A equipe econômica ficou, por enquanto, em segundo plano na elaboração do Pró-Brasil, o programa do governo Bolsonaro para recuperar o país após acabar a pandemia do coronavírus. O projeto, que chegou a ser apelidado internamente de “plano Marshall”, está sendo liderado pelos ministros Braga Netto (Casa Civil), Tarcísio Gomes de Freitas (Infraestrutura) e Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional), e não pelo ministro Paulo Guedes (Economia).
Um dos seus dois pilares é o aumento do investimento em obras públicas, enquanto a pasta da Economia defende a redução do Estado, o ajuste fiscal e a retomada puxada pelo investimento privado.
A apresentação das linhas gerais do programa Pró-Brasil foi feita pelos ministros Braga Netto e Tarcísio em coletiva à imprensa na quarta-feira (22). Nenhum membro da equipe econômica participou do anúncio, nem da elaboração da apresentação, em formato Power Point, contendo os pilares do programa.
No momento da coletiva, Guedes e alguns seus secretários participavam de uma videoconferência com a agência de classificação de risco Fitch Ratings.
Um interlocutor do ministro Paulo Guedes afirmou à Gazeta do Povo que a equipe econômica está focada, no momento, na elaboração e implementação das medidas emergenciais. Ainda segundo esse interlocutor, Guedes e sua equipe participarão das discussões do programa Pró-Brasil. A primeira reunião oficial do grupo que estruturará o programa acontecerá nesta sexta-feira (24) e deve contar com a presença do ministro.
Equipe econômica alerta: não há espaço fiscal para aumento de gasto
Antes deste encontro oficial, outras reuniões já aconteceram no Planalto. E o Ministério da Economia tem destoado da ideia inicial do projeto. Até mesmo publicamente, membros da equipe econômica não escondem o descontentamento com parte do programa, pois afirmam não haver espaço fiscal para despejar dinheiro público em obras.
“O governo não tem força para puxar investimento via recurso público, falta espaço fiscal”, afirmou nesta quinta-feira (23) o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, em videoconferência Organizada pelo Lide Ceará.
Segundo Mansueto, houve um “ruído de comunicação” no anúncio do programa Pró-Brasil. “Todo o governo sabe que para retomar o crescimento, a gente vai precisar de investimento privado. Não há briga política alguma dentro do governo, não há nenhuma diferença de opinião, de visão, do que precisa ser feito nos demais ministérios do governo.”
O secretário especial de Desestatização e Desinvestimentos, Salim Mattar, também deu depoimento similar na quarta-feira (22), uma hora antes do anúncio do programa Pró-Brasil. “O que estão chamando de Plano Marshall é uma ideia embrionária que é diferente dos planos do Ministério da Economia. O Plano Marshall dependeu de dinheiro dos Estados Unidos, mas aqui o governo não tem mais dinheiro.”
Economia defende retomada via setor privado
O secretário de Política Econômica, Adolfo Sachsida, afirmou que gastar mais após o fim da crise do coronavírus será um erro. “A experiência do governo Dilma Rousseff nos mostrou uma importante lição. Apostar que o estado deve liderar a recuperação econômica é insistir no erro que nos jogou na crise sem precedentes de 2015 e 2016.”
Ele também usou sua conta oficial no Twitter para dizer que o governo não vai cometer erros antigos. “Esse é um governo pró-mercado, o teto dos gastos é nosso pilar macro-fiscal e sua permanência está assegurada. Tão logo a pandemia passe a agenda de reformas retorna”, escreveu.
Mansueto, na videoconferência, também defendeu que o melhor caminho é dar continuidade ao ajuste fiscal, acelerar a agenda de privatização e assim ter credibilidade para atrair o investimento privado. “Precisamos aprovar as reformas e a agenda de privatizações para dar aos investidores privados a segurança para investirem no Brasil.”
O número dois do ministério da Economia, o secretário Marcelo Guaranys, disse que o foco da pasta voltará a ser a agenda de reformas assim que a pandemia do novo coronavírus acabar. “Elas [as reformas estruturantes] não foram largadas ou esquecidas. Vamos ter de retornar [às reformas estruturantes] para recuperar a economia”, afirmou em coletiva na última sexta-feira (17).
Entre as reformas defendidas, estão a administrativa, tributária e a do pacto federativo. A equipe econômica também que acelerar a redução do estado, através das privatizações e concessões, e aumentar o acesso à credito. Tudo isso sem abrir mão de respeitar as regras fiscais vigentes, em especial o teto de gastos (mecanismo que limita o crescimento das despesas à inflação), considerado o pilar macro-fiscal da economia.
Militares pensam diferente e elaboram lista de obras para serem retomadas
Já a ala militar do governo – ao qual Braga Netto, general, e Tarcísio, capitão, fazem parte – pensam diferente. O jornal Folha de São Paulo apurou que os militares acreditam que a agenda de ajuste fiscal e de retomada via setor privado defendida por Guedes e sua equipe não é capaz de gerar empregos no curto prazo.
O objetivo dos militares com o plano Pró-Brasil é gerar um milhão de novos empregos até 2022 com a realização de obras públicas no valor de R$ 30 bilhões a R$ 50 bilhões e com os compromissos de R$ 250 bilhões em investimentos vindos fruto das concessões de infraestrutura.
Braga Netto já solicitou aos ministérios da Infraestrutura, Desenvolvimento Regional, Cidadania e Minas e Energia quais obras e programas podem ser desenvolvidos ou retomados pelo governo. Listas preliminares já foram elaboradas pela Infraestrutura e Desenvolvimento Regional.
O material preliminar do ministério da Infraestrutura, a qual a Gazeta do Povo teve acesso, aponta que seriam 65 obras rodoviárias, 42 projetos aquaviários, 35 aeroviários e 7 ferroviários. O investimento necessário para tocar esses empreendimentos seria dec R$ 30 bilhões, sendo necessária uma suplementação orçamentária de R$ 13,688 bilhões.
Pelo cronograma de Braga Netto, a lista com o detalhamento dos projetos que serão tocados pelo governo deve ser definida até setembro. A partir de outubro, a ideia do ministro é dar início ao programa.
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