O senador José Maranhão (MDB-PB) anunciou que apresentará uma proposta de emenda à Constituição (PEC) para modificar a data das eleições municipais de 2020. A sugestão do parlamentar é que o pleito passe de outubro para dezembro. A justificativa é a pandemia de coronavírus e a impossibilidade de se cumprir etapas regulares do processo eleitoral, como as convenções partidárias e a campanha nas ruas.
A proposta de Maranhão se soma a outras já protocoladas no Congresso e a algumas discutidas ainda de modo informal no meio político. Algumas proposições, como a de Maranhão, visam modificar o calendário eleitoral em apenas algumas semanas; outras, como uma PEC de autoria do deputado Aécio Neves (PSDB-MG), sugerem transferir para 2022 a disputa municipal deste ano, fazendo com que o pleito coincida com a eleição para presidente, governadores, senadores e deputados.
O fato é que qualquer decisão sobre adiar as eleições de 2020 depende de uma mudança na Constituição Federal, a lei máxima do país. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem rejeitado esse debate. Ele e outras lideranças políticas alegam que a prioridade do país é o combate ao coronavírus. O argumento, porém, tem perdido força — cada vez mais integrantes dos meios jurídico e político indicam que a discussão sobre a data das eleições se torna inevitável.
Eleito presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no dia 16 de abril, o ministro Luis Roberto Barroso disse, em live realizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), no Dia do Trabalho (1º de maio), não descartar o adiamento das eleições 2020. “É uma possibilidade que trabalhamos. Nossa maior preocupação é com a saúde", disse. O TSE criou um grupo de trabalho para debater os efeitos da pandemia no calendário eleitoral. Barroso estabeleceu o mês de junho como data-limite para tomar uma decisão.
A aprovação de uma PEC para modificar a data das eleições dependeria de um grande entendimento político: qualquer emenda à Constituição precisa do apoio de três quintos de Câmara e Senado, com duas votações em ambas as casas. Mas, no caso da disputa eleitoral, a parte política tenderia a ser o menor dos obstáculos, segundo juristas entrevistados pela Gazeta do Povo. Na avaliação deles, modificações tendem a ser contestadas no Judiciário, ainda que aprovadas em ambiente consensual no Congresso.
Obstáculos da lei para adiar eleições 2020 são maiores que barreiras políticas
A data das eleições municipais está especificada na Constituição, no artigo 29, que cita a seleção de prefeito e vice "realizada no primeiro domingo de outubro do ano anterior ao término do mandato dos que devam suceder". A Constituição também especifica que o mandato dos prefeitos, vices e vereadores é de quatro anos.
Este quadro, segundo o advogado Fernando Parente, especializado em Direito Eleitoral, determina que mudanças tanto de data quanto de mandato precisariam ser efetivadas por meio de uma PEC. "Não pode ser uma resolução, uma lei federal, uma lei complementar. Tem que ser uma emenda à Constituição, aquela que é votada por três quintos dos senadores e três quintos dos deputados, em um processo que costuma ser burocrático e demorado", declarou.
E mesmo que haja a aprovação de uma PEC por parte dos congressistas, a proposta poderia ser contestada em etapa posterior, como explica o professor de Direito Fabrício Medeiros, do Centro Universitário Uniceub. "Uma emenda à constituição não está imune ao controle de constitucionalidade", avaliou. Outro empecilho, segundo os juristas, é a regra da anualidade, que estabelece que as regras de uma eleição precisam estar aprovadas no mínimo um ano antes do pleito.
Parente ressalta, entretanto, que a imprevisibilidade do cenário atual indica que uma eventual transferência de datas, para outro dia ainda de 2020, poderia ser efetuada. "Seria até viável fazer uma construção para isso. Porque seria uma medida que não causaria prejuízo nem benefício para ninguém", disse. Medeiros mencionou a possibilidade de uma modificação para 2020 ser aprovada por meio de uma emenda constitucional que especificaria sua validade para a disputa deste ano, não sendo aplicável para outros pleitos.
Prorrogação de mandatos de prefeitos e vereadores causa ainda mais polêmica
Se a modificação das eleições de 2020 para outro dia não figura como possibilidade tão complexa, a prorrogação dos mandatos, o que seria uma consequência da passagem da disputa para o ano seguinte, é vista pelos advogados como uma circunstância inviável. Os mandatos de prefeitos e vices eleitos em 2016 se encerram em 1º de janeiro de 2021.
"Quem votou em 2016 votou para que o eleito cumprisse um mandato de quatro anos. Não de seis, e nem de qualquer outra possibilidade. Se o mandato fosse prorrogado, como ficaria? Os que viessem a partir dali teriam seu mandato reduzido, para uma adequação", questionou Parente.
Medeiros reforçou que a ideia vale para qualquer tipo de adiamento — seja por dois anos, como está na proposta de Aécio Neves, seja por um único dia. "É a mesma coisa. Nesses casos, o princípio republicano seria afetado. E de maneira direta, de maneira frontal. Porque uma das características do nosso sistema republicano é a temporariedade dos mandatos", disse.
O professor mencionou, entretanto, que "o Direito não pode ignorar os fatos". "Em situações como a atual, excepcionais, é preciso pensar em outras saídas", destacou. Segundo ele, se realmente algo com esse perfil for necessário, será imprescindível a atuação do TSE.
"Isso [mudança na data da eleição e prorrogação de mandatos] não pode partir do Congresso Nacional, não pode partir do presidente da República. Tem que ser do TSE, que é o órgão que tem quadros técnicos e know how para fazer eleições no Brasil. Se o TSE diz que não há condições de se fazer eleição, então teríamos que levar isso em conta", opinou Medeiros.
Barroso é contra aglutinar eleições municipais com nacionais
Na transmissão ao vivo da AMB, o novo presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, afirmou que se o país não tiver condições de realizar as eleições no primeiro domingo de outubro em segurança absoluta, "acho que nós corremos o risco de termos que adiar as eleições". Ele sugere que, se isso ocorrer, que o pleito seja realizado no máximo até dezembro deste ano.
Mas, segundo Barroso, a decisão deve ser pautada por parâmetros sanitários e não políticos, apesar de demandar aprovação do Congresso Nacional. "Por minha vontade, nada seria modificado porque as eleições são um rito vital para a democracia, porém, há um risco real", avaliou.
O ministro disse ser "totalmente contra" o aglutinamento das eleições municipais às eleições gerais de 2022. De acordo com Barroso, a Justiça Eleitoral teria dificuldade de avaliar todos os pedidos de impugnação de candidaturas durante a campanha, o que poderia levar a cassações e anulações dos pleitos tardiamente. De acordo com ele, as eleições de 2020 devem contar com pelo menos 750 mil candidatos para cargos como prefeitos e vereadores.
Além disso, os eleitores também seriam prejudicados pela maior complexidade do pleito, que teria a escolha de sete candidatos diferentes. "É muita informação ao mesmo tempo e com a quantidade de partidos e candidatos que temos, você compromete a qualidade do voto e a capacidade do eleitor de fazer uma escolha consciente", destaca.
Outro risco ressaltado por Barroso seria a mistura das pautas das esferas de poder, no que ele chamou de "municipalização da eleição nacional" e "nacionalização da eleição municipal".
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