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Judiciário

Escolinha do professor Gilmar Mendes: como é uma aula na faculdade do ministro do STF

Gilmar Mendes, um dos integrantes da 2ª turma do STF.
Gilmar Mendes, um dos integrantes da 2ª turma do STF. Além dele, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia votaram pela nulidade da condenação de Bendine. Edson Fachin foi contra. (Foto: Valter Campanato / Agência Brasil)

Se no Supremo Tribunal Federal (STF) ele provoca reações viscerais - um colega já sugeriu um "duelo" de arma de fogo, outro o definiu como "a mistura do mal com o atraso e pitadas de psicopatia" -, na sala de aula Gilmar Mendes tem fama de professor afável, que já deu aula para ministro de Estado, deputado e até um condenado no mensalão. A última ameaça ao magistrado veio do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, que afirmou ter planejado assassinar o ministro a tiros dentro do STF.

No tribunal, Gilmar dá votos contundentes, eleva o tom da voz, ataca procuradores da "República de Curitiba", se irrita com "gângster no comando" de investigações da Receita, chama o ex-juiz e hoje ministro da Justiça, Sergio Moro, de "coaching da acusação" e, volta e meia, se mete em discussão com algum colega de plenário. Esse é um lado de Gilmar. Ele, porém, tem o "lado B", quando tira a toga e vira professor.

Ao entrar na sala de aula do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), do qual é sócio, Gilmar fala manso, pausado. Na "escolinha do professor Gilmar" não há votos, polêmicas ou divergências, muito menos embates como aqueles protagonizados com o ministro Luís Roberto Barroso em sessões transmitidas ao vivo pela TV Justiça.

"Bom dia", diz Gilmar, ao iniciar a aula, acompanhada pela reportagem, da disciplina Jurisdição Constitucional, às 8h06 de uma manhã de quarta-feira. Horas depois, o Supremo retomaria a polêmica análise sobre réus delatados terem o direito à última palavra nas alegações finais, em um julgamento que abre brecha para anular condenações da Lava Jato. Na sala de aula, a pauta é mais light - "controle de constitucionalidade".

A segurança no IDP já havia sido reforçada com a instalação de catracas eletrônicas antes mesmo do relato de Janot. Gilmar considera sua rotina "muito contida" - vai a eventos, como lançamentos de livros, mas evita estádios, apesar da paixão pelo Santos, emoldurada em camisas autografadas colocadas em destaque na sala do IDP e no gabinete do Supremo.

Na noite anterior à aula, Gilmar havia determinado a paralisação das investigações envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) no caso Queiroz. Na classe, ninguém ousa indagá-lo sobre o tema controverso.

28 estudantes na aula

Os 28 estudantes acompanham a fala do professor-ministro sobre o papel da Suprema Corte em invalidar leis ou preencher o vácuo deixado pelo Executivo e pelo Legislativo. A jornada dupla faz parte da rotina de Gilmar, que deu aulas para mais de 2 mil alunos desde a criação do IDP, em 1998.

Um deles foi o ex-deputado petista João Paulo Cunha, condenado no mensalão, inclusive com o voto de Gilmar. Procurado, Cunha não comentou.

Os deputados Domingos Neto (PSD-CE) e Marcos Pereira (Republicanos-SP) e o ex-ministro Marcos Jorge também foram alunos do ministro. "Era uma classe bem eclética, mas nada de questões políticas no ambiente de sala de aula. Ele é um excelente professor, com uma profundidade de conhecimento totalmente fora da curva", afirmou Domingos. "Ele é mais tranquilo em sala de aula, que requer um pouco mais de maleabilidade, afinal é a troca de aprendizado entre professor e aluno", disse Marcos Pereira.

"O Gilmar professor traz os aspectos históricos para a gente entender a jurisdição constitucional, enquanto o Gilmar ministro tenta entender a realidade atual e aplicar o direito em cima daquilo, mesmo que as decisões às vezes sejam controversas", afirmou o aluno João Marcos Pedra.

Gilmar costuma aproveitar o contato com os estudantes para recrutar "talentos". Muitos dos seus assessores no Supremo, inclusive o atual chefe de gabinete, foram seus alunos no IDP ou na Universidade de Brasília (UnB), onde também lecionou o ministro.

Durante a aula, alguns alunos saem da sala, tomam um cafezinho para despertar, outros vão ao banheiro. Todos voltam. "O nosso sonho de consumo seria se o texto tivesse um único significado. Infelizmente, as coisas não ocorrem assim. Um mesmo texto pode ter múltiplos significados", ensina o professor Gilmar na aula, ao destacar as nuances quando se interpreta a redação de normas legais.

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