Classificada pela ministra do Planejamento, Simone Tebet, de "bala de prata do governo" para reaquecer a economia, a reforma tributária segue a passos lentos na comissão especial da Câmara dos Deputados. Para não perder o protagonismo na elaboração do projeto que ainda será votado pelos deputados, senadores buscam se antecipar às discussões e influenciar no seu desenho final.
Para tornar a reforma tributária tema de debates no Senado ainda neste mês, o senador Marcelo Castro (MDB-PI) pediu ao presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que abrisse espaços na agenda voltados ao tema nas sessões não-deliberativas das quintas-feiras. “Precisamos sentir o pulso da sociedade sobre essa medida urgente e nos preparar para encará-la”, disse.
Castro considera a reforma prioridade evidente para o governo federal e o Congresso em 2023, sugerindo, portanto, que não se adie a discussão dela entre os senadores. “Temos um sistema tributário anacrônico, atrasado, complexo e que permite em grande parte a sonegação”, lembra. Para ele, o principal problema é uma arrecadação de impostos concentrada nos mais pobres.
Igual apelo tem feito o senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR). Na reunião da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) de terça-feira (9), ele reclamou do papel secundário do Senado em comparação à Câmara, particularmente quando se trata de projetos estruturantes. “Tenho uma proposta de emenda constitucional (PEC 46/2022) que pode ser uma alternativa à reforma tributária”, frisou. Ele defende que o tema poderia começar a ser discutido pela CAE, em preparação para tratar da proposta do governo.
Apesar de defenderem a urgência da reforma, setores brigam para evitar perdas
Durante reunião com diretores do Movimento Brasil Competitivo (MBC), o senador Confúcio Moura (MDB-RO) destacou a importância da reforma para o desenvolvimento brasileiro. “A estrutura tributária do Brasil é burocrática e pouco competitiva, o que prejudica o país em relação a outros lugares onde a tributação é bem mais justa e humanizada”, afirmou.
Reportagem da Gazeta do Povo revelou que desde março um grupo informal com dez senadores vem tendo reuniões periódicas entre si e com grupos setoriais para se preparar tecnicamente e juntar subsídios para a reforma. O comércio varejista e o agronegócio vêm atuando junto a esses parlamentares para impedir que se confirme a expectativa de elevação da carga tributária sobre esses setores.
Rodrigo Pacheco, por sua vez, tem renovado o compromisso de aprovar a reforma tributária no primeiro semestre, considerando o consenso em torno da urgência da medida, além de ser “vontade da sociedade brasileira”. Ele ressalta que, enquanto "já se sabia o que precisava ser feito" em relação às reformas da previdência e trabalhista, há grande desafio quanto à tributária em razão das divisões que suscita.
“O Estado brasileiro não quer arrecadar menos e o contribuinte não aceita pagar mais tributo. Há divergências nos setores público e privado e teremos de fazer escolhas dentro do espírito de que todos têm de ceder um pouco”, disse o presidente do Senado em evento na Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), em 8 de maio.
Dificuldades da base governista criam obstáculos à aprovação do projeto ainda neste semestre
Analistas ouvidos pela Gazeta do Povo avaliam que o Planalto ainda não está pronto para levar adiante o debate da reforma tributária, mesmo reconhecendo a importância estratégica dela para a economia e para a governabilidade.
Para Públio Madruga, diretor da EGA Distrito, a comissão da reforma na Câmara só terá relevância quando as questões sobre a base governista no Congresso estiverem resolvidas. Caso contrário, suas discussões serão nulas e não terão chance de evoluir. “O governo vai ter que começar a negociar melhor e escolher quais brigas quer se meter dentro da mudança do sistema tributário. O marco fiscal, em tese, seria o assunto principal agora, mas está em segundo plano graças a discussões desnecessárias”, explica.
Juan Carlos Gonçalves, coordenador do Ranking dos Políticos, faz análise semelhante e salienta que o Planalto está passando por “aperto grande” para formar a sua base dentro do Congresso. “O relator do marco fiscal, deputado Claudio Cajado (PP-AL), terá, por exemplo, de fazer mudanças importantes no texto e o governo vai ter que aguentar tudo quieto”, disse. Enquanto a nova regra de controle de gastos não avança, resta aos líderes do governo seguir segurando “uma reforma sem consenso nem voto”.
O professor de Relações Governamentais do Ibmec-DF, Arthur Wittenberg, acredita que a reforma tributária, prioritária para a indústria, seja aprovada no rastro da aprovação do marco fiscal. A expectativa dele leva em conta os efeitos imediatos dessa regra para a economia como um todo, o que é de especial interesse do governo, além de dar estimativa precisa do impacto da reforma tributária, reduzindo dúvidas sobre a matéria.
Wittenberg não tem certeza, contudo, sobre qual será o grau de apoio que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) dará à reforma tributária. “É importante salientar que o debate em torno da mudança é bem mais complexo do que o marco fiscal, pois abarca variados e conflitantes interesses setoriais e governamentais”, disse.
Por fim, ele lembra que há a avaliação de que, caso a reforma não seja aprovada no primeiro semestre ou logo no começo do segundo, ela possa ficar inviabilizada, considerando que 2024 é ano de eleições municipais.
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