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O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino| Foto: Agência Brasil

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, já acumula quatro pedidos de impeachment em menos de dez meses de governo, após frequentes embates com a oposição ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Três desses pedidos já foram protocolados na Procuradoria Geral da Republica (PGR) e um quarto deve ser apresentado em breve, devido ao não comparecimento do ministro a uma audiência na Câmara dos Deputados para a qual ele havia sido convocado, na terça-feira (24).

Questionada pela reportagem, a PGR informou que não há prazo para a análise das denúncias contra Dino. "Todas as denúncias foram encaminhadas para o setor responsável e estão em fase inicial de avaliação, não sendo possível estimar um prazo para a conclusão", avisou o órgão responsável, salientando que as informações tratam somente sobre procedimentos públicos.

O pedido de impeachment mais recente contra o ministro da Justiça deve partir da Comissão de Segurança Pública da Câmara. "Apesar de devidamente convocado a comparecer à Comissão de Segurança, o ministro da justiça e segurança Flavio Dino não compareceu e não apresentou qualquer justificativa. Com isso, o referido ministro comete crime de responsabilidade e será responsabilizado por isso", afirmou o presidente da comissão, deputado Ubiratan Sanderson (PL-RS).

Ele citou o artigo 50 da Constituição Federal, que estabelece que qualquer comissão da Câmara ou do Senado pode convocar ministro de Estado para prestarem pessoalmente informações sobre assunto previamente determinado, prevendo "crime de responsabilidade para ausência sem justificação adequada".

Ainda em outubro, outro processo contra Dino foi protocolado na PGR, pelo deputado Paulo Bilynskyj (PL-SP), alegando o mesmo motivo: ausência não justificada na comissão para a qual havia sido convocado. Os parlamentares da oposição alegam que ele não apresentou atestado de saúde ou de calamidade pública que justificasse a ausência, o que configuraria, segundo eles, crime de responsabilidade.

Na primeira audiência à qual faltou, em 10 de outubro, Dino disse que estava coordenando uma operação deflagrada pela Secretaria Nacional de Segurança Pública naquele dia e que, por isso, não poderia comparecer. O ofício chegou à comissão só depois que a sessão havia sido instalada, o que irritou os parlamentares do colegiado e suscitou diversas críticas ao longo da sessão, que acabou marcando nova data, 24 de outubro, para a convocação de Dino.

O objetivo das convocações era questionar o ministro sobre vários assuntos, desde o decreto anti-armas até as recentes ondas de violência na Bahia e Rio de Janeiro. Mas nesta terça (24), Dino faltou novamente. Desta vez ele alegou que sua integridade física corria risco caso comparecesse à audiência e reforçou um pedido para que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), realize uma sessão em plenário com todas as comissões para que ele possa atender às convocações e convites feitos pelos deputados.

"Eu já recebi mais de 100 convites da Câmara e Senado e fui o ministro de Estado que mais fui e estou disposto a ir. O que proponho é racionalização. Se eu tenho dezenas de pedidos, o regimento interno da Câmara prevê que se reúnam todas as comissões no plenário da casa e o ministro vai lá. Eu estou me oferecendo a isso, oficialmente, pela terceira vez. Se há agressão, ofensa, ameaça física, eu não posso como cidadão e ministro de Estado me submeter a um risco físico que eventualmente ocorra em algumas situações", disse Dino.

Os deputados da comissão reagiram às declarações, afirmando que não são bandidos, como o ministro parece ter sugerido. Mesmo parlamentares da base governista que integram o colegiado reforçaram que Dino deveria ter respeitado a convocação, embora discordem das críticas feitas pelos deputados oposicionistas.

“Vemos novamente o desrespeito de Dino com o Congresso Nacional e com o povo brasileiro. A segurança nacional num momento crítico e ele prefere cometer novo crime de responsabilidade a vir explicar sua péssima gestão”, afirmou Bilynskyj.

Apesar de ter se recusado a comparecer às audiências da Comissão de Segurança Pública, o ministro foi, nesta quarta-feira (25), à Câmara para participar de sessão na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle. A audiência foi marcada por bate-boca entre Dino e deputados da oposição.

"Eu não responderei a assuntos relacionados à Comissão de Segurança Pública. Faltei por motivos já justificados. A ausência é um direito. Foram as polícias Militar e Federal que recomendaram que eu não fosse à Comissão de Segurança e me liberaram para estar aqui, na Comissão de Fiscalização e Controle", avisou Dino.

Outros dois pedidos de impeachment estão parados na PGR

Em outro processo, Flávio Dino é acusado de ter dito uma frase controversa sobre controle da Polícia Federal. A oposição afirma que, durante a posse do ministro do Esporte, André Fufuca (PP-MA), Dino disse ao novo colega de Esplanada: "Dinheiro não tenho, mas agora a polícia eu tenho". Na interpretação de opositores, Dino insinuou uso político da Polícia Federal, que está sob o guarda-chuva de seu ministério.

Após a repercussão negativa, o ministro disse que a fala foi tirada de contexto e que estava se referindo a um programa de segurança nos estádios que deverá ser desenvolvido em parceria com a Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Segundo o ministro, caberá à pasta do Esporte providenciar o dinheiro para o programa, enquanto o Ministério da Justiça ficará responsável pelo policiamento.

Outro processo de impeachment alega abuso de autoridade contra Flávio Dino por ameaçar instaurar procedimento investigatório contra o Google, depois que a companhia se manifestou contra o projeto de lei das fake news (PL 2.630/2020), que ainda não foi analisado pela Câmara dos Deputados. O caso ocorreu em maio, quando a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), órgão que integra o Ministério da Justiça, impôs à big tech multa de R$ 1 milhão por hora caso mantivesse em destaque, em sua página inicial, um link que remetia a um artigo da empresa contrário à aprovação do PL das Fake News.

Parlamentares veem Dino blindado no STF

Especialistas consultados pela Gazeta do Povo apontam que as chances de uma condenação são pequenas. Os próprios deputados também têm dúvidas sobre uma eventual punição. "Isso é a certeza da impunidade, a certeza de que ele não será punido. Por quê? Porque ele tem o apoio, está amparado pelo STF", disse Carlos Jordy (PL-SP), líder da oposição na Câmara. Bilynskyj também diz que tem dúvidas sobre eventuais punições ao ministro, mas afirma que está "cumprindo seu papel de parlamentar" ao pedir o impeachment de Dino.

O Supremo Tribunal Federal (STF) é o órgão responsável por julgar crimes de responsabilidade contra ministros. Até hoje, não há registros de condenações.

No governo de Jair Bolsonaro (PL), em 2020, o ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub, também foi alvo de um pedido de impeachment, apresentado por parlamentares que indicaram uma "paralisia" tanto no planejamento quanto na execução de políticas públicas por parte da pasta comandada por Weintraub.

O caso, porém, foi arquivado por decisão do então ministro Ricardo Lewandowiski. A PGR havia pedido o arquivamento do processo, alegando que parlamentares não tinham legitimidade para apresentar aquela acusação, e que caberia à própria PGR apresentar o pedido de afastamento de Weintraub. Apesar do desfecho favorável, o ministro da Educação não resistiu à pressão e, fragilizado por diversos desgastes e polêmicas, pediu para deixar a equipe ministerial três meses depois.

Ao contrário de Weintraub, Flávio Dino está em uma posição mais confortável. Apesar de ser constantemente alvo de críticas da oposição – e até mesmo de "fogo amigo" –, ele é um dos principais ministro de Lula e é cotado como um dos candidatos favoritos à uma vaga no STF, aberta com a recente aposentadoria da ex-ministra Rosa Weber.

Para o advogado Marcos Jorge, a chance de procedência nesses processos contra Dino é pequena. "Se trata de ação política, tem muito mais fundamento e base política do que fundamento jurídico, uma tentativa de responsabilização. Acredito também que não vá influenciar em nada com relação a uma eventual indicação ao STF, caso Lula opte por indicá-lo".

Por outro lado, o jurista Fabrício Rebelo diz que Dino parece estar "debochando" da Câmara dos Deputados, se colocando como "intocável" e sendo até mesmo desrespeitoso. "Diferentemente do convite, em que a presença é facultativa, a convocação equivale a uma intimação judicial, exigindo que qualquer ausência seja formalmente justificada, inclusive sob pena de possível caracterização de crime de responsabilidade", explica.

"É difícil dizer exatamente o que o ministro pretende com isso, mas acaba alimentando a ideia de que ele já não está mais comprometido com a pasta que ocupa, mas apenas esperando sua ida para o STF, e talvez por isso não queira expor sua total inação e mesmo o flagrante despreparo para gerir as políticas de segurança pública nacionais", complementa Rebelo.

Oposição quer que Lira tome atitude quanto a Dino

Além de um novo pedido de impeachment contra Flávio Dino, a oposição quer o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), tome uma atitude contra o que classifica de "descaso" do ministro com a Casa. O presidente da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, Ubiratan Sanderson (PL-RS), está tentando marcar uma audiência com Lira para tratar do caso.

O presidente da Câmara também recebeu ofício de Flávio Dino, para que seja realizada uma comissão geral no plenário da Câmara, com a participação de várias comissões. O ministro diz que "não há clima" para ir à Comissão de Segurança Pública e que da última vez em que esteve no colegiado a reunião precisou ser interrompida por uma série de ofensas e xingamentos, e que desta vez não seria diferente. Disse inclusive que as ameaças também partiram do próprio presidente da comissão, que teria o dever de zelar pelo decoro parlamentar no colegiado,

Sobre uma possível data para realização da comissão pedida por Dino, a assessoria da presidência da Câmara informa que não há nada definido.

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