De um lado, o aparato institucional e governista do desfile militar em Brasília. Do outro, a aglomeração de populares e lideranças da oposição na maior cidade do país. Com essas duas imagens, o 7 de setembro será marcado este ano por um embate político em torno da figura do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Responsável pela derrubada, desde sexta-feira (30), da rede social X no Brasil, no rastro de uma série de decisões consideradas pela direita contrárias à liberdade de expressão, aos direitos constitucionais e às garantias democráticas, o magistrado colocará em lados opostos as maiores concentrações do país nesta data cívica.
Na manhã deste sábado, em Brasília, o tradicional desfile militar na Esplanada dos Ministérios, comandado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e organizado pelas Forças Armadas, deve ter Moraes como um convidado de honra por iniciativa do governo. O juiz e todas as suas decisões polêmicas têm recebido o respaldo público do chefe do Executivo e deverá se posicionar próximo dele na cerimônia, que terá diversas atrações. Estão sendo aguardados cerca de 50 mil espectadores.
Já à tarde, na Avenida Paulista, em São Paulo, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e os seus aliados conduzirão ato público que prevê atrair uma multidão de centenas de milhares de manifestantes vestidos de verde e amarelo e empunhando cartazes e faixas, voltado à defesa da liberdade de expressão, da anistia aos condenados do 8 de Janeiro e do impeachment do magistrado. A exemplo dos outros dois grandes protestos de massa protagonizados por Bolsonaro, a expectativa é de que a imagem de quarteirões da avenida e ruas paralelas lotadas tenha impacto dentro e fora do Brasil.
Desfile oficial em Brasília está orçado em R$ 7 milhões
Marcado para iniciar às 8h45, o evento oficial na capital do país está orçado em R$ 7 milhões pelo governo, com atrações especiais e extensão ampliada até o Museu da República. Para completar, cidadãos estão sendo chamados a comparecer por meio de anúncios em emissoras de rádio locais. Servidores públicos também são aconselhados a reforçar a plateia. Para mitigar os efeitos do calor e baixa umidade esperados, o governo do Distrito Federal vai oferecer 30 mil litros de água gelada em pontos diversos.
Com mobilização de forte esquema de segurança, a Esplanada dos Ministérios será fechada para circulação de veículos a partir das 23h desta sexta-feira (6) como parte dos preparativos para o desfile de 7 de Setembro.
Além dos custos elevados envolvidos na organização, a festa cívica também despertou críticas em razão da notícia de que grupos invasores como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) desfilariam como homenageados por ajudar no socorro ao Rio Grande do Sul. A iniciativa do Palácio do Planalto gerou desconforto às Forças Armadas, responsáveis pela organização do evento.
A ideia acabou sendo rechaçada pela cúpula militar e a participação dos movimentos cancelada, segundo fontes ligadas às Forças Armadas. Na terça-feira (3), o governo informou que a participação do MST e MTST foi descartada devido a “problemas logísticos”.
Este ano, o desfile da independência abordará os temas vacinação, cúpula do G20 no Rio de Janeiro e reconstrução do Rio Grande do Sul. Também serão homenageadas diversas corporações militares. Restou então como controvérsia para a ocasião institucional a figura de Alexandre de Moraes, que foi convidado pelo ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, a comparecer.
"Eu convidei o ministro Alexandre, em nome do presidente, e ele respondeu prontamente que vai ao nosso desfile do 7 de Setembro. Estou chamando todos os ministros do STF”, disse Múcio ao Estadão. O gesto foi observado por analistas políticos como um reforço do apoio do governo Lula ao ministro em meio a manifestações pelo impeachment do magistrado.
Imagem negativa de Moraes será exposta pela manifestação na Avenida Paulista
Poucas horas depois, às 14h, na capital paulista, o ministro do STF será retratado de forma negativa no ato público convocado pelo pastor Silas Malafaia, em cartazes, faixas e pronunciamentos no trio elétrico, além de bonecos infláveis gigantes de autoridades. Além de organizar o evento suprapartidário, Malafaia promete fazer o seu “mais duro discurso contra o ditador Moraes”, após os que fez no mesmo local em fevereiro e na Praia de Copacabana, em abril.
Na semana passada, Jair Bolsonaro reforçou o convite à população para participar do ato na Paulista, evitando sua repetição em outras cidades. A exemplo do ocorrido em fevereiro, o ex-presidente voltou a pedir que a população o ajude a exibir uma “fotografia para o mundo”, formada por uma multidão vestida de verde e amarelo. O protesto público contra Moraes também foi endossado por Elon Musk, que tem usado o X para denunciar “ordens ilegais” do ministro contra perfis da rede social.
Ao longo desta semana a mobilização contra Moraes também chegou a um telão na Times Square, em Nova York, na forma de uma imagem de incentivo ao uso do software VPN (Rede Privada Virtual). Ela traz um homem parecido com Moraes com a frase “VPN-SE”, uma referência à decisão do ministro de suspender as atividades do X no Brasil e de fixar multa de R$ 50 mil para quem usar serviços de VPN para acessar a plataforma.
Para especialista, ação de Moraes contra o X conseguiu engajar a sociedade
Segundo o cientista político Leandro Gabiati, professor do Ibmec-DF e diretor da consultoria Dominium, as recentes decisões de Alexandre de Moraes atingiram um ápice de repercussão social nos últimos dias, especialmente após a suspensão da plataforma X. Uma pesquisa da AtlasIntel, divulgada nesta quinta-feira (5), apontou que a postura do magistrado intensificou a polarização política, já que a maioria da população enxerga o banimento da rede social como uma medida com conotações políticas.
"As manifestações nas redes sociais e em espaços públicos mostram que o ativismo judicial passou a engajar todos os espectros políticos, indo além da direita, alcançando também a esquerda e os moderados de centro. A controvérsia em torno da suspensão de uma rede social não é mais vista apenas como uma ação jurídica, mas também como um ato político. Isso leva a população a se posicionar diante de um cenário que ela percebe como muito mais amplo do que um simples embate judicial", explicou.
Protesto antecede o protocolo de pedido de impeachment de Moraes no Senado
Parlamentares da oposição ao governo Lula veem no ato do 7 de Setembro uma maneira de pressionar o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a autorizar a abertura do processo de impeachment de Moraes a partir de um pedido que será protocolado na segunda-feira (9). Na noite da terça-feira (3), o senador Eduardo Girão (Novo-CE), autor da iniciativa seguida de uma campanha nacional pela destituição do ministro, cobrou diretamente de Pacheco no plenário “que se mostre democrático”.
Mesmo que o volume de manifestantes não supere ou alcance o patamar da manifestação de fevereiro, também na Avenida Paulista, organizadores têm boas expectativas com a força dos símbolos políticos que querem exibir. Durante o evento, serão exibidos bonecos gigantes de Musk e Moraes, representando o duelo deles.
O grupo Movimento #ForaMoraes, liderado por Guilherme Sampaio e Marco Antônio Costa, também planeja um boneco do senador Rodrigo Pacheco vestido de banana, como forma de pressioná-lo a dar andamento ao impeachment de Moraes no Senado. Ao todo, sete grupos conservadores solicitaram à Polícia Militar de São Paulo autorização para se integrarem à manifestação, incluindo o #ForaMoraes.
Um panfleto em elaboração para ser distribuído na Avenida Paulista lista 10 situações que justificam o “impeachment já” do ministro, tais como violação de prerrogativas de parlamentares, fatos omitidos envolvendo o incidente com turistas em Roma, a manutenção de presos com doenças graves apesar de ter soltura recomendada pelo ministério público, entre outras.
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