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Lula
Lula fez um pedido de votos explícito a Boulos durante o evento em comemoração ao 1º de Maio| Foto: Reprodução/Canal Gov.

O evento do Dia to Trabalho (1), no qual o presidente Lula (PT) pediu votos antecipadamente para o pré-candidato à prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos (PSOL), não cumpriu todos os requisitos técnicos para a liberação de verbas via Lei Rouanet. A Gazeta do Povo apurou que o Ministério da Cultura (MinC) não divulgou, no Sistema de Acesso às Leis de Incentivo à Cultura (Salic), os pareceres técnicos exigidos pela lei.

Além disso, a empresa responsável pelo evento, a Veredas Gestão Cultural LTDA, não detalhou a participação das centrais sindicais ao Ministério da Cultura. De acordo com a legislação, a Lei Rouanet deve patrocinar eventos “de natureza cultural”, não sendo permitidos eventos políticos.

Para que um projeto seja aprovado pelo Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), as propostas cadastradas precisam ter o aval de uma área técnica, neste caso, a Fundação Nacional de Artes (Funarte), e a aprovação da Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (CNIC), órgão consultivo do Ministério da Cidadania, que homologa a execução do projeto. Ambos os documentos não constam no sistema Salic, apenas a portaria da pasta homologando o projeto no Diário Oficial da União.

Chamado de "Festival Cultura e Direitos", o evento teve captação de R$ 250 mil da Lei Rouanet. De acordo com o Salic, o objetivo da empresa era captar R$ 6,3 milhões, mas só conseguiu levantar R$ 250 mil com a faculdade privada de medicina de Campinas (SP) São Leopoldo Mandic. O evento também contou com o patrocínio de R$ 3 milhões da Petrobras, também por meio da Lei Rouanet. Ou seja, a petrolífera brasileira fez a doação através de renúncia fiscal.

Assim como os documentos do Ministério da Cultura, o contrato referente à doação da Petrobras também não consta no Salic. Questionada pela reportagem, a petroleira negou que houve omissão na documentação e afirmou que a anexação dos contratos ao sistema ainda será feita.

"A revisão referente ao mês de maio, que inclui os patrocínios formalizados em abril, ainda não foi publicada. O patrocínio ao Festival Cultura e Direitos foi assinado em abril de 2024. Portanto, o projeto passará a constar no portal na atualização a ser feita nos próximos dias", disse a Petrobras em nota.

O Ministério da Cultura também foi procurado sobre a falta de documentação do Salic, mas até o fechamento da matéria não retornou. Ao jornal O Estado de S.Paulo, o ministro da Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom), Paulo Pimenta, negou que a fala de Lula esteja em desacordo com a lei eleitoral.

Descrição oficial do evento não incluiu participação de sindicatos e comício de Lula

A descrição do evento fornecida ao sistema Salic da Lei Rouanet pela organizadora Veredas também não cita a participação de partidos políticos e centrais sindicais, mas somente artistas que estariam presentes na programação. Mas na prática estavam envolvidas as entidades sindicalistas CUT, Força Sindical, UGT, CTB, NCST, CSB e Intersindical Central da Classe Trabalhadora.

Na justificativa, a Veredas disse que levaria “para os trabalhadores um grande show de samba, uma das manifestações culturais regionais mais populares do país”. Acrescentou ainda que “em alinhamento com a temática da luta pelos direitos que caracteriza as celebrações do 1º de Maio, consideramos que o festival contribuirá para o acesso da população a produtos culturais”.

A empresa inicialmente anunciou que o evento contaria com a participação de cantores renomados, como Paulinho da Viola, Diogo Nogueira, Maria Rita, Quintal do Pagodinho e Louana Prado. Contudo, as centrais sindicais, como a própria CUT, anunciaram em suas redes sociais uma programação diferente da que foi estabelecida pela Veredas no Salic.

Foram divulgadas apresentações de Paula Lima, Quesito Melodia, Afonsinho BV, Pagode dos Meninos, Trio da Lua - Na trilha do Xaxado, Taty Dantas, Dexter, Roger Deff, Bateria Show da Gaviões da Fiel, Afro-X, Arnaldo Tiffu, Almirzinho, Arlindinho, Ivo Meirelles e Doce Encontro.

De acordo com a legislação, a Lei Rouanet deve patrocinar eventos “de natureza cultural”, não sendo permitidos eventos políticos. A leitura de analistas é que houve um aproveitamento de Lula, Boulos e demais centrais sindicais em relação ao ato. Algumas evidências disso são os fatos do presidente Lula ter dado conotação oficial ao evento ao sancionar a isenção de imposto de renda para quem ganha até R$ 2.824 e depois pedido votos para Boulos de forma direta.

O deputado federal Mário Frias (PL-SP), que foi Secretário Especial de Cultura no governo Jair Bolsonaro (PL), criticou a falta de transparência pelo Ministério da Cultura e questionou como o pagamento do evento foi feito.

“Foi anunciado de forma oficial (placas de publicidade) que o projeto usou recursos da Lei Rouanet e teve como patrocinador a Petrobras, diante disso questiono: no Salic não consta contrato da Petrobras conforme anunciado no evento, como foi efetuado esse pagamento?”, disse o parlamentar.

Ele também disse que uma pergunta precisa ser respondida pelas autoridades: “Podemos dizer que com a participação de centrais sindicais, partidos políticos e a participação do Presidente da República em atividade político partidária, pedindo votos de forma antecipada para o seu candidato à prefeitura de São Paulo, houve um claro e inequívoco desvio de finalidade do evento?”

Rogério Marinho aciona TCU e PGR contra Lula

O financiamento do evento entrou na mira do Legislativo. Nesta sexta-feira (3), o senador Rogério Marinho (PL-RN), líder da oposição no Senado, pediu que o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Procuradoria-Geral da República (PGR) investiguem Lula, Pimenta e Márcio Macêdo (Secretaria Geral da República) pelo custeio do ato do Dia do Trabalho. Para o parlamentar, houve uso indevido de recurso público por parte do governo.

No pedido de investigação feito ao TCU, Marinho também cita a Petrobras e solicita uma auditoria detalhada para avaliar o uso dos recursos da estatal e da Lei Rouanet em eventos privados com fins eleitorais.

“Na qualidade de Senador da República, tenho o dever de, no exercício de meu mandato, fiscalizar as ações e atuações do Poder Executivo Federal, de maneira que a participação do Presidente Lula no evento do dia do Trabalho, na cidade de São Paulo, organizado e custeado com recursos públicos, incluindo a transmissão ao vivo via EBC, em desvio de finalidade, pode ter representado o cometimento de ilícitos contra a gestão pública, de responsabilidade, eleitoral e de improbidade administrativa”, diz um trecho do pedido.

Já no ofício enviado à PGR, ele cita a transmissão feita pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC), que é pública, como uso indevido da máquina pública federal e de recursos públicos para ato de campanha eleitoral antecipada e abuso de poder econômico.

"A situação é preocupante, já que retrata a utilização de Leis e de um evento organizado e custeado com recursos públicos, em desvio de finalidade, para realização de verdadeira propaganda eleitoral extemporânea, veiculada por canal público (EBC), com pedido expresso de voto”, disse o senador no documento.

Oposição critica Lula por pedir votos para Boulos

Assim como Marinho, a leitura de outros membros da oposição é que Lula utilizou a máquina estatal para favorecer Boulos através de propaganda eleitoral antecipada. De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), candidatos só podem pedir votos de forma direta a partir de 16 de agosto - data em que começa oficialmente a propaganda eleitoral.

O gesto do petista ocorre em um momento em que as intenções de votos para o deputado do PSOL empataram com as do atual prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB). De acordo com pesquisa divulgada pelo instituto Paraná Pesquisa, nesta quinta-feira (2), Nunes (MDB) tem 27,3% das intenções de voto, ante 25,7% de Boulos.

Foram ouvidos presencialmente 1.200 moradores da cidade de São Paulo entre os dias 26 de abril e 1º de maio. A margem de erro é de 2,9 pontos percentuais para mais ou para menos. O índice de confiança é de 95%. A pesquisa foi registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob o protocolo n.º SP-05530/2024.

O deputado federal Coronel Telhada (PP-SP) disse que a postura de Lula fere o Estado Democrático de Direito e a imparcialidade que o governo precisa ter.

"É inaceitável que um presidente em exercício utilize a máquina estatal para fazer propaganda política em favor de um pré-candidato. Isso fere os princípios democráticos e compromete a imparcialidade do Estado. Nossa democracia precisa ser preservada de qualquer tipo de interferência externa, e é dever do governo e das autoridades garantir a lisura do processo eleitoral", disse Telhada.

Já o deputado Rodrigo Valadares (União-SE) defendeu que haja uma separação entre Estado e campanha política.

"A atitude de Lula em fazer um pedido de voto durante um ato oficial é um desrespeito à democracia e à separação entre Estado e campanha política. O Estado deve ser neutro e imparcial, garantindo igualdade de condições a todos os candidatos. Qualquer tipo de uso da máquina estatal para promoção política é inaceitável e deve ser repudiado", afirmou Valadares.

Partidos políticos protocolam ações contra Lula e Boulos

Com o pedido explícito de Lula em favor de Boulos, partidos políticos ingressaram com ações contra Lula por campanha eleitoral antecipada. Algumas delas já foram analisadas pela Justiça. Ainda nesta quinta-feira, o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) concedeu liminar protocolada pelo Partido Novo e determinou que o Youtube retire o vídeo em que Lula aparece pedindo votos a favor de Boulos no prazo de 48 horas. Também intimou o próprio presidente para que fizesse a remoção do conteúdo em seu canal.

O diretório do MDB de São Paulo protocolou uma ação na Justiça Eleitoral que pede aplicação de multa contra Lula e Boulos por propaganda antecipada, de R$ 25 mil, além da exclusão de vídeos e a proibição de uso por parte da campanha.

Para o MDB, houve pedido explícito de votos pelo presidente da República fora do período eleitoral, "com a inteira concordância e anuência de Guilherme Boulos, que se engajou claramente no ilícito praticado em seu favor" e replicou o conteúdo nas suas redes sociais.

Em seu perfil no Twitter, o deputado federal Kim Kataguiri (União-SP), que também é pré-candidato à prefeitura de São Paulo, anunciou que protocolou uma ação no Ministério Público Eleitoral contra o petista e o deputado do PSOL.

O senador Ciro Nogueira (PP-TO) publicou em suas redes sociais que o diretório paulista do PP também entraria com uma ação por campanha eleitoral antecipada.

“Fizeram um comício a favor de Boulos com patrocínio de uma estatal, a Petrobras! Não é só abuso de poder econômico. É um desrespeito com a cidade de São Paulo e com o país. A cidade está assolada pela pior epidemia de dengue da história e o governo federal vai até lá para torrar dinheiro público com politicagem?”, afirmou o congressista no Twitter.

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