A reforma tributária que já está em tramitação no Congresso prevê uma mudança importante no que diz respeito às políticas de distribuição de renda. Apresentada pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP) com base nos estudos do economista Bernard Appy, do Centro de Cidadania Fiscal, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45, de 2019, prevê a devolução de parte do imposto indireto para famílias carentes.
A ideia é o único benefício tributário previsto na reforma, que veda, em outro trecho, a concessão de isenções, incentivos ou benefícios de qualquer tipo. Em entrevista à Gazeta do Povo, Appy explicou que a devolução de parte do imposto pago pelos contribuintes seria realizada pela União exclusivamente para as famílias que fazem parte do Cadastro Único, do governo federal.
O cadastro é o principal instrumento do Estado para identificar as famílias vulneráveis que precisam ser atendidas por programas sociais. Hoje, 74,4 milhões de pessoas estão cadastradas. Destas, 43,1 milhões recebem o Bolsa Família.
A PEC não estabelece, no entanto, o montante que será devolvido aos mais pobres. De acordo com o projeto que tramita na Câmara, a parcela de imposto a ser devolvida às famílias será definida por meio de uma lei complementar posterior à aprovação da reforma tributária.
Benefício tributário ineficiente
A nova política prevista na reforma tributária viria em substituição à desoneração da cesta básica, em vigor desde 2004.
Pelo regime tributário atual, produtos básicos de alimentação (como carnes, frutas, feijão e arroz, por exemplo) e de higiene (papel higiênico, pasta de dente e sabonete) são isentos de tributos federais. Pra esses casos, PIS (Programas de Integração Social); Cofins (Contribuição para Financiamento da Seguridade Social) e IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) têm alíquota zero.
Appy explicou, na conversa com a Gazeta, que a ideia do projeto é corrigir uma distorção presente na desoneração da cesta básica. “Ainda que beneficie as famílias pobres, esse tipo de política acaba, em números absolutos, beneficiando mais as famílias ricas, que consomem mais produtos da cesta básica”, disse.
Um estudo publicado pela Secretaria de Acompanhamento Fiscal, Energia e Loteria (Sefel), do antigo Ministério da Fazenda, corrobora os argumentos do economista. Segundo o documento, publicado em novembro de 2018, a desoneração da cesta básica apresenta dois problemas principais.
O primeiro, já mencionado por Appy, é que os estratos de renda mais alta da população também são beneficiados – e, portanto, a política não promove distribuição de renda. A segunda questão se refere ao repasse da desoneração: nem sempre o abatimento tributário chega aos consumidores, já que a redução pode se traduzir em ganho de lucro para os produtores.
Políticas de transferência de renda funcionam melhor
Além disso, o estudo da Sefel apresenta uma comparação entre a eficiência da desoneração da cesta básica e do programa Bolsa Família, usando dados de 2016. De acordo com a pesquisa, o programa se mostrou mais efetivo: com gasto de R$ 28 bilhões, naquele ano, houve redução de 1,7% na desigualdade de renda. Já o gasto tributário com a desoneração da cesta, de R$ 18,6 bilhões, não teve resultados tão positivos, resultando em diminuição de somente 0,1% na desigualdade.
Na opinião de Appy, a nova proposta será mais vantajosa para o governo e para a sociedade. “As famílias ricas não vão mais ter o benefício tributário, o que resulta em uma política mais eficiente do ponto de vista distributivo. O novo modelo vai beneficiar mais as famílias pobres do que o atual e vai custar menos”, defendeu.
O teor da PEC 45
Essa é apenas uma das mudanças propostas pela PEC 45. O principal foco da reforma é a unificação de tributos que incidem sobre o consumo. Além dos federais (PIS, Cofins e IPI), o novo imposto, batizado de Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), acabaria também com o estadual Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e com o municipal Imposto Sobre Serviços (ISS).
A proposta já foi aprovada pela Câmara na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Agora, será analisada em uma comissão especial.
Em paralelo, o governo de Jair Bolsonaro (PSL) deve apresentar outro projeto, em que propõe a unificação de impostos federais; a criação de uma contribuição sobre pagamentos, para substituir a contribuição previdenciária da folha; e mudanças no Imposto de Renda para pessoas físicas.