Ponto alto da viagem do presidente Jair Bolsonaro pela Ásia, a promessa feita pelo governo da Arábia Saudita de investimentos de US$ 10 bilhões no Brasil só começará a sair do papel em 2020. Em entrevista a jornalistas brasileiros em Riad nesta quinta-feira (31), o ministro de Comércio e Investimento da Arábia Saudita, Majid bin Abdullah Al Qasabi, disse que encabeçará uma missão ao Brasil que será realizada no primeiro trimestre do ano que vem para definir os projetos escolhidos. Ele adiantou que a prioridade número um será a área de agricultura.
“Nós acreditamos que podemos fazer mais com o Brasil [na agricultura]. Podemos importar mais produtos.” Segundo ele, o Brasil será um parceiro estratégico no plano geral de segurança alimentar da Arábia Saudita. Localizada em uma península desértica, o país tem severas dificuldades para produção de alimentos.
Os investimentos serão feitos por meio do Fundo Soberano da Arábia Saudita, poupança de US$ 300 bilhões gerados pela produção de petróleo. O país tem a segunda maior reserva petrolífera do mundo (só perde para a Venezuela) e é o maior exportador do planeta. O tamanho do fundo deve aumentar mais de seis vezes com a abertura de capital (IPO, sigla em inglês) da companhia de petróleo saudita, Aramco, que prevê arrecadar US$ 2 trilhões com a venda de 5% das ações.
Em segundo lugar, o ministro destacou que o país pretende avaliar as áreas de serviço, logística e infraestrutura (em especial, o programa de privatizações brasileiras). Durante o tour asiático, Bolsonaro reforçou o convite para que chineses e sauditas participem do megaleilão de áreas do pré-sal, que começa nos próximos dias. O governo árabe ainda não confirmou até onde pretende ir nessa concorrência.
Al Qasabi relatou que Bolsonaro apresentou uma lista de 48 oportunidades. “A autoridade de investimento da Arábia Saudita já identificou algumas poucas que são propriamente factíveis e podemos seguir em frente.” O ministro não informou quais eram.
Durante fala no evento Iniciativa para Investimento Futuro, conhecido como “Davos do Deserto” e que acaba nesta quinta, Bolsonaro afirmou que havia sugerido ao príncipe herdeiro do país, Mohammed bin Salman, que parte do dinheiro fosse destinado ao projeto para melhorar a infraestrutura turística de Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. A proposta também não foi citada pelo ministro.
“O sucesso [da relação entre sauditas e brasileiros] é se comunicar, engajar, discutir, perguntar, promover, questionar. Você sabe, no final do dia, o dinheiro vai para onde faz mais sentido que ele vá”, adiantou Al Qasabi.
Dinheiro árabe é o dobro que o Brasil pretende investir por conta própria em 2020
Os US$ 10 bilhões prometidos pelos árabes equivalem a cerca de R$ 40 bilhões. É mais que o dobro dos R$ 19,6 bilhões previstos pelo governo Bolsonaro para investimentos do caixa próprio da União no projeto de orçamento de 2020. Comparativamente, também é muito mais que os R$ 30,4 bilhões estipulados para o Bolsa Família.
Não está claro, porém, qual será o fluxo do recurso – se ele chegará ao Brasil ao longo do ano que vem ou se estenderá por diversos anos. Nem o padrão dos investimentos. Os árabes podem, por exemplo, emprestar dinheiro para iniciativa privada investir, comprar empresas privadas ou priorizar as privatizações feitas pelo governo.
Há apenas uma empresa do agronegócio brasileiro que já recebeu dinheiro do fundo saudita, a Minerva Foods. Em 2015, o Salic (braço do fundo soberano saudita para o agronegócio) comprou 20% da empresa, terceira maior empresa de carne bovina do Brasil por R$ 750 milhões.
“Quando o governo saudita resolve entrar, ele não aporta apenas dinheiro, mas todo um plano de governança para ajudar a empresa a se desenvolver”, diz o brasileiro Adalberto Netto, que trabalha para o Ministério da Indústria da Arábia Saudita como chefe de estratégia de atração de investimentos o programa de desenvolvimento industrial. Há um consenso entre o empresariado de que os árabes preferem escolher negócios em que tenham papel de decisão – e não sejam apenas investidores distantes.
US$ 10 bilhões é muito? Veja a promessa feita aos indianos
Apesar dos US$ 10 bilhões serem muito dinheiro para a realidade brasileira, outro parceiro dos sauditas deixou o país com uma perspectiva de investimentos dez vezes maior nesta semana. Um dia antes da negociação com Bolsonaro, os árabes prometerem investimentos de US$ 100 bilhões para a Índia. E, no país asiático, o nível de detalhamento é bem maior.
Al Qasabi confirmou os planos para construir a maior refinaria de petróleo do mundo na Índia. O projeto da estatal Aramco tem custo inicial de US$ 35 bilhões, que devem chegar a US$ 60 bilhões. Os planos de parceria também incluem a construção de uma escola tecnologia indiana na Arábia Saudita.
* O jornalista viajou a convite do governo da Arábia Saudita.
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