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O vice-presidente da CPI da Covid do Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmou que a fala da médica Luana Araújo à comissão indica que "o comando paralelo [no Ministério da Saúde] continua funcionando". Segundo o parlamentar, o trecho do depoimento da médica que indicou essa condição foi quando ela falou sobre seu desligamento do Ministério. "Essa foi a maior contribuição do dia à CPI", disse.
Luana Araújo foi indicada, no mês passado, para o cargo de secretária de Enfrentamento à Covid-19 do Ministério da Saúde, mas permaneceu apenas dez dias na função. A escolha do seu nome foi feita pelo ministro Marcelo Queiroga. À CPI, ela disse não saber explicar os motivos do desligamento. Ela relatou que Queiroga a contou que a nomeação não seria confirmada e indicou que o motivo da não-efetivação seria uma "orientação superior". "Ela preenche todos os requisitos técnicos. Qual a razão para vetar alguém da natureza da doutora Luana?", questionou Randolfe.
O "gabinete paralelo" tem sido citado desde os dias iniciais da CPI, e corresponderia a uma estrutura que forneceria orientações ao presidente Jair Bolsonaro sobre a pandemia que estariam em desacordo com o definido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo próprio Ministério da Saúde. Entre as diretrizes repassadas pelo "gabinete paralelo" estariam a rejeição a medidas como distanciamento social e uso de máscaras, e a defesa do chamado tratamento precoce, com o uso de medicações como cloroquina e ivermectina, que não têm eficácia comprovada contra a Covid-19.
A médica evitou citar o nome de Bolsonaro e, quando confrontada com declarações do presidente, respondeu que ações de desrespeito às orientações gerais para o controle da pandemia podem, sim, influenciar na piora dos números.
Durante o depoimento, a médica expôs sua contrariedade ao tratamento precoce. Ela relatou não ter conversado a respeito com Queiroga e nem ter recebido pressões sobre o assunto por membros do Palácio do Planalto. Senadores que integram a base de Bolsonaro questionaram a médica e apontaram que o alinhamento ao tratamento precoce poderia ter contribuído para a redução de mortes no Brasil. Em resposta, Luana afirmou que os números indicam o oposto: houve, segundo ela, ampla distribuição de "kits-covid" pelo país, e o acesso aos medicamentos não resultou em melhores números.
CPI terá maratona de depoimentos e pode durar cinco meses
Nas duas próximas semanas, a CPI terá audiências entre terça e sexta-feira. A agenda inclui um dia a mais que o habitual, já que a regra é que a comissão se reúna de terça a quinta. Os depoimentos da próxima semana são o do ministro Marcelo Queiroga, na terça-feira (8), do ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde, Elcio Franco, na quarta (9), do governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), na quinta (10), e dos pesquisadores Claudio Maierovitch e Natalia Pasternak, na sexta-feira (11).
O depoimento de Lima estava agendado para o início do mês e foi antecipado por decisão do presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), em virtude da operação policial deflagrada nesta quarta que teve o governador como um dos alvos. Lima e membros do seu primeiro escalão são suspeitos de má gestão de recursos direcionados ao combate à pandemia.
Na semana posterior, falarão o secretário de Saúde do Amazonas, Marcellus Campêlo (dia 15), o ex-governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (dia 16), o empresário Carlos Wizard Martins (dia 17) e, no dia 18, Paulo Braúna, executivo da empresa White Martins, responsável pelo fornecimento de oxigênio am Amazonas.
A presença de governadores, ex-governadores e gestores estaduais é algo de interesse dos senadores que fazem parte da base do presidente Bolsonaro, que entendem que os efeitos negativos da pandemia no Brasil se explicam principalmente por decisões tomadas nos âmbitos estaduais e municipais. A convocação dos governadores contrariou membros da oposição, como Randolfe. À imprensa, o senador do Amapá disse não ser favorável à presença dos governadores por entender que a participação violaria dispositivos constitucionais. O Supremo Tribunal Federal (STF) deverá deliberar sobre o tema.
Segundo o senador Humberto Costa (PT-PE), a expectativa da comissão é de antecipar as sessões para evitar um prolongamento excessivo do colegiado. Mas há a possibilidade que a vigência da CPI seja de cinco meses.
Além das sessões com depoimentos, a CPI deverá ter também nos próximos dias um encontro para a discussão de requerimentos apresentados pelos parlamentares. Um deles pede a convocação do presidente da CBF, Rogério Caboclo, para falar sobre a realização da Copa América no Brasil. "Isso deverá ser confrontado pela CPI", disse Randolfe.