Governo troca integrantes e diminui força da CPI| Foto: Myke Sena / Câmara dos Deputados
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A troca de membros que votavam com a oposição na Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (CPI do MST) sinaliza ao Executivo que o Centrão está "fazendo sua parte" na busca por mais espaço e cargos na Esplanada dos Ministérios. Além disso, a troca, que veio logo após uma sessão de depoimentos contundentes contra o movimento agrário, parece indicar que o governo teme desgastes com as revelações sobre as invasões de terra no país.

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Na última quarta-feira (9), parlamentares da oposição que eram membros titulares e suplentes da CPI do MST foram surpreendidos com a notícia de sua substituição por deputados mais alinhados ao governo. A manobra foi articulada por PP, União Brasil e Republicanos, que estão negociando cargos com o governo Lula.

A mudança diminui o poder de investigação da CPI, já que torna mais difícil a aprovação de pedidos de convocação de autoridades ou até mesmo do texto final que for produzido pelo relator, Ricardo Salles (PL-SP).

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Um dos deputados retirados da CPI foi Diego Garcia (Republicanos-PR). Ele disse que soube da notícia de que não era mais membro da CPI pela imprensa. Diante disso, o parlamentar informou à Gazeta do Povo que enviou ofício à liderança do partido para voltar a compor a comissão.

Um parlamentar do Republicanos, que conversou com a Gazeta do Povo e preferiu não se identificar, disse que não concorda com a intromissão na CPI, mesmo não sendo favorável às investigações da forma como têm sido conduzidas. Mas classifica a interferência de Lira e a substituição de membros como uma “truculência”.

Além disso, a manobra ocorre justamente no momento em que se intensifica a queda de braço entre governo e o Centrão, do qual fazem parte os mesmos partidos que substituíram integrantes da CPI que apura as invasões de terras pelo MST.

Desde o mês passado esses partidos aguardam o desenho de uma nova Esplanada dos Ministérios, onde teriam mais poder e espaço na chamada minirreforma, que já era para ter saído e até hoje não foi anunciada por Lula.

O resultado é que desde a volta do recesso parlamentar nenhum tema polêmico ou prioritário, como o arcabouço fiscal, foi analisado nessas duas semanas desde que os parlamentares voltaram do recesso.

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Lira blindou ministro de Lula para evitar desgaste

O esvaziamento da CPI teve início com a interferência do próprio presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), que anulou a convocação do ministro da Casa Civil de Lula, Rui Costa à comissão. De acordo com Lira, não havia relação entre os fatos investigados e o ministro.

Já o presidente da comissão, deputado Luciano Zucco (Republicanos-RS), lamentou a interferência, mas disse que cabe à CPI “cumprir” a decisão da presidência, assim como as trocas dos membros titulares, que vão interferir diretamente no funcionamento da comissão.

Sem maioria, Zucco anunciou que não vai prorrogar os trabalhos, como pretendia inicialmente. Mas ele garante que a comissão tem material suficiente para um relatório consistente, e que a CPI vai cumprir o planejado, ouvindo pessoas e fazendo diligências até o final.

O relator, Ricardo Salles (PL-SP), também criticou a manobra. “ [Rui Costa] utilizou o peso do governo para revogar a sua convocação”, afirmou.

Para o analista político Waldir Pucci, da Universidade de Brasília (UnB), a convocação de Rui Costa à CPI do MST acendeu o sinal de alerta no governo "para evitar problemas maiores". Já sobre a interferência de Lira, Pucci diz que “ele está disposto a fazer a sua parte desde que o governo faça a dele, ou seja, dar o espaço que o Centrão quer e principalmente não criar embaraços nessa relação Executivo-Legislativo”.

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O professor da Universidade Federal de Ouro Preto Adriano Cerqueira diz que Lira tem agido de forma independente em diversos momentos, e a ação na CPI é um recado claro tanto para a oposição quanto para o governo de que ele “está atento, e na medida do possível ajudando o governo”.

Troca de cargos e adesão ao Governo gera crise no Republicanos

A troca dos integrantes de oposição na CPI por políticos alinhados ao governo, em troca de espaço no Executivo, considerada por muitos parlamentares como um dos motivos para o esvaziamento da Comissão, repercutiu mal, garante o deputado Diego Garcia.

Ele disse que o próprio presidente do Republicanos, Marcos Pereira (SP), já declarou publicamente que o partido não fará parte da base governista.

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, é mais um que não ficou satisfeito com a possibilidade de a legenda passar a integrar a base governista, e tem dito a pessoas próximas que pode até deixar o partido se o Republicanos oficialmente passar a fazer parte do governo.

O governador inclusive conversou com o presidente da CPI por telefone, e eles cogitam uma saída negociada da legenda, segundo informou a assessoria do deputado Zucco.

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Outros nomes de peso do partido, como a senadora Damares Alves e o senador Hamilton Mourão, mais ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro, também poderiam deixar o Republicanos caso o partido aceite um ministério no governo Lula.

Marcos Pereira está fora do Brasil, em missão oficial, e na volta terá que sentar à mesa com integrantes do partido para aparar arestas e contornar a crise.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]