A indicação do ministro da Justiça, Flávio Dino, ao Supremo Tribunal Federal (STF) abriu a Esplanada para especulações a respeito de possíveis nomes para sua sucessão. Outro ponto que tem levantado hipóteses entre governistas e a oposição é se o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decidirá, como prometido durante a campanha, pela divisão do ministério, o que resultaria em uma pasta dedicada à Justiça e outra à Segurança Pública.
Entre os mais cotados por políticos e pela imprensa estão Ricardo Cappelli, atual secretário-executivo do ministério; o ex-ministro do STF Ricardo Lewandowski; o advogado-geral da União, Jorge Messias, que era uma das possíveis indicações de Lula ao STF; a ministra do Planejamento, Simone Tebet (MDB); o advogado Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do Grupo Prerrogativas; e o advogado Augusto Arruda Botelho, secretário Nacional de Justiça. O nome da presidente nacional do Partido dos Trabalhadores, Gleisi Hoffmann, também está sendo aventado.
A decisão de Lula, porém, ainda é uma incógnita. Responsável pelo Centro de Pesquisa em Direito e Segurança (Cepedes), o jurista Fabrício Rebelo avalia que a escolha dependerá, essencialmente, do que se pretende definir para os rumos da pasta e até mesmo de sua possível divisão.
Mantida a estrutura ministerial como está, o especialista aposta que o substituto técnico natural para Dino seja Cappelli. Por outro lado, caso seja realizada a divisão das pastas, o advogado Augusto Arruda Botelho, secretário Nacional de Justiça, poderia ser alçado a Ministro da Justiça, com Cappelli indo para a pasta da Segurança Pública – o que demonstra a variedade de arranjos à disposição do governo neste momento.
“Se a escolha for política, o leque se amplia, podendo até mesmo alcançar o ex-ministro do STF, Ricardo Lewandowski, que tem sido sinalizado como opção”, afirma o jurista.
Um dos indicativos que sugere Lewandowski como um dos favoritos nessa disputa, além de sua boa relação com o presidente, é a presença dele na comitiva que acompanha Lula ao Oriente Médio nesta semana.
Barganha de gênero
A indicação de Tebet, também bastante aventada, tem sido analisada como alternativa para dar mais visibilidade à inclusão de mulheres em cargos destacados no governo. No entanto, como ela já está a frente do Ministério do Planejamento, a medida tende a ser, no mínimo, redundante. Outra possibilidade para responder a esta cobrança que Lula vem sofrendo seria a indicação de Gleisi Hoffmann.
Ao indicar Dino ao STF, Paulo Gonet à Procuradoria-Geral da República (PGR) e ter demitido duas mulheres do alto escalão do governo, Lula tem dado provas de que não está preocupado com a representatividade feminina. “Todas essas pautas, como sexismo, identitarismo, critérios de raça, são largamente utilizadas pela esquerda em seus discursos e campanhas, mas quando o partido chega ao poder, tudo isso é deixado de lado”, opina Rebelo.
Em seu perfil nas redes sociais, o senador Sérgio Moro (União-PR), também criticou o uso midiático da pauta de gênero ao se referir à indicação de Dino ao STF – houve expectativas, por parte de uma ala progressista que apoiou a campanha de Lula à presidência no ano passado, de que o presidente indicasse uma mulher para a vaga deixada pela ministra Rosa Weber.
“No final, toda a conversa do Lula sobre diversidade era só conversa. Sequer foi cogitada uma mulher na lista dos favoritos. Prevaleceram as razões políticas”, escreveu o senador em seu perfil no X.
Na reforma ministerial concretizada em meados do segundo semestre, Lula mostrou desenvoltura em retirar pelo duas mulheres do primeiro escalão do governo: a ex-ministra do Esporte Ana Moser, que foi substituída por André Fufuca (PP), e a ex-presidente da Caixa Maria Rita Serrano, que deu lugar a Carlos Vieira, também indicado pelo PP.
Depois dessas trocas, o presidente culpou os partidos do Centrão pelas indicações e pela falta de “representatividade feminina” em seus ministérios.
Sinalização de divisão das pastas
Caso Tebet seja indicada, as análises apontam que há maiores possibilidades para a criação da nova pasta. No plano de governo de sua candidatura à presidência em 2022, a atual ministra incluía a criação do Ministério da Segurança Pública dentre seus "Princípios, Diretrizes e Compromissos".
Há especulações de que uma ala do Planalto seja a favor da divisão do ministério e da realocação de Tebet, o que permitiria ao governo contemplar mais aliados na Esplanada. Em consonância com essa visão, Lula acenou novamente para a possibilidade de recriar o ministério, em sua live semanal realizada no dia seguinte aos ataques que deixaram 25 ônibus incendiados no Rio de Janeiro em outubro deste ano.
“Quando fiz a campanha, ia criar o Ministério da Segurança Pública. Ainda estou pensando em criar, quais são as condições, como que vai interagir na questão da segurança dos Estados porque o problema da segurança é estadual. O que queremos é compartilhar com os Estados as soluções dos problemas”, afirmou.
Quando a solução pode se tornar um problema ainda maior
Há, no entanto, vozes contrárias à criação da pasta. Alas do próprio PT estariam receosas de que a medida concentre a atenção na área de menor aprovação do governo. Segundo pesquisa realizada pela Atlas Intel em novembro, 60,8% dos brasileiros mencionaram a criminalidade e o tráfico de drogas como sendo o maior obstáculo para o país.
Ainda que por razões distintas, o deputado federal Marcel Van Hattem (NOVO-RS), da oposição ao governo, também desaprova a medida. O parlamentar afirma que a gestão Lula caminha para se tornar aquela com o maior número de ministros na Esplanada [39 ao todo], uma inadequação em um momento em que governo e Congresso negociam o déficit fiscal e o orçamento para o próximo ano.
“Em um momento de contenção de despesas e de busca da eficiência na máquina pública, essa decisão vai absolutamente na contramão. O Ministério de Segurança Pública deve ser junto com o Ministério da Justiça. O número de ministérios tem de ser reduzido, não aumentado”, afirma o parlamentar.
Falta de efetividade e necessidade de mostrar trabalho
Flávio Dino também é contrário ao desmembramento da pasta, o que não deixa de ser compreensível, dada sua posição de ministro e a maior influência e poder que a atual configuração lhe oferece. Assim como Capelli, ele acredita que o problema da segurança pública no Brasil não será resolvido com a criação de mais um ministério.
Em declaração recente, Tebet endossou a visão do ministro, embora tenha defendido sua proposta de campanha. "Estávamos bem servidos porque tínhamos o ministro Flávio Dino que permitia aglutinar as pastas. Mas eu, enquanto candidata, sempre defendi essa divisão."
Mesmo diante dos elogios de Tebet, a gestão de Dino no MJSP se mostrou incapaz de deixar uma marca ou resultado positivo ao longo de 11 meses, e ele tem sido cobrado por isso. Em razão da falta de resultados, aliados do governo se veem frente à necessidade de fazer algo de efetivo para apagar a ineficiência do ministro.
Nesse sentido, a recriação do ministério é defendida como uma possível solução, desde que seja indicada para liderar a pasta uma pessoa capaz de empreender abordagem focada e especializada diante da complexidade do tema. Ou seja, alguém de perfil mais técnico e menos político.
Segurança Pública por quem entende da área
Esse é o principal ponto destacado por congressistas que entendem da matéria. O senador Sergio Moro, por exemplo, que foi ministro da Justiça no governo do presidente Jair Bolsonaro, defende que, caso haja a criação do novo ministério, que seja alocada uma pessoa capacitada para lidar com o tema.
“A questão relevante não é separar a Justiça da Segurança Pública, mas sim colocar um ministro que seja vocacionado e que entenda o tema da segurança pública, o que nós não tivemos ainda nesse governo”, afirma.
Moro destaca ainda que a separação das pastas já foi realizada durante o governo Temer com resultados positivos, que se mantiveram quando houve a reunificação posterior, inicialmente sob seu comando.
O deputado federal Ubiratan Sanderson (PL-RS), presidente da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado da Câmara dos Deputados, compartilha dessa visão. Ele afirma que somente seria a favor da criação do ministério se a pasta fosse ocupada por alguém técnico, uma hipótese na qual admite acreditar muito pouco.
Composição política e tecnicismo simultaneamente
Segundo Rebelo, uma outra composição possível é que a divisão dos ministérios possa ser utilizada, em parte, para composição política, com a tendência de favorecimento ao Centrão, e não ao próprio PT, na pasta da Justiça.
“O natural, ao menos num primeiro momento, é se fazer isso promovendo alguém mais técnico para pasta da Segurança, a fim de se ter menos contestação. O Ministério da Justiça ficaria destinado para essa composição política, que seria definida pelo maior ganho que o governo puder ter”, afirma.
Conforme reportado pelo portal Metrópoles, já há propostas para a divisão ministerial sobre a mesa de Lula. O Ministério da Segurança Pública ficaria com a Secretaria de Segurança Pública, que seria desmanchada e recomposta, a Secretaria Nacional de Políticas Penais, a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal.
Sob o comando do Ministério da Justiça, ficariam a Secretaria de Assuntos Legislativos, Secretaria de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos, Secretaria Nacional de Justiça, Secretaria Nacional do Consumidor, Secretaria de Acesso à Justiça, Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e Autoridade Nacional de Proteção de Dados.
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