Senador Randolfe Rodrigues (sem partido) usou atentado de Trump para defender tributação maior sobre venda de armas| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo
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O atentado sofrido pelo ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump tem inflado o discurso antiarmas da esquerda brasileira. Depois que o republicano foi baleado de raspão durante um evento nos EUA no fim de semana, diversas lideranças brasileiras condenaram o ocorrido, mas também aproveitaram para criticar o acesso dos cidadãos americanos a armas e defender mais restrições no Brasil.

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Para analistas ouvidos pela Gazeta do Povo, a esquerda deve utilizar-se do discurso contra a liberação de armas de fogo para implementar novas restrições à população. "Para a direita, a expectativa é que haja um reforço do discurso sobre perseguição, tanto no Brasil quanto no exterior. E, para a esquerda, um reforço do discurso e fortalecimento da política antiarmamentista", avalia Guilherme Gomes, consultor de comércio internacional da BMJ Consultores Associados.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, foi um dos que se pronunciou sobre o atentando fazendo críticas à política dos Estados Unidos para posse e porte de armas por civis, defendida pelos republicanos e por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

"O aumento indiscriminado de armas de fogo em poder dos cidadãos comuns coloca em xeque a democracia", afirmou Lewandowski.

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O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Flávio Dino, também aproveitou o caso para defender a regulamentação adotada pela Suprema Corte sobre armas. Para Dino, a jurisprudência adotada pelo STF é "mais adequada do que consagrar um esquisito 'direito constitucional a portar armas', como entendem em alguns outros países".

Em um post no X, o ministro também publicou uma parte do texto em que a Suprema Corte defende a restrição de armas à população. "O Estatuto do Desarmamento é o diploma legislativo que consubstancia os valores constitucionais concernentes à proteção da vida humana (CF, art. 5º, caput) e à promoção da segurança pública (CF, art. 144, caput) contra o terror e a mortalidade provocada pelo uso indevido das armas de fogo (…)”, diz um trecho do documento.

Os comentários vieram depois que a imprensa americana divulgou detalhes sobre o atirador que tentou matar Trump. Identificado pelo FBI como Thomas Crooks, o jovem de 20 anos teria agido sozinho e se posicionou do telhado de um prédio com um fuzil AR-15 que tinha sido comprado legalmente pelo pai dele.

Senador usa atentado para defender mais imposto sobre armas de fogo

O senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), líder do governo no Congresso, usou o caso para defender a inclusão das armas de fogo no imposto seletivo da reforma tributária para dificultar sua venda em solo brasileiro.

"O atentado contra Trump é um atentado contra a democracia, facilitado pela venda liberada de armas nos Estados Unidos. O Senado precisa incluir armas e munição no imposto seletivo na regulamentação da reforma tributária para dificultar a venda no Brasil", afirmou Randolfe.

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A Câmara dos Deputados aprovou a regulamentação da reforma tributária sem incluir as armas no Imposto Seletivo, chamado de "imposto do pecado" – o que foi visto como uma vitória da bancada da segurança pública. A esquerda, porém, continuará fazendo esforços para aumentar os tributos sobre armas de fogo durante a tramitação do projeto no Senado nos próximos meses.

Para analista, discurso antiarmas adotado pela esquerda não faz sentido

Na análise de Andre Marsiglia, advogado constitucionalista especialista em liberdade de expressão, o discurso adotado pela esquerda aponta para uma estratégia de politização da tragédia que visa justificar a política desarmamentista do atual governo ou ainda impor mais entraves para aquisição de armas.

"Não é possível que nós pensemos que o controle e armas evitem tragédias como essa. Se a arma é utilizada de forma inadequada, você precisa fazer com que ela seja utilizada de forma adequada para a finalidade é lícita e correta, não evitar o instrumento", avalia Marsiglia.

Neste contexto, vale ressaltar ainda o caso do próprio ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que sofreu uma tentativa de assinado com uma faca, uma arma branca, e do ex-primeiro-ministro do Japão Shinzo Abe, que morreu após um ataque a tiros, mesmo o país tendo uma política extremamente restritiva a armas. O assassino do premiê, Tetsuya Yamagami, teria confeccionado a arma do crime em casa.

"É lógico que a mentira, a violência e o ódio têm que ser coibidos, mas eles não vão nunca conseguir ser erradicados. Então o que parece estar em curso é que, sempre que uma tragédia ocorre, busca se fazer ou criar um discurso de restrição de ódio, restrição de mentira ou restrição de armas, o que significa perda de direitos. É isso que não pode acontecer", opina o advogado.

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Discurso da esquerda fica enfraquecido

Além da questão armamentista, líderes da esquerda brasileira culparam a "extrema-direita" pela violência, a exemplo da presidente do Partido dos Trabalhadores, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR).

"A violência política sempre foi uma prática da extrema-direita, não apenas contra seus adversários, mas contra a democracia. Quem se associa ao nazismo e ao fascismo, à repressão e aos assassinatos da ditadura, não tem autoridade para falar sobre esse tema. É o caso do inelegível, que até hoje defende tortura e os torturadores", publicou na rede social X.

O cientista político Adriano Cerqueira avalia que tanto o recente atentado contra Donald Trump como a tentativa de assassinato de Bolsonaro em 2018, enfraquecem esse discurso adotado por Gleisi e outros nomes da esquerda para atacar a direita.

"O atentado sofrido por Trump desarticula boa parte do discurso que a esquerda gosta de apresentar, de que a direita é violenta e que gera violência na política", avalia ele, que é professor do Ibmec e da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). "A esquerda gosta de colocar que há um incitamento da violência na política por parte da direita, mas os fatos mostram que os candidatos de direita são que sofrem atentados", continuou.

Nesta segunda-feira (15), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva evitou fazer maiores comentários sobre o caso. À imprensa, voltou a condenar o ataque contra Trump e disse que "tem que condenar qualquer manifestação antidemocrática que aconteça em qualquer lugar do mundo. Seja pela direita, seja pela esquerda. Ninguém tem o direito de atirar numa pessoa por que não concorda com ela".

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O brasileiro também foi questionado se o atentado fortalecia a direita, o petista não respondeu à pergunta e afirmou apenas que o caso "empobrecia a democracia". "Ao invés de ficar analisando se alguém perde ou ganha com isso, o que nós temos que ter certeza, é que a democracia perde", disse.