Os depoimentos do ex-comandante do Exército Marco Antônio Freire Gomes e do ex-comandante da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Junior, à Polícia Federal (PF) revelados na íntegra na sexta-feira (15), mostraram que a alta cúpula das Forças Armadas recusaram por pelo menos duas vezes a hipótese de ruptura institucional por meio de decretos de Operação de Garantia da Lei e da Ordem, Estado de Defesa ou Estado de Sítio, debatida por integrantes do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Com a retirada do sigilo das investigações, por parte do ministro Alexandre de Moraes, as oitivas indicam duas reuniões específicas: uma no dia 7 de dezembro de 2022 e outra no dia 14 do mesmo mês. Os ex-comandantes mencionaram outras reuniões mas não se recordaram de datas específicas. Eles deram a entender que houve outros encontros, mas não deixaram claro se eles se destinaram ou não à consideração da possibilidade de intervenção no resultado eleitoral.
A primeira reunião com data determinada nos depoimentos ocorreu no Palácio da Alvorada e contou com a participação dos três comandantes das Forças Armadas, Bolsonaro e o assessor especial da Presidência Filipe Martins.
Segundo o depoimento de Freire, Martins teria lido os fundamentos jurídicos que embasariam um pedido de Garantia de Lei e Ordem (GLO) contra o processo eleitoral. O ex-comandante do Exército acrescentou que: Bolsonaro informou que o documento estava em estudo e depois seria reportada a evolução das alterações aos comandantes.
À PF, o militar do Exército disse que ele e Baptista “afirmaram de forma contundente suas posições contrárias ao conteúdo exposto”. Eles também teriam alertado que o documento apresentado por Martins “não teria suporte jurídico". Por outro lado, o Almirante Almir Garnier Santos, então comandante da Marinha, teria se colocado à disposição do ex-presidente, mas não está claro se ele teve acesso ou não à suposta minuta..
Sobre o acesso de Bolsonaro ao texto, a versão do ex-comandante do Exército diverge da versão apresentada pela defesa do ex-presidente, que alegou que o ex-mandatário só teve acesso ao documento durante o curso das investigações.
O inquérito tornado público traz em grande parte afirmações feitas pelos policiais, nas quais os ex-comandantes respondiam apenas sim ou não, por vezes dando pequenas explicações com suas próprias palavras.
O segundo encontro teria ocorrido na sede do Ministério da Defesa com a presença dos três comandantes e o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira. Na ocasião, segundo Freire, o ministro apresentou uma “minuta mais abrangente do que a primeira”. Além de declarar Estado de Defesa, o documento também instituía a criação da “Comissão de Regularidade Eleitoral” para “apurar” a legalidade das eleições de 2022. Novamente, os comandantes teriam sido contrários ao documento.
Freire também detalha que outros encontros sobre o assunto ocorreram, sem citar datas. Em uma dessas reuniões, o ex-ministro da Justiça, Anderson Torres teria “explanado o suporte jurídico” para a Operação de Garantia da Lei e da Ordem e Estado de Defesa. Nessa ocasião, o militar do exército relata que disse a Bolsonaro não haver possibilidade de mudar o resultado das eleições e que o então chefe do Executivo poderia enfrentar consequências penais se tentasse adotar a hipótese de intervenção.
Defesa de Bolsonaro questiona depoimento de Freire
Em suas redes sociais, o advogado de defesa de Bolsonaro, Fabio Wajngarten, ironizou o depoimento prestado pelo ex-comandante do Exército. Para o advogado, o general tem "memória seletiva", pois recorda de "vírgulas, frases e palavras, mas não se recorda de datas".
Ele também criticou o fato de a defesa ainda não ter tido acesso aos depoimentos. "Tem general com memória seletiva…. Recorda-se de vírgulas e frases e palavras, mas não se recorda de datas. Bem curioso. Mais ainda as defesas não terem nenhum acesso à esse depoimento folclórico", disse o advogado de Jair Bolsonaro no X, antigo Twitter.
Revelações são decorrência da Operação Tempus Veritatis
O depoimento de Baptista Junior é decorrência da Operação Tempus Veritatis, deflagrada em 8 de fevereiro pela Polícia Federal. A ação busca investigar suposta tentativa de golpe de Estado e os atos de 8 de janeiro de 2023.
Além de Bolsonaro, aliados próximo do ex-mandatário também foram investigados, como os ex-ministros Walter Braga Netto (Casa Civil), Augusto Heleno (GSI), Anderson Torres (Justiça) e Paulo Sérgio Nogueira (Defesa), o ex-ajudante de ordens Marcelo Câmara, os ex-assessores Filipe Martins e Tercio Arnaud Thomaz, entre outros.
A cúpula militar do governo Bolsonaro também foi atingida pela operação, como o almirante Almir Garnier Santos, ex-comandante-geral da Marinha; o general Estevan Theóphilo Gaspar de Oliveira, ex-chefe do Comando de Operações Terrestres do Exército; e o coronel reformado do Exército, Ailton Barros.
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