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O diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, que depõe nesta quinta-feira (27) na CPI da Covid do Senado, afirmou que a instituição fez ofertas de vacinas ao Ministério de Saúde que permaneceram sem resposta. Segundo ele, o Butantan falou em 60 milhões de doses, ainda ao longo do segundo semestre do ano passado. Covas disse que o encaminhamento das ofertas poderia ter feito do Brasil "o primeiro país do mundo" a vacinar a sua população. O governo federal acabou fechando depois um acordo com o Butantan para a compra de vacinas, mas apenas em 7 de janeiro.
A dificuldade de andamento das negociações entre Butantan e o governo federal ocorreu, segundo Dimas Covas, após o presidente Jair Bolsonaro reverter um entendimento que havia sido feito entre o instituto e o então ministro da Saúde Eduardo Pazuello.
Em 19 de outubro, declarou Covas, Butantan e o governo federal haviam firmado a parceria para a negociação das vacinas; no dia seguinte, houve uma reunião entre Pazuello, Covas e representantes de governos estaduais, em que foi divulgada a ideia da aquisição dos imunizantes; no dia 21, porém, Bolsonaro disse nas redes sociais que não compraria "a vacina da China" e as conversas foram interrompidas. Covas declarou que não houve nenhum ofício ou manifestação formal que barrasse as negociações, mas a consequência foi o esfriamento no diálogo.
A vacina produzida no Butantan, a Coronavac, é chamada de "vacina da China" por ter sido inicialmente desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac. Butantan e Sinovac firmaram um acordo de cooperação para a reprodução do imunizante no Brasil. Segundo Dimas Covas, após o recuo do governo federal foram iniciadas as negociações para a venda de vacinas a governos estaduais e municipais.
O diretor do Butantan disse ainda que há um problema no recebimento de insumos necessários para a produção de vacinas e que a condição pode levar o instituto a atrasar o cronograma de entregar 54 milhões de doses até 30 de setembro, como estava previsto.
O depoimento de Dimas Covas, que ainda está em curso, é o segundo da CPI da Covid nesta semana. Na terça (25), a comissão ouviu a médica Mayra Pinheiro, secretária de Gestão do Trabalho e da Educação do Ministério da Saúde, que ficou conhecida como "Capitã Cloroquina" pelo fato de defender o uso da substância no tratamento precoce contra a Covid-19.
Diretor do Butantan fala de "tratamento diferente"
O senador Marcos Rogério (DEM-RO) perguntou a Covas sobre a cronologia da produção da Coronavac e questionou a ideia colocada de que o Brasil poderia ter realizado vacinações ainda em 2020. O parlamentar citou datas de aval da Coronavac e de outros imunizantes e recordou que as aprovações chegaram próximas ao fim do ano. Na avaliação do senador, isso justificaria o receio do governo federal em empreender tratativas para a compra da Coronavac.
Em resposta, Covas citou que o Ministério da Saúde promoveu negociações com a farmacêutica AstraZeneca quando a vacina feita pelo laboratório estava no mesmo grau de avaliação em que a Coronavac se encontrava. "Houve um tratamento diferente, houve duas formas de entender a vacina por parte do governo federal", declarou.
O diretor do Butantan falou também que o governo federal não investiu nenhum recurso até o momento para a produção de vacinas no insituto, e que solicitações foram enviadas ao Ministério da Saúde.
Novos tempos e Butanvac
Covas foi questionado pelos senadores se o posicionamento crítico à China por parte do ex-ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, afetou as negociações para a compra de insumos necessários à produção dos imunizantes. Ele evitou dar respostas diretas contra Araújo, mas expôs que a chegada do atual chanceler, Carlos França, representou um novo estágio para as negociações. Segundo Covas, foram promovidas reuniões com outros integrantes do primeiro escalão do governo, como o ministro Paulo Guedes, da Economia.
O diretor do Butantan declarou ainda que vê a possibilidade de a Butanvac, a vacina produzida integralmente pelo instituto, estar disponível para a população ainda no fim do ano. A expectativa, segundo ele, é de uma produção inicial de 40 milhões de doses. Covas chamou o imunizante de "vacina 2.0" e disse que a subtância já incorpora o combate a variantes do coronavírus.
Mas Covas ressaltou que não existem, no momento, negociações entre o governo federal e o Butantan para a aquisição do imunizante.
Críticas nas redes sociais
Covas declarou que a exposição vivida pelo Butantan desde que o debate sobre as vacinas passou à esfera pública fez com que a instituição se tornasse vítima de ataques nas redes sociais, o que ele considerou como algo que criou consequências no trabalho da instituição.
Ele também disse se considerar "decepcionado" com as críticas feitas por lideranças políticas ao Butantan. Na avaliação de Covas, os ataques ao Butantan são "ataques à ciência brasileira".