Acompanhado de 21 líderes partidários, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), se reuniu nesta quarta-feira (29) com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux. No encontro, os deputados fizeram um apelo para que a Corte evite interferir em temas de interesse de grupos que representam ou defendem no Legislativo.
O próprio Fux marcou o café da manhã, repetindo o que fez na semana passada com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e líderes da Casa. O objetivo oficial é harmonizar a relação entre os poderes – a iniciativa é uma tentativa do presidente do STF de responder a críticas internas de que teria deixado a Corte isolada em meio às criticas do presidente Jair Bolsonaro (PL), que acusa os ministros de atrapalharem o governo.
Desta vez, porém, Fux ouviu de vários parlamentares, principalmente do Centrão, o incômodo com decisões individuais dos ministros que contrariam deliberações ou atropelam discussões em andamento no Congresso.
Lira, por exemplo, pediu que o plenário da Corte dê prioridade ao julgamento colegiado de uma liminar de fevereiro de Alexandre de Moraes que suspendeu trechos da nova Lei de Improbidade Administrativa, aprovada no ano passado.
O ministro reverteu a regra da lei que havia proibido a advocacia pública – órgãos de defesa da administração pública – de ajuizar ações de ressarcimento em casos de desvio de recursos públicos. Moraes considerou que essa norma prejudica o combate à corrupção.
A nova lei obriga que as advocacias públicas defendam o gestor investigado, caso anteriormente tenham emitido pareceres favoráveis ao ato questionado – associações da classe também querem derrubar essa regra.
O presidente da Câmara disse a Fux que a nova lei é importante para proteger prefeitos que não agem com dolo (intenção) de causar lesão ao patrimônio público, de modo que eventuais erros na gestão possam ser remediados sem punição – também existe uma ação, sob relatoria de Moraes, que discute esse tema.
Moraes já liberou as ações para julgamento e Fux se comprometeu a pautá-las no plenário “em breve”, segundo informou a assessoria do STF. Na próxima sexta-feira (1º), o ministro deve definir a pauta de julgamentos de agosto até meados de setembro, quando deixará a presidência da Corte.
Perguntando sobre o que foi discutido no encontro, Lira disse que “alguns assuntos que estão tramitando no Supremo, e a Câmara tem preocupação, para que houvesse sempre equilíbrio e respeito aos limites”. Depois, destacou a “sensibilidade” de Fux “tanto na pauta, quanto na ausência de pauta”.
“O que mais foi discutido é independência, respeito entre os poderes, não deixar um avançar nos limites do outro”, disse à Gazeta do Povo o deputado Euclides Pettersen (PSC-MG).
Outros temas de tensão entre STF e Congresso
Em sua manifestação junto a Fux, a deputada Aline Sleutjes (Pros-PR) fez um apelo para que o STF não retome o julgamento que pode acabar com o marco temporal para demarcação de terras indígenas. Essa regra permite o reconhecimento apenas de áreas ocupadas pelas tribos na data de promulgação da Constituição de 1988. A bancada rural discute o tema na Câmara e teme uma decisão do STF que permita demarcações sobre propriedades agrícolas.
“Como defensora do agro, me manifestei para que não haja votação do marco temporal, que o STF espere o Legislativo decidir. Nós, que alimentamos 1 bilhão de pessoas no mundo, não podemos aceitar uma decisão que faça saltar de 14% para 28% o tamanho das áreas indígenas no país. Isso causaria um problema enorme de insegurança jurídica sobre o direito de propriedade”, disse a deputada à reportagem.
Há meses, o tema é objeto de queixas do presidente Bolsonaro, que diz que uma decisão do STF derrubando o marco temporal inviabilizaria a economia do país e seu governo. Na semana passada, Fux retirou o tema da pauta do plenário. O julgamento seria retomado no dia 23, mas agora não há mais data para a continuidade. A análise começou no ano passado, com um voto contra o marco temporal, por parte de Edson Fachin, e um a favor, de Kassio Nunes Marques. Alexandre de Moraes, que havia pedido vista, já preparou seu voto e é o próximo a se manifestar.
Na reunião com Fux, todos os deputados falaram e alguns pediram que o STF evite julgar outros temas sensíveis, especialmente no período eleitoral da campanha. Houve um pedido do deputado Altineu Côrtes (PL-RJ) contra decisões, no âmbito de uma ação do PSB, que restrinjam ainda mais operações policiais nas favelas do Rio de Janeiro.
Desde 2020, com apoio da maioria dos ministros, Edson Fachin impôs uma série de limites, com o objetivo de reduzir a letalidade policial; a bancada da segurança pública, porém, aponta para o avanço do poder do narcotráfico sobre as comunidades.
Mas também houve pedidos para que o STF tome medidas não aprovadas pelo Parlamento. O deputado Camilo Capiberibe (PSB-AP) pediu que o ministro Luís Roberto Barroso estenda ainda por mais tempo a suspensão de despejos de imóveis.
A pedido do Psol e em razão da pandemia, ele proibiu as desocupações até o fim de junho, sendo que lei aprovada no Congresso previa a vedação só até 31 de dezembro do ano passado. Barroso decidirá nesta quinta-feira (30) se estende ainda mais a proibição, o que beneficia moradores inadimplentes com pagamento de aluguéis ou parcelas de financiamento.
Na reunião, o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), ainda defendeu que o STF corrija saldos do FGTS conforme a inflação, e não em 3% ao ano, como atualmente. O pedido também está com Barroso, que já tem voto pronto sobre o assunto, mas a tendência é que ele se posicione contra o reajuste pela inflação.
Oposição pede firmeza do STF contra eventual questionamento ao resultado das eleições
A reunião de Fux com líderes também contou com vários deputados de oposição. Alguns deles, do PT, PDT e PCdoB, principalmente, pediram que a Corte adote posição firme contra eventuais tentativas de questionamento do resultado das eleições. Os partidos apoiam o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e alertam para o risco de Bolsonaro não aceitar uma eventual derrota.
“Nosso processo democrático sai fortalecido. Falei [com Fux] que a nossa democracia tem que conviver com a alternância de poder. Citei o exemplo da Colômbia, lá sempre teve eleição, e acabou a eleição, acabou o processo. Espero que o sistema de Justiça, com independência e harmonia entre os poderes, respeite o que há de mais nobre e soberano, que é o voto popular. Que possamos então fazer essa travessia e consolidar o processo democrático. Que tanto o Poder Legislativo, quanto o Supremo, reafirmem que ganhou, ganhou as eleições e o processo está definido”, afirmou na saída o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG).
À reportagem, Orlando Silva (PCdoB-SP) disse estar “muito convencido que a eleição vai ter seu curso e regra do jogo vai ser cumprida”. “Não sou daqueles que se apavora com risco de ruptura.”
Fux pede manutenção de veto aos deputados
O presidente do STF, Luiz Fux, falou pouco no encontro. Basicamente, fez um balanço de sua gestão no comando da Corte, que termina em setembro, e fez apenas um pedido: que o Congresso mantenha o veto de Bolsonaro a trecho de um projeto de lei que dificultaria a realização de sessões virtuais na Corte.
A norma aprovada pelos parlamentares permitiria que advogados fizessem sustentações orais em tempo real nesses julgamentos, realizados de forma remota e nos quais os ministros votam por escrito, dentro do sistema processual eletrônico.
No início de junho, a pedido do próprio Fux, Bolsonaro vetou essa previsão, que poderia atrapalhar os julgamentos, que costumam durar uma semana. As sessões virtuais cresceram desde o início da pandemia e reduziram o acervo de processos pendentes de julgamento.
Participaram do café da manhã, além de Arthur Lira (PP-AL), os deputados federais:
- Paulinho da Força (Solidariedade-SP)
- Vinicius de Carvalho (Republicanos-SP)
- Camilo Capiberibe (PSB-AP)
- Antônio Brito (PSD-BA)
- André Fufuca (PP-MA)
- Cezinha de Madureira (PSD-SP)
- Orlando Silva (PCdoB-SP)
- André Figueiredo (PDT-CE)
- Alex Manete (Cidadania-SP)
- Adolfo Viana (PSDB-BA)
- Aline Sleutjes (Pros-PR)
- Reginaldo Lopes (PT-MG)
- Felipe Francischini (União-PR)
- Altineu Côrtes (PL-RJ)
- Celina Leão (PP-DF)
- Paulo Bengtson (PTB-PA)
- Renildo Calheiros (PCdoB-PE)
- Afonso Florence (PT-BA)
- Alencar Santana (PT-SP)
- Euclides Pettersen (PSC-MG)
- Fred Costa (Patriota-MG)
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