O governo deve apresentar até o fim de junho um projeto para abrir o mercado de gás natural e acabar de vez com o monopólio de produção, transporte e distribuição exercido pela Petrobras.
Chamado de “Novo Mercado de Gás”, o programa prevê a venda de transportadoras e distribuidoras de gás da estatal e uma nova regulamentação para que os estados que têm distribuidoras locais permitam o acesso de terceiros aos gasodutos (hoje há restrições) e que consumidores possam comprar de qualquer distribuidor. O governo quer, ainda, incentivar esses estados a vender suas distribuidoras regionais.
Objetivo é baratear custo e gerar “choque de energia barata” no país
O programa está sendo desenhado pelos ministérios da Economia e de Minas e Energia. O ministro da Economia, Paulo Guedes, tem dito em eventos públicos que a abertura do mercado dará um “choque de energia barata” no país. O gás natural é usado principalmente por indústrias para geração de eletricidade.
A avaliação é que a quebra do monopólio deve atrair novos players para o mercado, o que trará mais investimentos para o Brasil. Também vai facilitar a ampliação da nossa rede de gasoduto, considerada pequena para o tamanho do país. E com mais concorrentes e dutos, o preço do gás tende a cair.
A mesma avaliação é compartilhada por Filipe Soares, diretor de energia da Associação dos Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres (Abrace). "A modernização do setor de gás natural pode promover uma racionalidade econômica na formação de preços. Não dá para aceitar um país como o Brasil que praticamente dobrou a produção de gás natural nos últimos dez anos e que quando você nota a componente de preço, o gás natural está com um preço muito próximo da GNL, que é aquele gás natural liquefeito que vem de outras regiões do mundo e que é comum em países que não têm produção nacional, como a China e o Japão", afirma.
Ele defende que o Brasil use mais o gás natural que é extraído e produzido aqui. "Temos que usar o gás nacional. Mas um gás nacional com preço razoável. E para isso a gente precisa da questão da quebra do monopólio, para estimular um mercado competitivo. E em um mercado competitivo a tendência é baixar preço."
Venda de ativos da Petrobras já está em andamento
A venda de transportadoras e distribuidoras da Petrobras já está em andamento. A estatal começou a vender ativos e subsidiárias em 2016 para sanar suas dívidas. O programa será intensificado na gestão de Roberto Castello Branco, que assumiu a presidência da estatal em janeiro.
A empresa divulgou nesta semana que está estudando a modelagem mais adequada para vender uma fatia da BR Distribuidora, a sua distribuidora de combustíveis, incluindo gás natural. Atualmente, a Petrobras é dona de 70% das ações da BR Distribuidora. O restante está distribuído na bolsa de valores.
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A Petrobras também vendeu no início de abril 90% da sua Transportadora de Gás Natural (TAG), dona de uma rede de gasodutos de 4,5 mil quilômetros no Norte e no Nordeste. O grupo francês Engie e o fundo canadense CDPQ compraram por US$ 8,5 bilhões.
Antes, em 2016, a companhia já tinha vendido 90% da Nova Transportadora do Sudeste (NTS), com atuação no Sudeste, para a gestora canadense Brookfield e para a Itaúsa por US$ 4,2 bilhões.
Falta se desfazer dos gasodutos das demais regiões, da BR Distribuidora e da Gaspetro. A última ainda não entrou na lista de desinvestimento.
Plano para os estados está sendo finalizado
No âmbito dos estados, a abertura do mercado estará prevista em duas medidas: uma nova regulamentação estadual e no Plano de Equilíbrio Financeiro (PEF), um programa de socorro aos estados. Os dois projetos serão encaminhados ao Congresso e precisam da aprovação dos parlamentares.
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A regulamentação vai deixar mais clara algo que a Lei do Gás, de 2009, já previu, que é a figura do consumidor livre de gás natural. A ideia é permitir que as empresas possam comprar gás de qualquer distribuidora e que distribuidores privados tenham acesso à rede de gasodutos. Alguns estados que possuem distribuidoras próprias de gás impedem o acesso ou cobram por isso.
Já o PEF é um programa preparado para ajudar os estados em grave crise financeira, com notas C e D no Tesouro, ou seja, sem capacidade de pagamento. Para liberar acesso à crédito com garantias da União, o programa deve incentivar, entre outras coisas, a venda de distribuidoras estatais estaduais de gás.
O que é o monopólio do gás natural
A Petrobras domina a produção, transporte e distribuição de gás natural no país. Segundo os dados mais recentes da Agência Nacional de Petróleo (ANP), a estatal controla 92,9% da produção de gás natural no país. Em fevereiro, a produção nacional foi de 110,1 milhões de metros cúbicos por dia. O gás é retirado junto na extração de petróleo.
A estatal era dona até o ano de 2016 de toda a rede de gasoduto no país. Uma lei de 2009, chamada lei do gás, tentou abrir o mercado para que empresas privadas tivesse acesso à infraestrutura, mas sem sucesso.
Ao todo, o Brasil tem 9,4 mil quilômetros de gasoduto. A extensão é considerada pequena para o tamanho do país. Isso aconteceu porque o gás natural era considerado um subproduto no país. Parte do gás extraído junto na exploração de petróleo é simplesmente queimada e outra injetada novamente nos poços. Isso acontece por falta de demanda, por problemas no combustível e por falta de acesso dos poucos players privados (menos de 10%) à rede de gasoduto da Petrobras.
Por exemplo, dos 110,1 milhões de metros cúbicos por dia extraídos em fevereiro, 5,1 milhões foram queimados e 36,3 milhões devolvidos aos poços distribuidores. Somente o restante pode de fato ser vendido ao mercado.
A expectativa do governo, porém, é para que cresça a demanda das indústrias pelo gás natural como uma fonte de energia. E a abertura do mercado surge justamente para que novos investimentos sejam feitos e possam atender à demanda por esse combustível.
"É uma estratégia de você semear o terreno para novos ofertantes, principalmente esses ofertantes que estão operando áreas de pré-sal. A gente tem a presença de vários players globais que são relevantes e que estão com aquele gás natural vindo do petróleo do pré-sal e que hoje, se não tem acesso à infraestrutura, estão tendo que rejeitar esse gás. Esses player precisam de base para explorar e investir em infraestrutura para escoar esse gás que está sendo produzido offshore, em algumas centenas de quilômetros da costa", explica Filipe Soares, diretor de energia da Abrace.
No caso das distribuidoras, a Petrobras domina cerca de 70% do mercado, seja sendo dona integral ou tendo participação acionária. Há, ainda, as distribuidoras regionais de gás, normalmente estatais estaduais - e muitas com participação da Petrobras.
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