipóteses que trariam conforto ao partido: a neutralidade e a candidatura do Mandetta", declarou.
O parlamentar, entretanto, acrescenta outro elemento no cenário: a possibilidade de o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), concorrer à eleição presidencial. Historicamente, PSDB e DEM são aliados no plano nacional, o que estimularia uma nova coligação em 2022. Mas a disputa do ano que vem conta com um fator adicional. O vice de Doria, Rodrigo Garcia, é filiado ao DEM. Caso o governador dispute a sucessão de Bolsonaro, Garcia assumiria o governo e seria um nome natural para concorrer à reeleição. O PSDB, entretanto, não aceitaria abrir mão de ter um nome do partido na disputa pelo governo paulista. Para solucionar o impasse, os tucanos convidaram Garcia para a sigla, e as negociações estão avançadas.
"Nosso projeto é o Rodrigo [Garcia], ainda que ele não esteja mais no DEM. Mas essa negociação vai condicionar nosso apoio ao projeto nacional do Doria", declarou o deputado. Leite disse que, caso Garcia realmente ingresse no PSDB, o DEM exigirá "mais espaços" na coligação encabeçada pelos tucanos.
Todo o contexto, segundo Leite, torna difícil uma previsão do cenário eleitoral do partido no ano que vem. "Não descarto nenhuma hipótese, apenas a de apoiar o PT. Não apoio PT e Lula em hipótese alguma", destacou.
"Senti que ele gostaria de ficar", diz Leite sobre Maia
O presidente do DEM paulista disse que, em conversas recentes com Rodrigo Maia, percebeu do ex-presidente da Câmara interesse em permanecer no partido. "Ele está com uma grande mágoa do presidente [nacional do DEM] ACM Neto. Não quer ficar no mesmo partido do ACM. Mas não quer sair do DEM. Senti que ele gostaria de ficar", declarou.
Maia rompeu com o DEM no início do ano, à época das negociações para a eleição da Mesa Diretora da Câmara. Então presidente da Casa, ele apoiou Baleia Rossi (MDB-SP) para a sua sucessão. E conseguiu que, oficialmente, a bancada seguisse o projeto. Mas a maior parte dos deputados acabou fechando com Arthur Lira (PP-AL), que se tornaria vitorioso. O episódio fez com que Maia anunciasse sua saída do partido, no qual está filiado por quase totalidade de sua vida pública e do qual foi presidente nacional.
O ex-presidente da Câmara, porém, ainda não formalizou sua saída do DEM, nem confirmou qual seria seu novo destino. Falou que tem identificação com o MDB, mas as negociações ainda não avançaram.
Enquanto isso, ele segue ausente do cotidiano da bancada do DEM na Câmara. "Ele não participa, não convive com a gente. Antes até participava pouco por ser o presidente, mas agora participa menos ainda. Não está interagindo com a bancada. E isso é por opção dele", destacou Leite.
A Gazeta do Povo procurou Maia e ACM Neto para esta reportagem, mas não obteve retorno.
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