A reunião da CPI da Covid do Senado desta quinta-feira (23) por pouco não registrou uma briga física entre os senadores Jorginho Mello (PL-SC) e Renan Calheiros (MDB-AL). Os parlamentares trocaram ofensas após Calheiros criticar a postura do presidente Jair Bolsonaro para a compra de vacinas e Mello reagir às acusações.
O confronto se deu em meio ao depoimento de Danilo Trento, diretor da Precisa Medicamentos. A comissão ouve Trento por conta de sua possível atuação na negociação entre a Precisa e o Ministério da Saúde, feita para a compra de vacinas contra a Covid-19. A Precisa foi a intermediária do contrato de fornecimento dos imunizantes Covaxin, produzidos pela empresa indiana Bharat Biotech. O processo é marcado por acusações de corrupção e o contrato foi suspenso.
Trento tem recorrido ao direito ao silêncio como resposta a grande parte das perguntas feitas a ele. O direito foi concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A postura despertou críticas de parlamentares - e foi ironizada pelo presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), que chegou a questionar Trento se ele havia participado da morte do ex-presidente Getúlio Vargas, em 1954.
Quando respondeu às questões, Trento disse que não tem proximidade com o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), e disse também que o deputado não se aproximou da Precisa. O tema foi levantado por Calheiros por conta de uma emenda apresentada por Barros a um projeto de lei que visava acelerar a compra de vacinas importadas pelo poder público brasileiro. O texto original determinava que o Brasil poderia dispensar a análise final de uma vacina se o imunizante já tivesse sido aprovado por autoridades sanitárias da União Europeia ou de algum dos seguintes países: Estados Unidos, Japão, China e Reino Unido. O texto de Barros incluiu a Índia entre estes países. A medida despertou suspeitas da CPI.
Trento foi também perguntado se conhecia a família do presidente Bolsonaro e, à questão, deu uma resposta negativa. Antes de responder, porém, disse que exerceria o direito de ficar calado. A postura intrigou os parlamentares, já que o direito ao silêncio a ele concedido é vinculado a questões que poderiam incriminá-lo. Situação semelhante ocorreu quando ele foi questionado sobre o endereço de sua empresa, a Primarcial Holding e Participações. Trento inicialmente disse que não responderia, a recusa despertou reações dos senadores, e posteriormente o empresário passou o endereço - que é o mesmo das empresas de Francisco Maximiano, o proprietário da Precisa.
"Arquitetura da corrupção"
Renan Calheiros questionou Trento sobre sua proximidade com duas personalidades que são citadas no caso Precisa-Covaxin e que já foram questionadas pela CPI: o lobista Marconny Faria e o servidor Roberto Dias, ex-diretor de logística do Ministério da Saúde. Trento disse que Faria nunca prestou serviços para a Precisa e afirmou que teve apenas encontros institucionais com Dias, ocorridos dentro do Ministério da Saúde.
Trento falou à comissão que sua reunião com Dias se deu após ele fazer uma solicitação formal por meio de um e-mail enviado ao Ministério da Saúde, em que pedia um encontro para apresentar os serviços da Precisa.
Os senadores, porém, recordaram que Trento foi citado por Faria como o autor da mensagem que descreveria o que foi chamado de "arquitetura da propina" - um conjunto de instruções enviadas a Faria com um passo a passo para inviabilizar uma licitação no Ministério da Saúde. O objetivo final do processo era, após a derrubada da licitação, favorecer a empresa escolhida pelo grupo em um novo certame.
Trento confirmou ter amizade com o empresário Marcos Tolentino, que também foi ouvido pela CPI e é apontado como "sócio oculto" do FIB Bank, a empresa que atuou como garantidora do contrato entre a Precisa e o governo federal. Mas ele optou pelo silêncio quando questionado sobre detalhes acerca do vínculo entre a Precisa e o FIB Bank.
Hang e advogada de médicos na semana que vem
Antes de iniciar o depoimento de Trento, a CPI definiu dois de seus depoimentos para a próxima semana. A advogada Bruna Morato será ouvida na terça-feira (28) e o empresário Luciano Hang será o depoente da quarta-feira (29).
Morato é a defensora de dois médicos que trabalharam para a Prevent Senior e, após deixarem a empresa, a denunciarem por questões ligadas ao tratamento de pacientes com Covid-19. Segundo os médicos, a empresa manipulou dados e ministrou medicamentos a pacientes sem seu conhecimento. Um dossiê elaborado por Morato e pelos médicos embasou a convocação que a CPI fez de Pedro Batista, diretor da Prevent Senior, que falou à comissão na quarta-feira (22).
A presença de Hang, embora tenha sido aprovada pela CPI ainda em 30 de junho, tem também conexão com o caso Prevent Senior. A mãe do empresário, Regina, morreu quando estava sob os cuidados da Prevent. Senadores que fazem oposição ao presidente Jair Bolsonaro acusam Hang e a Prevent Senior de manipular a causa da morte de Regina e o tratamento que foi ministrado a ela. O empresário é alinhado ao governo e defensor do tratamento precoce, também elogiado por Bolsonaro.
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