A surpreendente decisão do ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), que anulou todas as decisões praticadas nas ações penais da operação contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), é mais um capítulo da batalha judicial iniciada ainda em 2016. Naquele ano, após a condução coercitiva de Lula autorizada pelo ex-juiz Sergio Moro, os advogados do ex-presidente alegaram em recurso pela primeira vez a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba para julgar ações que envolvessem a Petrobras.
De lá para cá foram vários recursos semelhantes e todos, sem exceção, foram recusados no STF e em outras instâncias judiciais. Até que o último deles foi impetrado, em novembro de 2020, segundo a defesa de Lula. Foi com base nesse último pedido de habeas corpus que o ministro Fachin se manifestou favoravelmente à tese dos advogados do ex-presidente nesta segunda-feira (8).
A defesa de Lula argumentou que havia jurisprudência no Supremo sobre os limites da competência da 13ª Vara de Curitiba. Fachin entendeu então que os delitos imputados ao ex-presidente não correspondem a atos que envolveram diretamente a Petrobras e, por isso, a Justiça Federal de Curitiba não deveria ser a responsável pelo caso.
"Embora a questão da competência já tenha sido suscitada indiretamente, é a primeira vez que o argumento reúne condições processuais de ser examinado, diante do aprofundamento e aperfeiçoamento da matéria pelo Supremo Tribunal Federal", diz nota divulgada pelo gabinete do ministro.
O principal argumento citado por Fachin é o inquérito 4.130, julgado em 2015. Neste caso, o plenário do STF decidiu manter no Supremo apenas a investigação contra a então senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), investigada pelo suposto recebimento de quantias da empresa Consist via Ministério do Planejamento, na época comandado pelo ex-marido Paulo Bernardo.
A Corte então desmembrou o procedimento, remetendo à Seção Judiciária Federal de São Paulo a investigação contra um segundo investigado que não tinha prerrogativa de foro. Em questão de ordem, ficou decidido que como as empresas envolvidas no suposto esquema se situavam em São Paulo, era daquele foro a competência. Foi fixado, ali, que apenas processos que se referiam especificamente a atos contra a Petrobras é que deveriam ficar em Curitiba.
"Como se vê, diante da pluralidade de fatos ilícitos revelados no decorrer das investigações levadas a efeito na “Operação Lava Jato”, a competência da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba foi sendo cunhada à medida em que novas circunstâncias fáticas foram trazidas ao conhecimento do Supremo Tribunal Federal que, em precedentes firmados pelo Tribunal Pleno ou pela Segunda Turma, sem embargo dos posicionamentos divergentes, culminou em afirmá-la apenas em relação aos crimes praticados direta e exclusivamente em detrimento da Petrobras S/A”, afirma Fachin.
O ministro explica que, de acordo com a força-tarefa da Lava Jato, a celebração fraudulenta de contratos entre a Petrobras S/A e o Grupo OAS contou com a participação do ex-presidente Lula. De acordo com as investigações, Lula teria sido beneficiado com bens e valores, como o triplex do Guarujá, submetidos a processo de ocultação ou distanciamento de suas origens ilícitas.
Assim, conclui que “o Ministério Público Federal, à época em que aforou a denúncia em desfavor do paciente, já tinha ciência da extensão alcançada pelas condutas que lhe foram atribuídas, as quais abarcaram não só a Petrobras S/A, mas outros órgãos públicos, sociedades de economia mista e empresas públicas no âmbito das quais, com semelhante modus operandi, foram celebradas contratações revestidas de ilicitudes, em benefício espúrio de agentes públicos, agremiações partidárias e empreiteiras”.
Casos vão para a Justiça Federal do DF
Segundo nota divulgada pelo gabinete do ministro Edson Fachin, os processos que envolvem o ex-presidente Lula agora serão analisados pela Justiça Federal do Distrito Federal. Neste caso, caberá a ela dizer se os atos realizados nos três processos podem ou não ser validados e reaproveitados.
"Com a decisão, foram declaradas nulas todas as decisões proferidas pela 13ª Vara Federal de Curitiba e determinada a remessa dos respectivos autos para à Seção Judiciária do Distrito Federal", diz a nota do gabinete do ministro.
Ou seja, a anulação dos processos por parte de Fachin aponta apenas que a forma como as decisões ocorreram foi considerada irregular e inválida. Por isso, as condenações e as penas impostas pelo então juiz Sergio Moro não existem mais para Lula.
Decisão de Fachin pode ser revista pelo STF
Por ter sido uma decisão monocrática por parte do ministro Edson Fachin, a nulidade dos processos poderá ser revista pelos demais membros do STF. No entanto, isso só ocorrerá se o Ministério Público Federal recorrer da decisão — a Procuradoria-Geral da República informou que já prepara um recurso. A Corte ainda deverá decidir se o caso será julgado no plenário ou na Segunda Turma, o colegiado que analisa os processos da Lava Jato.
Leia a decisão de Fachin na íntegra
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