O empresário Paulo Marinho disse em entrevista à Folha de São Paulo, no domingo (17), que o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) foi avisado com antecedência sobre a operação da Polícia Federal que implicaria seu então assessor Fabrício Queiroz. Segundo Marinho, a PF também decidiu deflagrar a operação envolvendo Queiroz após o segundo turno das eleições de 2018 para não prejudicar a campanha de Jair Bolsonaro. Vários desdobramentos políticos e jurídicos ocorreram a partir da entrevista do empresário.
O primeiro foi a decisão de ouvir Marinho no inquérito que apura a suposta interferência política de Bolsonaro na PF. Mas há também a abertura de investigação no Ministério Público Federal e na própria Polícia Federal para investigar o vazamento de informações sigilosas, pedido de abertura de CPI e pedidos de investigação do caso no Conselho de Ética no Senado. A oposição também já falou em cassação da chapa eleita em 2018 e a realização de novas eleições presidenciais. Mas, afinal, o que pode acontecer de fato?
O que disse Paulo Marinho sobre o caso Queiroz
Marinho disse que Flávio Bolsonaro soube da deflagração da Operação Furna da Onça com antecedência através de um delegado da Polícia Federal. O senador teria sido avisado da operação entre o primeiro e o segundo turno das eleições presidenciais de 2018.
O policial teria dito, ainda, que a operação seria deflagrada apenas após o segundo turno das eleições para não prejudicar a campanha de Jair Bolsonaro e ainda aconselhou Flávio a demitir Queiroz e a filha dele, que até então trabalhava no gabinete de Jair Bolsonaro em Brasília. As demissões de fato ocorreram no dia 15 de outubro de 2018.
Em nota, o relator da operação Furna da Onça no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), desembargador Abel Gomes, afirma que as autoridades envolvidas entenderam que a operação "não deveria ser deflagrada em período eleitoral, visto que poderia suscitar a ideia de uso político de uma situação que era exclusivamente jurídico-criminal". Segundo ele, a decisão foi tomada em conjunto pela Justiça Federal, pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal.
Os desdobramentos imediatos e possíveis da denúncia de Marinho
Depois da entrevista de Marinho à Folha, a Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu, no domingo (17), que o empresário preste depoimento no inquérito que investiga as denúncias do ex-ministro Sergio Moro de que o presidente Jair Bolsonaro tentou interferir politicamente na PF.
O procurador João Paulo Lordelo Guimarães, da PGR, enviou um ofício solicitando que a delegada Christiane Correa Machado, do Serviço de Inquéritos Especiais (Sinq) da PF no STF, que também ouça Miguel Ângelo Braga Grillo, o coronel Braga, chefe de gabinete de Flávio. Braga teria sido enviado por Flávio para uma conversa com o delegado da PF em 2018, que revelou que a operação Furna da Onça seria deflagrada.
A PGR também pediu uma cópia de um inquérito da PF que já apurou vazamentos sobre a operação no passado.
MPF abre investigação sobre vazamento de informação
O Ministério Público Federal abriu investigação nesta segunda (18) para apurar o suposto vazamentos de informações da Polícia Federal na Operação Furna da Onça. A Procuradoria também pediu o desarquivamento do inquérito policial da própria PF, conduzido após suspeitas de vazamentos ainda em 2018.
Segundo o procurador da República Eduardo Benones, "há notícias de novas provas que demandam atividade investigatória" em relação a vazamentos da operação. Uma das primeiras medidas será ouvir, em depoimento, Paulo Marinho.
“As investigações do controle externo visam descobrir se policiais federais vazaram informações sigilosas para privilegiar quem quer que seja. Caso fique comprovado qualquer vazamento, mesmo uma simples informações, os policiais responsáveis podem ser presos e até perder o cargo por improbidade”, afirma Benones, que atua como coordenador do Núcleo de Controle Externo da Atividade Policial do Ministério Público Federal no Rio de Janeiro.
Polícia Federal abre apuração interna
A PF também afirmou que determinou, no último domingo (17), a instauração de um procedimento interno para apurar o suposto vazamento de informações sobre a operação Furna da Onça para Flávio Bolsonaro.
Segundo o advogado Pablo Domingues Ferreira de Castro, mestre em Direito Penal, é preciso identificar quem fez o vazamento. “Se foi o delegado responsável pela operação incide o crime de violação do sigilo funcional qualificada”, explica. O crime está previsto no artigo 325, parágrafo 2º, do Código Penal e prevê penas de 2 a 6 anos de prisão e multa. “Há precedente do próprio STF no caso do delegado Protógenes”, acrescenta o advogado.
O delegado da PF Protógenes Queiroz foi condenado pelo STF em 2014 por vazar informações da Operação Satiagraha, comandada por ele em 2008.
Pedido de cassação da chapa Bolsonaro-Mourão no TSE
A denúncia de Marinho também teve desdobramentos políticos. O PT informou que vai defender a cassação da chapa de Bolsonaro e do vice Hamilton Mourão com a realização de novas eleições presidenciais ainda neste ano. O partido vai pressionar para que o Tribunal Superior Eleitoral julgue as ações de investigação das eleições de 2018.
Segundo a advogada Emma Roberta Palú Bueno, especialista em Direito Civil e Eleitoral, a denúncia feita por Marinho pode ser adicionada em uma investigação proposta pela coligação do ex-candidato Fernando Haddad (PT) e que investiga o envio de mensagens supostamente ilegais por apoiadores do atual presidente.
“Contudo, em razão da fase em que se encontra o processo, ainda que haja um aditamento com a inclusão desse novo fato, não vejo como suficiente a permitir um julgamento diferente do que teríamos sem essa novidade”, avalia a advogada. “Veja que não há como desconhecer que a situação realmente é um fator de desequilíbrio na eleição que poderia ser configurado como fraude ou abuso de poder. Contudo, passados quase dois anos do pleito, não há como esse fato ser questionado perante a justiça eleitoral de forma isolada por questões processuais”, completa Bueno.
Abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito
Também pode ser apresentado no Congresso um pedido de abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar as denúncias de Marinho. A oposição informou que deve começar nesta semana a articular a coleta de assinaturas para criação da comissão.
A conclusão de uma CPI, segundo Bueno, pode embasar uma denúncia contra Flávio Bolsonaro e os demais envolvidos no caso. “O procedimento poderá servir de robusto instrumento para as autoridades competentes promoverem a responsabilização civil e criminal dos infratores. Isso porque, não custa lembrar, as CPIs não têm competência para punir quem quer que seja, mas apenas investigar”, ressalta a advogada.
Segundo Castro, o caso pode acabar com a responsabilização penal dos envolvidos. “Com o desenrolar das investigações e desdobramentos de apuração de crime e respectivas autorias, podem ser responsabilizados o próprio presidente; o senador Flávio e eventuais servidores públicos que cooperaram para estes vazamentos. É possível que haja ação penal sobre estes fatos”, ressalta.
Investigação no Conselho de Ética do Senado
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição no Senado, afirmou que vai entrar com um pedido de investigação das denúncias no Conselho de Ética do Senado. “Caso comprovados os fatos, entraremos com pedido de cassação do senador Flávio Bolsonaro”, afirmou.
“Se a representação pelo fato em questão for admitida pelo Conselho de Ética, o que pressupõe a existência de elementos que apontavam para indícios de prática de atos contrários à ética e ao decoro parlamentar, o senador estará sim sujeito à perda de seu mandato”, explica Bueno. O caso, porém, deve passar por um longo processo no Senado antes de chegar a um desfecho.
Quem é Paulo Marinho e qual a ligação dele com Flávio Bolsonaro
Marinho se aproximou da família Bolsonaro durante a campanha presidencial de 2018, mas, com o passar do tempo, foi se afastando do clã. O empresário cedeu sua casa no Rio de Janeiro para a estrutura de campanha de Jair Bolsonaro em 2018 e foi candidato a suplente de Flávio Bolsonaro na campanha ao Senado.
O empresário contou que a última vez que viu Bolsonaro foi em uma reunião em sua casa após o resultado das eleições, em outubro de 2018. Ele também disse à Folha que a última vez que falou com Flávio foi em dezembro, após a diplomação dos candidatos vencedores nas eleições.
Depois disso, segundo Marinho, ele só encontrou Flávio em dezembro do ano passado, quando depôs na CPMI das Fake News.
Atualmente, Marinho é pré-candidato do PSDB à prefeitura do Rio de Janeiro, com a benção de João Doria (PSDB), governador de São Paulo e antagonista do presidente Jair Bolsonaro.
Depois da entrevista à Folha, Marinho solicitou proteção policial ao governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC). "Em função de novas circunstâncias surgidas nas últimas horas, solicitei ao governador do RJ proteção policial à minha família e, após criteriosa análise das autoridades envolvidas, fomos atendidos. Seguiremos firmes lutando pela verdade e pelo Brasil. Obrigado", disse o empresário no Twitter.
O que diz o senador Flávio Bolsonaro sobre as denúncias
Em nota, Flávio Bolsonaro acusou Marinho de querer sua vaga no Senado, já que é suplente do senador. “O desespero de Paulo Marinho causa um pouco de pena. Preferiu virar as costas a quem lhe estendeu a mão. Trocou a família Bolsonaro por Doria e Witzel, parece ter sido tomado pela ambição. É fácil entender esse tipo de ataque ao lembrar que ele, Paulo Marinho, tem interesse em me prejudicar, já que seria meu substituto no Senado", disse Flávio.
“Ele sabe que jamais teria condições de ganhar nas urnas e tenta no tapetão. E por que somente agora inventa isso, às vésperas das eleições municipais em que ele se coloca como pré-candidato do PSDB à Prefeitura do Rio, e não à época em que ele diz terem acontecido os fatos, dois anos atrás? Sobre as estórias, não passam de invenção de alguém desesperado e sem votos", finaliza a nota.
O que é a Operação Furna da Onça
A operação Furna da Onça foi deflagrada pela Polícia Federal no dia 8 de novembro de 2018 e levou à prisão sete deputados estaduais da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) e três deputados afastados. A suspeita é de envolvimento no esquema de corrupção do ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (MDB), preso pela Lava Jato no estado. Segundo as investigações, o grupo recebia propinas de cabral em troca de apoio parlamentar.
A Furna da Onça é um desdobramento da operação Cadeia Velha, de 2017. Essa primeira investigação, por sua vez, foi chefiada pelo delegado Alexandre Ramagem, que depois seria chefe da segurança de Bolsonaro durante a campanha eleitoral. Hoje diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Ramagem chegou a ser nomeado pelo presidente Jair Bolsonaro como diretor-geral da Polícia Federal (PF), mas a indicação foi suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Em 2018, já havia suspeita de vazamento da operação Furna da Onça. Tanto que o juiz federal Abel Gomes, relator da Operação Furna da Onça no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) converteu as prisões temporárias em preventivas com base em indícios de vazamentos.
Na deflagração, a PF encontrou casas sem computadores, contas de WhatsApp sem conversas e um deputado alvo da operação vestido com roupa social e o diploma separado para receber a PF às 6 horas da manhã.
Em dezembro de 2018, em meio à documentação da operação Furna da Onça, um relatório do Coaf chamou a atenção. O documento mostrava uma movimentação atípica de R$ 1,2 milhão entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017 nas contas de Queiroz. Uma das transações identificadas pelo Coaf é um cheque de R$ 24 mil destinado à primeira-dama Michelle Bolsonaro. Queiroz era assessor de Flávio Bolsonaro na Alerj.
A operação resultou na investigação de um esquema de “rachadinha” entre deputados da Alerj, incluindo Flávio Bolsonaro. A prática consiste na devolução de parte dos salários dos servidores do gabinete para o político. Queiroz seria o operador do esquema no gabinete de Flávio Bolsonaro, segundo as investigações.
O ex-assessor “desapareceu” do mapa. Meses após as denúncias virem à tona, foi localizado morando em São Paulo, onde fazia tratamento para um câncer. Seu depoimento à Justiça segue pendente. Queiroz já estava aposentado quando trabalhou para Flávio. Ele também é amigo de Jair Bolsonaro desde os anos de 1980.
Flávio Bolsonaro já tentou interromper investigações 10 vezes
Flávio Bolsonaro já tentou paralisar as investigações sobre suas atividades na Alerj pelo menos 10 vezes. Em julho de 2019, o presidente do STF, Dias Toffoli, suspendeu as investigações que usaram, sem autorização da Justiça, dados detalhados do Coaf, Receita Federal e do Banco Central. Essa decisão atendia a um pedido da defesa de Flávio. O parlamentar alegava ilegalidade e perseguição política na ação.
O MP do Rio de Janeiro também apontou suposta ação de organização criminosa no gabinete de Flávio na Alerj e supostos sinais de que o hoje senador lavou o dinheiro na compra e venda de imóveis. O parlamentar alegou que o órgão tentava atingir seu pai por intermédio dessa investigação. A investigação só foi destravada 136 dias depois da decisão de Toffoli, quando o Pleno do STF avaliou o caso e liberou a ação dos investigadores do Rio de Janeiro.
A decisão mais recente foi na semana passada, quando o ministro Félix Fischer, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), negou novo recurso apresentado pelo senador Flávio Bolsonaro para suspender as investigações do suposto esquema de rachadinhas.
Quem são os jovens expoentes da direita que devem se fortalecer nos próximos anos
Frases da Semana: “Kamala ganhando as eleições é mais seguro para fortalecer a democracia”
Iraque pode permitir que homens se casem com meninas de nove anos
TV estatal russa exibe fotos de Melania Trump nua em horário nobre
Triângulo Mineiro investe na prospecção de talentos para impulsionar polo de inovação
Investimentos no Vale do Lítio estimulam economia da região mais pobre de Minas Gerais
Conheça o município paranaense que impulsiona a produção de mel no Brasil
Decisões de Toffoli sobre Odebrecht duram meses sem previsão de julgamento no STF