Com base na interpretação do jurista Ives Gandra Martins, Bolsonaro não poderia usar as Forças Armadas evocando o artigo 142 da Constituição para resolver crise com o STF.| Foto: Isac Nobrega/PR
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Se for "parte do problema", o presidente da República não pode evocar o artigo 142 da Constituição e empregar as Forças Armadas para a "garantia da lei e da ordem" no caso de uma crise entre os poderes. É o que explicou o jurista Ives Gandra Martins em artigo publicado no site Conjur nesta sexta-feira (27).

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O artigo 142 costuma ser citado pelo presidente Jair Bolsonaro, integrantes do governo e apoiadores como base jurídica para uma possível intervenção militar contra o que consideram ser excessos do Supremo Tribunal Federal (STF). Muitos, por sinal, usam de forma equivocada uma interpretação do próprio Ives Gandra feita em 2020.

Em maio do ano passado, Gandra disse que o referido artigo, que trata das atribuições das Forças Armadas, concede a elas o papel de "Poder Moderador" em caso de desequilíbrios entre as instituições. Na época, Bolsonaro chegou a publicar em seu perfil numa rede social um vídeo em que o jurista expressa essa interpretação em uma entrevista.

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Consultor da Constituição de 1988, Gandra escreveu um novo artigo para esclarecer sua interpretação sobre o artigo 142 a pessoas que, segundo ele, a citam "por ouvir dizer" e "sem a ler"', fazendo uma "fantástica distorção" de seu pensamento. No texto, ele deixa claro o entendimento de que as Forças Armadas não podem ser usadas como Poder Moderador quando o presidente da República é "parte do problema".

"Em palestras posteriores, ao explicitar meu pensamento, inclusive nas aulas para a Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, esclareci que, se houvesse um conflito entre o Poder Executivo e qualquer dos outros poderes com claro ferimento da Lei Maior, sem outro remédio constitucional, o presidente não poderia comandar as Forças Armadas na solução da questão, se fosse o poder solicitante, e, pois, parte do problema", diz Gandra no artigo.

Artigo 142 fala sobre lei e ordem, não ruptura, alerta Ives Gandra

Outro alerta feito feito por Gandra em seu novo artigo é que, no caso de as Forças Armadas serem evocadas como Poder Moderador em caso de desequilíbrio entre os poderes, elas "são convocadas para garantir a lei a ordem, e não para rompê-las". "Já que o risco de ruptura provém da ação de pessoas ou entidades preocupadas em desestabilizar o Estado", explica o jurista.

Nessa hipótese, caberia aos comandantes das três Forças Armadas a "reposição da lei e da ordem", diz Gandra. O jurista ainda reforça que a "reposição da lei e da ordem seria pontual", ou seja, "naquele ponto rompido, sem que as instituições democráticas fossem abaladas".

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Em outra ressalva à interpretação ao artigo 142, Gandra destaca que, em caso de invasão de competência de um poder sobre outro, o uso das Forças Armadas como Poder Moderador ficaria limitado "apenas para sustar a invasão, e para mais nada".

"Se os poderes deixarem de ser harmônicos e independentes e colocarem em risco a democracia com invasões de competência uns dos outros, para sustar tais invasões um dos poderes atingidos pode solicitar a intervenção apenas para sustar a invasão, e para mais nada", destaca o consultor da Constituição.

Pedidos de intervenção militar são esperados em atos de 7 de setembro

O esclarecimento feito por Gandra de sua própria interpretação vem às vésperas das manifestações marcadas para 7 de setembro, Dia da Independência. Como informou a Gazeta do Povo, Bolsonaro foi avisado por sua equipe no Palácio do Planalto que parte de seus apoiadores que irão às ruas pedirão uma intervenção militar.

Interlocutores no Planalto dizem que são infundadas as acusações de opositores de que Bolsonaro pretende levar adiante uma suposta intervenção militar. Mas a avaliação no governo é de que o presidente pode defender, durante os atos do Dia da Independência, a liberdade de expressão daqueles que argumentam que o artigo 142 da Constituição possa ser usado para justificar uma intervenção.

Os organizadores dos atos de 7 de setembro esclarecem, contudo, que intervenção militar não faz parte da pauta das manifestações. A intenção é defender o cumprimento das leis, de modo que as interpretações sejam de acordo com os anseios da sociedade.

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Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]