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Quatro Propostas de Emenda à Constituição (PECs) que sugerem desde a fixação de mandatos até a derrubada de decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) tramitam atualmente no Congresso Nacional. Por meio delas, parlamentares tentam frear a atuação dos ministros, pois consideram que há interferência da Corte em matérias que são de competência do Legislativo.
A mais avançada delas é a PEC 08/2021, de autoria do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), foi aprovada na última quarta-feira (4) em tempo recorde - 40 segundos - pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal. Essa PEC limita decisões monocráticas de ministros de tribunais superiores, além de fixar prazo para pedidos de vista nas ações.
A ofensiva contra o que parlamentares tem chamado de "usurpação" de competências ganhou fôlego depois que o Supremo derrubou o marco temporal para demarcação de terras indígenas, que já tinha sido aprovado na Câmara, em maio deste ano, e no Senado, em setembro. A tese previa que a cessão das áreas aos indígenas só valeria para terras que já estivessem habitadas pelos indígenas na data da promulgação da Constituição, 5 de outubro de 1988.
Em resposta a esse julgamento e devido às discussões no STF de temas como a descriminalização do aborto e das drogas, deputados e senadores se uniram a diversas frentes parlamentares para protestar contra a interferência do STF no Legislativo, e pedir aos presidentes da Câmara e Senado que se manifestassem em favor do equilíbrio entre os poderes.
O movimento incluiu a obstrução de projetos e a pressão pelo avanço de pautas de costumes na agenda das Casas, como as Propostas de Emenda à Constituição para impor limites ao ativismo judicial.
PEC 08/2021 limita decisões e fixa prazo para pedidos de vista
A PEC 08/2021 foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado na última quarta-feira (4) e está pronta para ser discutida pelo Plenário do Senado Federal.
O texto veda a concessão de decisão monocrática - quando um único ministro do STF decide sobre alguma ação - que suspenda a eficácia de lei ou ato normativo com efeito geral; ou que suspenda ato dos presidentes da República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, ou do Congresso Nacional.
No caso de pedido feito ao Judiciário durante os períodos de recesso da Corte, e que implique a suspensão de eficácia de lei ou ato normativo, será possível conceder decisão monocrática em casos de grave urgência ou risco de dano irreparável, mas o tribunal deverá julgar esse caso em até 30 dias após a retomada dos trabalhos, sob pena de perda da eficácia da decisão.
Processos que peçam a suspensão da tramitação de proposições legislativas ou que possam afetar políticas públicas ou criar despesas para qualquer Poder também serão submetidos a essas mesmas regras.
A PEC, de autoria do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), estabelece ainda que os pedidos de vista - quando um ministro pede mais tempo para analisar um determinado processo e este fica suspenso durante esse período - só poderão ser concedidos coletivamente, e por prazo máximo de seis meses.
Segundo Oriovisto, a proposta é fundamental para evitar que o Supremo legisle no lugar do Congresso Nacional. O senador diz que há um grande número de decisões tomadas por um único ministro e que acabam antecipando decisões e gerando insegurança jurídica, por isso elas devem ser limitadas.
“São enormes os riscos à separação de Poderes e ao Estado de Direito provocados pelo ativismo irrefletido, pela postura errática, desconhecedora de limites e, sobretudo, pela atuação atentatória ao princípio da colegialidade verificado no Supremo Tribunal Federal”, afirma o senador.
Senadores querem estabelecer tempo de mandato no STF
Em análise na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, a PEC 16/2019 propõe a fixação do prazo de 08 anos para o mandato de ministro do Supremo Tribunal Federal. Caso aprovada, a medida valerá para os próximos magistrados que forem indicados ao STF, ou seja, não abrange os atuais ministros.
Hoje, os ministros têm cargo vitalício, até a aposentadoria compulsória, aos 75 anos. O autor da proposta, senador Plínio Valério (PSDB-AM), se envolveu em uma polêmica recente com o ministro do STF Gilmar Mendes, que criticou a proposta de fixação de mandato.
De acordo com Valério, a intenção ao apresentar a PEC foi “promover uma visão equilibrada e democrática do funcionamento do STF”. “Com mandato, certamente se sentirão como seres humanos normais, juízes que exercerão uma função na Suprema Corte e que estão sujeitos a avaliações e aperfeiçoamentos periódicos”, diz.
O senador amazonense negou que a PEC seja um “revanchismo” contra o STF e reforçou que a proposta foi apresentada em 2019. "Acredito firmemente que a implementação de mandatos para ministros do Supremo contribuirá para revitalizar o STF e aperfeiçoar nossa democracia”, disse.
Outra medida apresentada na semana passada no Senado também busca a fixação de mandatos para os ministros do STF. O senador Flávio Arns (PSB-PR) protocolou a PEC 51/2023, e sugere mandato de 15 anos para os ministros, além de elevar de 35 para 50 anos a idade mínima para que uma pessoa possa assumir a vaga no Supremo.
"Não faz sentido que o processo de escolha dos membros do STF e o tempo de permanência nos cargos continuem presos a um modelo do fim do século XIX”, disse o senador paranaense. A proposta será encaminhada para análise da Comissão de Constituição e Justiça.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), falou sobre as propostas e negou que exista uma "crise" entre os poderes. Em entrevista na semana passada, ele sustentou que o debate sobre mandatos fixos de ministros do STF não é uma “irracionalidade” e é adotado em outros países, além de ser uma tese defendida por diversos setores dentro do próprio Poder Judiciário.
Na Câmara, PEC permite derrubar decisões do STF
Assim como os senadores estão insatisfeitos com as discussões no Supremo em matérias de competência do Legislativo, deputados também mandaram um recado ao STF ao protocolar a Proposta de Emenda Constitucional 50/2023, do deputado Domingos Sávio (PL-MG).
A PEC teve apoio de parlamentares de diversos partidos e permite que os deputados apresentem projeto de decreto legislativo para modificar decisões do Supremo Tribunal Federal.
"Isso já existe na relação entre o Legislativo e o Executivo, já existe na relação do Judiciário sobre o Legislativo - se um deputado comete um crime, ele pode e deve ser preso, se o Congresso aprova um projeto de lei inconstitucional, o Supremo tem o poder de revogar. E se o Supremo, através de alguns de seus ministros, toma uma decisão inconstitucional, fazer o quê? Não ficou remédio na Constituição para isso", disse Sávio sobre a PEC.
O deputado afirma que a proposta não tira prerrogativas e não afronta o STF. Segundo ele, quando a decisão da Corte extrapolar os limites constitucionais, o Congresso poderá - por maioria constitucional e qualificada, de 3/5 em dois turnos de votação na Câmara e no Senado - revogar essa decisão do STF. A proposta terá que ser analisada pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados.