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O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, disse que os colegas Braga Netto e Luiz Eduardo Ramos tiraram dinheiro para combate a queimadas. Criticado por Mourão, disse não ter se precipitado.
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, disse que os colegas Braga Netto e Luiz Eduardo Ramos tiraram dinheiro para combate a queimadas. Criticado por Mourão, disse não ter se precipitado.| Foto: Gilberto Soares/MMA

A disputa por verbas travada na sexta-feira (28) entre o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e ministros do "núcleo militar" expôs uma divisão na política ambiental do governo federal.

Criticado por ambientalistas desde o início da gestão e considerado por alguns colegas como um empecilho ao fechamento de acordos comerciais com outros países – ainda mais depois de falar em "passar a boiada" para modificar o regramento ambiental –, Salles veio a público denunciar o corte de verbas para o combate a queimadas. O bloqueio segundo ele, paralisaria todas as operações na Amazônia, Pantanal e demais regiões do país já a partir de segunda-feira (1.º).

Geralmente tido como "vilão" do meio ambiente, Salles acabou ficando no papel de "mocinho" nessa novela, lutando por recursos para enfrentar os incêndios, em contraposição aos generais Braga Netto (ministro da Casa Civil), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e Hamilton Mourão (vice-presidente da República e presidente do Conselho da Amazônia).

O remanejamento de pouco mais de R$ 60 milhões destinados a Ibama e Instituto Chico Mendes (ICMBio), segundo Salles, teria sido feito a pedido de Braga Netto e Ramos. Após divulgar nota anunciando a paralisação das operações, Salles foi criticado por Mourão, que viu "precipitação" na conduta do ministro. O ministro, no entanto, bateu o pé e conseguiu desbloquear os recursos. As operações, assim, vão continuar.

Em resposta a Mourão, Salles afirmou não ter se precipitado. Contou ter sido informado na quinta (27) sobre possível bloqueio de R$ 20 milhões, mas que no dia seguinte foi surpreendido pela suspensão de mais de R$ 60 milhões. "[O bloqueio] está documentado no sistema, não tem discussão", disse ao jornal "Valor Econômico".

Ele afirmou que o bloqueio não poderia ter ocorrido de forma alguma porque o dinheiro é gasto conforme as operações se desenrolam. E disse que a repercussão negativa colaborou para a rápida solução. "Não podemos ficar nem um dia sem o recurso (...) São recursos que estão em pleno andamento."

Na nota em que anunciou o bloqueio, no fim da tarde, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) avisou que a medida provocaria a desmobilização de:

  • 1.346 brigadistas, 86 caminhonetes, 10 caminhões e 4 helicópteros no combate às queimadas no âmbito do Ibama;
  • 77 fiscais, 48 viaturas e 2 helicópteros no combate ao desmatamento ilegal no âmbito do Ibama;
  • 459 brigadistas e 10 aeronaves Air Tractor que atuam no combate às queimadas, no âmbito do ICMBio; e
  • 324 fiscais nas operações de combate ao desmatamento ilegal do ICMBio.

Mais tarde, às 19h54, o MMA publicou uma atualização, informando que "houve o desbloqueio financeiro dos recursos do Ibama e ICMBIO e que, portanto, as operações de combate ao desmatamento ilegal e às queimadas prosseguirão normalmente".

Salles tentou demarcar território após "fritura"

De acordo com o jornal "O Estado de S. Paulo", as notas e declarações do ministro no episódio foram vistas na Esplanada como uma tentativa de demarcar território, depois de ser alvo nos últimos meses de uma "fritura" atribuída justamente a ministros militares. Eles veriam na política ambiental conduzida por ele um empecilho à assinatura e evolução de tratados comerciais.

A condução da área ambiental no Brasil tem sido usada por europeus como pretexto para não ratificar o acordo entre União Europeia e Mercosul. E, nos últimos meses, investidores e empresas estrangeiras fizeram uma enxurrada de manifestações de preocupação com a agenda ambiental do governo brasileiro.

Fundos chegaram a afirmar que a continuidade do desmatamento provoca "incerteza generalizada sobre as condições para investir ou fornecer serviços financeiros ao Brasil", e pode fazer com que os títulos soberanos brasileiros "sejam considerados de alto risco".

Empresários mencionaram risco de suspender compras de produtos brasileiros. No início de julho, uma empresa norueguesa excluiu uma subsidiária da Cargill da lista de fornece​dores, em retaliação ao desmatamento ilegal na Amazônia.

Em resposta, o governo intensificou o contato com empresários e investidores. Presidente do Conselho da Amazônia e comandante da Operação Verde Brasil 2, o vice Hamilton Mourão tomou a frente dessa missão, deixando Salles em segundo plano.

Admitindo que os investidores internacionais querem "ver resultados" no combate ao desmatamento, o vice-presidente passou a concentrar a divulgação de ações do governo no meio ambiente.

Enquanto isso, Salles, em diferentes oportunidades, manteve o discurso de que o Brasil é exemplo para o mundo na preservação ambiental – em entrevista à Gazeta do Povo, afirmou que europeus, asiáticos e os Estados Unidos devem ao país US$ 100 bilhões em créditos de carbono.

A tese de que o Brasil é referência é defendida pelo presidente Jair Bolsonaro e pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. No início do mês, Guedes subiu o tom num evento internacional: "Entendemos a preocupação de vocês [norte-americanos], porque vocês desmataram suas florestas", afirmou.

Mas, em alguns momentos, Salles optou por um tom mais comedido. Em julho, por exemplo, reconheceu ser "justa" a percepção sobre o meio ambiente no Brasil e prometeu estreitar relações com a iniciativa privada e países europeus para debater soluções completas para a Amazônia. "Que há interesses comerciais entre países e mercados, não tem dúvida. Mas se soma a isso uma percepção da sociedade e consumidores sobre o tema ambiental, percepção essa que é justa", disse na ocasião.

Nesta semana, o ministro fez cobranças ao setor produtivo. Em videoconferência promovida pela Sociedade Nacional da Agricultura (SNA), destacou que o agronegócio exportador que se beneficia da Amazônia e quer preservar sua imagem de sustentabilidade frente ao mundo deveria "partilhar parte de sua receita com exportações" para ajudar a preservar a região.

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