O presidente Jair Bolsonaro está diante de uma encruzilhada: ele tem que decidir se veta ou sanciona o fundo eleitoral de R$ 2 bilhões aprovado pelo Congresso. Aparentemente, a tendência é chancelar o fundão – Bolsonaro usou a primeira live do ano no Facebook, na quinta-feira (2), para justificar que um possível veto dele ao Fundo Especial de Financiamento de Campanha poderia acabar em impeachment.
O presidente explicou a necessidade de sancionar o texto usando o artigo 85 da Constituição Federal, alegando que um veto ao fundão eleitoral poderia incorrer em crime de responsabilidade. Foi o suficiente para parte importante do bolsonarismo se revoltar nas redes sociais, defendendo o veto ao fundo "custe o que custar".
É simples entender a "sinuca de bico" em que Bolsonaro se meteu: se sancionar o fundão, ele desagrada seus apoiadores mais fiéis; por outro lado, o veto pode abalar o relacionamento dele com o Congresso.
O valor do fundo para financiar as campanhas eleitorais municipais em 2020 é motivo de polêmica desde o início das discussões sobre o orçamento federal, em 2019. Em princípio, os parlamentares pediam R$ 3,8 bilhões para o fundo, valor que, segundo eles, compensaria a proibição à doação de pessoas jurídicas a políticos e partidos.
O projeto orçamentário original do governo previa um fundo de R$ 2 bilhões, mas o tema sempre causou desconforto no Planalto porque ser caro aos eleitores do presidente. Diante das movimentações para quase dobrar esse valor, Bolsonaro mandou um recado ao Congresso, ameaçando vetar os R$ 3,8 bilhões e admitindo um fundo de "apenas" R$ 2 bilhões.
Os parlamentares recuaram e aprovaram o Orçamento geral de 2020 com o valor do fundo que o Planalto defendeu. Mas, curiosamente, Bolsonaro afirmou publicamente logo em seguida que cogitava vetar mesmo os R$ 2 bilhões. Mas ele mudou de ideia alegando o risco de ser cassado da Presidência.
Bolsonaro teme impeachment se vetar fundo eleitoral
“Eu tenho que cumprir a lei, meu Deus do céu...e se tem uma lei de 2017 que diz que tem que ter o fundão de R$ 2 bilhões, segundo o TSE e a Receita Federal, eu vou vetar isso? Com toda certeza alguém vai entrar com um pedido de impeachment, alguém do Parlamento ou você, do povo. E vai lá para a mesa do Rodrigo Maia”, disse Bolsonaro na live de quinta-feira.
As críticas de eleitores vieram já nos comentários nas redes sociais do presidente. O fundo eleitoral é considerado uma aberração pelos bolsonaristas, que querem o fim do financiamento público de campanhas, ou seja, com dinheiro dos contribuintes. O argumento do impeachment, no entanto, já foi refutado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ, em dezembro.
"O presidente da República pode vetar ou sancionar a sua própria proposta [para o fundo eleitoral, de R$ 2 bilhões]. Ele não precisa se preocupar com nada disso [impeachment]", disse em entrevista ao blog da Natuza Nery, no G1. “Rodrigo Maia falou e vai cumprir a palavra dele, eu sei disso. Mas lá na frente ele pode sofrer pressão”, rebateu o presidente durante a live.
A ex-líder do governo na Câmara, Joice Hasselmann (PSL-SP), afirmou que o risco de sofrer um impeachment levantado pelo presidente nesse caso é "mentira" e "estelionato moral". "Não existe nenhuma linha da legislação sobre isso. É uma prerrogativa do presidente vetar ou não. É uma mentira [a possibilidade de impeachment] para fazer jogo político e colocar a população contra o Congresso Nacional", tuitou Joice.
“O que o PR [presidente] quer – MAIS UMA VEZ – é jogar para torcida com informações enganosas e provocar um desgaste no Congresso, de novo. Ele tem jogado dessa forma. Chega! O PR tem que ser RESPONSÁVEL pelos seus atos e não se acovardar jogando suas responsabilidades nos lombos de outros”, disse a deputada em uma sequência de tuítes em que tratou sobre o tema.
Bolsonaro usou a live para citar outros exemplos de vetos pelos quais foi criticado. “Tudo tem consequência, muitas vezes eu, sancionando ou vetando qualquer coisa, levo pancada. Não tem como. Igual o juiz de garantias, ninguém falava nada quando o Congresso aprovou, zero, ficou um tempão na minha mesa. Quando eu resolvi sancionar, apareceram os constitucionalistas, prontos para meter fogo em mim”, disse.
Bolsonaro chegou a citar a comoção na internet de pessoas contrárias à aprovação do fundão e ressaltou que se alguém tiver um argumento diferente deve apresentar, já que ele deve cumprir a lei “mesmo que a lei não nos agrade”. Para as eleições 2020, Bolsonaro ressaltou que quem usar o dinheiro do fundo será “patrulhado”.