O favoritismo do ministro da Justiça, Flávio Dino, para ocupar uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) está incomodando políticos de oposição, aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e juristas. Especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo avaliam que Dino no STF reforçaria o ativismo político da Corte.
Em outubro, a aposentadoria da ministra Rosa Weber dará a Lula a oportunidade para indicar mais um magistrado à Corte. A polêmica em relação a uma eventual indicação de Dino é também alimentada pelas recorrentes reações do próprio ministro em causa própria, nas redes sociais, e por especulações acerca do futuro da sua pasta e de outros cargos.
O principal rival de Dino na disputa pela indicação de Lula ao STF é Jorge Messias, ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), apoiado pela cúpula petista. Também é cotado para uma vaga no STF o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas, cuja candidatura é defendida por Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado, e por Davi Alcolumbre (União-AP), presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa – ambos interessados na abertura de vaga de ministro no TCU. Cabe a Lula calcular os ganhos e estragos da sua escolha.
Ao contrário de Dino, Dantas e Messias carregam rejeição bem menor dos parlamentares, inclusive das bancadas mais conservadoras. Enquanto o presidente do TCU tem bom trânsito político, o chefe da AGU é evangélico.
Por essa razão, há parlamentares da oposição que enxergam a disparada de Dino na bolsa de apostas como estratégia de Lula para tornar ainda mais fácil a confirmação de Messias nas votações no Senado, por exemplo.
Para quem duvida do jogo de cena, a escolha de Dino pelo presidente se justifica pela busca de um nome progressista, em contraponto a outros juízes da Corte, incluindo seu último indicado, Cristiano Zanin. Ex-juiz (1994-2006), ex-deputado e ex-governador, Dino é senador licenciado do Maranhão.
O perfil combativo do ministro da Justiça, sempre enaltecendo Lula e confrontando os adversários do governo, é visto como algo que o favorece na disputa. Nessa linha, Dino endossou de imediato as sugestões polêmicas do presidente para tornar as votações do STF secretas e para o Brasil rever a sua adesão ao Tribunal Penal Internacional (TPI). Por outro lado, o recente avanço de Dino na lista de favoritos se deu também em razão do apoio que recebeu dos ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, do STF.
Além da campanha dos candidatos pelo assento na Suprema Corte e das pressões dos seus apoiadores sobre Lula, ainda há a mobilização de grupos que querem a indicação de uma mulher negra. A informação de bastidores apontando o avanço de Dino na disputa, contudo, deu nova dinâmica ao processo, acirrando ânimos e alimentando questionamentos sobre o saber jurídico do ministro, as suas posições ideológicas e o tom sarcástico com que lida com parlamentares.
Seus embates na Câmara e no Senado sempre inundam as redes sociais, a exemplo de como responde a perguntas em audiências e reage à acusação feita pela oposição de ter sido omisso na segurança da Praça dos Três Poderes no dia 8 de janeiro, postura que teria viabilizado os atos de vandalismo.
Na noite da terça-feira (19), Dino rebateu Demétrio Magnoli, comentarista da GloboNews, que considerou a eventual indicação do ministro para o STF uma “avacalhação” por se tratar de alguém “essencialmente político”. Dino afirmou que mantinha “serenidade e firmeza” diante da “onda desvairada de ataques e de notícias falsas”. Ele também debochou da iniciativa do senador Jorge Seif (PL-SC) de denunciá-lo no TPI por “crime de guerra” pelas prisões no 8 de janeiro.
Oposição aposta que indicação de Dino será barrada no Senado
A oposição no Senado já avisou que vai criar obstáculos à confirmação da eventual indicação de Dino, que precisa ser votada na CCJ após sabatina no colegiado e pelo plenário da Casa. “Tenho a convicção de que Dino não passa no Senado”, disse o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) em entrevista ao jornal O Globo, afirmando que pretende “infernizar a vida” do ministro caso seja mesmo indicado por Lula.
Ele expressou preocupação com a nomeação de alguém para o STF que aparentemente usaria sua posição para perseguir políticos que não lhe agradem. O senador explicou que a questão problemática reside no fato de que Dino, se confirmado, teria à disposição recursos judiciais e a PF para direcionar investigações e acessar informações confidenciais de inquéritos sigilosos.
Para complicar, uma indisposição de Pacheco e Alcolumbre com o nome do ministro também poderá retardar o processo de análise pelos senadores, a exemplo do ocorrido com André Mendonça em 2021. Da indicação pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) até a aprovação, o ministro teve de esperar quase cinco meses.
Todavia, a promessa de Flávio Bolsonaro de bloquear a nomeação do ministro para o STF vai contra a tradição. A última vez que uma indicação para o STF foi rejeitada pelo Senado foi em 1894, durante o governo do marechal Floriano Peixoto.
Juristas alertam para os riscos da indicação de Dino para o STF
No meio jurídico, o favoritismo de Flávio Dino, ministro da Justiça, para ocupar uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) desperta temores especialmente em razão de seu perfil. O advogado e professor da PUC-SP Adilson Dallari afirmou que a possível nomeação de Dino é motivo de “séria preocupação”, “à luz das atitudes autoritárias reveladas pelo ministro ao longo da sua carreira, inclusive durante o tempo como juiz”.
Dallari afirma que a questão do desrespeito à Constituição por parte do STF tem sido uma preocupação recorrente no Brasil nos últimos anos, tendo como um dos marcos a decisão do então ministro Ricardo Lewandowski, em 2016, quando manteve os direitos políticos da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) durante o julgamento do impeachment.
No caso de Dino, o receio do jurista é se tratar de alguém que “já mostrou não ter nenhum compromisso com o texto constitucional”. Um exemplo notório disso foi o incidente em que o ministro afirmou terem sido apagadas imagens das câmeras do Palácio da Justiça nos atos de vandalismo no 8 de janeiro. “Ora, isto é um crime”.
O jurista compartilhou um episódio envolvendo o próprio como advogado e o então juiz federal Dino. Dallari questionou uma movimentação irregular de processo fora dos prazos, o que resultou em um processo movido pelo ministro contra ele. Posteriormente, a falha no comportamento de Dino foi reconhecida e regulada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
“Notório saber jurídico ele pode até ter, se considerar sua carreira no Judiciário. Mas o outro requisito legal para ser ministro do STF, o de reputação ilibada, está evidente que ele não tem”, sublinhou. Ele destaca a postura ousada de Dino, que parece não temer nada em suas falas e ações.
Dallari observou que os comportamentos autoritários do ministro Dino podem ser comparados aos do ministro Alexandre de Moraes, do STF, “com a diferença de que Moraes, ao menos, busca justificativas para os seus atos”. Ele confidenciou as dificuldades em explicar aos alunos a completa falta de limites na atuação de juízes do STF, que não dão o devido espaço para a defesa e a acusação e desrespeitam até imunidade parlamentar.
O advogado e professor Ricardo Peake Braga, autor do livro Juristocracia e o Fim Da Democracia (EDA, 2021), avalia que indicações como uma eventual de Flávio Dino não contribuem para o resgate da boa imagem do STF perante a sociedade. Isso porque o momento pede justamente uma postura menos política e mais isenta e imparcial da Corte.
“Para tanto, o ideal é que o próximo nome a ser indicado pelo presidente Lula para ministro o tribunal tenha um perfil discreto e apolítico. Certamente, o ministro da Justiça não tem essas características que considero desejáveis. Ele tem longa carreira política, como integrante do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), [atualmente no PSB,] e gosta de envolver-se em embates políticos de forma bastante combativa”, observou.
Uso político da PF por Dino fomenta resistência do Centrão
A simples menção do nome de Dino para o STF ainda causa mal-estar na Câmara, onde líderes do Centrão indicam iniciativas explícitas ou ocultas do ministro por meio da Polícia Federal (PF) como sinais de intimidação a políticos.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), alertou na segunda-feira (18) para “excessos que estão aflorando” em operações da PF, que ele já chamou de “polícia política”, lembrando que o próprio foi alvo de “um massacre” quando o assessor foi alvo de investigação sobre a compra de kits de robótica. À época, Dino foi à residência oficial do deputado e garantiu que o mandado de busca e apreensão foi expedido por juiz local e executado por delegado que “sequer sabia o nome”.
Após ter comparecido a uma dezena convites para prestar esclarecimentos na Câmara, Dino participará em 25 de outubro de audiência da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC) para falar sobre suas declarações a respeito do papel da PF no governo. A oposição questiona a suposta interferência na corporação por causa de fala do ministro na posse de André Fufuca (Esporte): “dinheiro não tenho, mas aquela polícia tenho”.
Os choques entre ele e deputados têm se acirrado ao ponto de General Girão (PL-RN) ter acusado Dino de agressão física no Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, em 14 de setembro. O ministro da Justiça nega que isso tenha ocorrido.
Divisão de ministério e briga por vagas no rastro da saída de Dino
Em paralelo, o favoritismo de Dino já deflagrou briga acirrada por seu influente cargo. Entre os cotados estão Augusto de Arruda Botelho, secretário nacional de Justiça; o advogado Marco Aurélio Carvalho, coordenador do Prerrogativas, grupo de advogados próximos a Lula; e Ricardo Cappelli, secretário-executivo do ministro. O PT intensificou a pressão para que o Ministério da Justiça seja dividido, recriando a pasta da Segurança Pública, área que colhe maus resultados no plano federal e na Bahia.
Nessa hipótese, um arranjo possível seria deslocar Jorge Messias da AGU para a Justiça e designar o número 2 de Dino, Ricardo Capelli, ministro da Segurança, dada a sua atuação como interventor na segurança do Distrito Federal. A dança de cadeiras poderia levar à nomeação de Claudia Trindade, assessora especial de Diversidade e Inclusão da AGU, para o lugar de Messias. Mulher e negra, ela tem apoio do PT e do Prerrogativas. De toda forma, aliados de Dino, filiado ao PSB, reclamam do fogo amigo do PT contra ele para reduzir sua influência e ampliar os espaços da legenda no governo federal.
Segundo informação publicada nesta quinta-feira (21) pela Folha de S. Paulo, Messias só assumiria a eventual vaga deixada por Dino no Ministério da Justiça mediante “mudança drástica na equipe”. Ele também teria criticado nos bastidores a condução “muito mediática” da pasta pelo atual titular.
Triângulo Mineiro investe na prospecção de talentos para impulsionar polo de inovação
Investimentos no Vale do Lítio estimulam economia da região mais pobre de Minas Gerais
Conheça o município paranaense que impulsiona a produção de mel no Brasil
Decisões de Toffoli sobre Odebrecht duram meses sem previsão de julgamento no STF