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O ministro Gilmar Mendes disse que vai votar a favor da manutenção da decisão de Dias Toffoli que anulou provas entregues pela Odebrecht em seu acordo de leniência. A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) julgaria nesta terça-feira (27) recursos do Ministério Público contra a decisão, proferida em setembro do ano passado. A deliberação, no entanto, foi adiada a pedido de André Mendonça, relator de outra ação que questiona a validade de todos os acordos de leniência firmados no âmbito da Operação Lava Jato.
Mesmo com o adiamento do julgamento, Gilmar Mendes se manifestou sobre o caso na sessão da Segunda Turma. Com base em mensagens trocadas entre procuradores de Curitiba, captadas por hackers, o ministro acusou-os de obter, diretamente junto ao MP da Suíça e de maneira informal, cópias de sistemas da Odebrecht que registravam pagamentos de propina e doações eleitorais a políticos.
Trata-se do motivo apresentado por Toffoli para anular essas provas, uma vez que a remessa desses dados deveria ser precedida de um pedido formal encaminhado pelo Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), órgão vinculado ao Ministério da Justiça, e não de maneira direta entre MPs do Brasil e da Suíça.
“Os diálogos comprovam que Dallagnol recebeu as provas ainda em 2015, antes do envio do pedido de cooperação internacional pelo DRCI, formulado em 3/6/2019. E não só: indicam também que a força-tarefa forjou documentos para dissimular a origem ilícita das provas. Para isso, alterariam o conteúdo de relatórios oficiais para que constasse data posterior ao recebimento dos dados pelo DRCI”, afirmou Gilmar Mendes.
O que dizem Dallagnol e o MPF sobre as provas da Odebrecht
Ex-chefe da força-tarefa da Lava Jato, o ex-procurador Deltan Dallagnol, acusado diretamente por Gilmar Mendes, diz que as provas foram obtidas de maneira regular, via DRCI, e tiveram sua autenticidade e integridade atestadas por perícias da PF.
Num dos recursos contra a anulação das provas da Odebrecht, o MPF diz que, após a decisão de Toffoli, o Ministério da Justiça atestou que o DRCI intermediou a obtenção das provas, o que não teria sido considerado pelo ministro. Num outro recurso, o MP de São Paulo argumenta que a anulação foi “ampla e genérica”. A associação dos procuradores, por sua vez, defendeu a validade dos acordos de leniência, com a manutenção das multas.
Na sessão, Gilmar Mendes ainda citou mensagens indicando que pendrives contendo cópias do Drousys, um dos sistemas, foram transportadas no Brasil em sacolas de supermercado “e manuseadas por agentes policiais que não seguiram técnicas forenses de extração de dados”.
O ministro chegou a sugerir a instalação de uma “comissão da verdade” para investigar esses casos. “Acho que o Ministério Público precisaria liderar isso, em defesa do bom nome da instituição. É urgente que o CNMP faça algo”, afirmou.
Construtoras vão renegociar multas com órgãos do governo
O julgamento não ocorreu porque André Mendonça abriu um prazo de 60 dias para que empresas que fecharam acordos de leniência no âmbito da Lava Jato ou operações correlatadas renegociem suas multas junto à Controladoria-Geral da União (CGU) e Advocacia-Geral da União (AGU), órgãos vinculados ao governo federal. Fazem parte desse grupo Novonor (novo nome da Odebrecht), J&F, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, UTC, Metha (antiga OAS), CR Almeida, Nova Engevix, UTC, SOG Óleo e Gás, PEM Engenharia, Setec Tecnologia, Samsung Heavy Industries, Companhia Paranaense de Construção, MLR Locações de Máquinas e TV Maringá.
O ministro é relator de uma ação do PSOL, PC do B e Solidariedade que questiona a celebração dos acordos de leniência das empresas com o Ministério Público Federal. Assim como várias delas, acusam os integrantes da Lava Jato de negociarem o acordo com coação, com prisões preventivas dos executivos, entre 2014 e 2018, principalmente.
Pela mesma razão, Dias Toffoli suspendeu, neste ano, os pagamentos multas de R$ 3,5 bilhões da Novonor e de R$ 10,3 bi da J&F. Mendonça decidiu que, nos próximos dois meses, as demais empresas também não sofrerão qualquer punição se deixarem de pagar suas multas, enquanto renegociam os acordos.
Na sessão desta terça, o ministro Edson Fachin, que é o relator da Lava Jato no STF, disse que os acordos de delação premiada que celebrou na Corte – de natureza penal e individual, com os executivos – respeitou o requisito da voluntariedade. Em outras palavras, não foram fechados sob pressão indevida, como acusam os advogados deles em relação aos acordos de leniência, estes de natureza cível e voltados para multar as empresas por atos de corrupção.
“Em todas as colaborações realizadas e homologadas no âmbito dessa relatoria, os magistrados auxiliares de meu gabinete, por minha delegação, sempre indagaram dos colaboradores acerca da voluntariedade. Em todos esses atos, todos os colaboradores estavam devidamente acompanhados e orientados por seus respectivos advogados, confirmaram a voluntariedade. Somente se homologa o acordo após essa inequívoca compreensão da voluntariedade”, disse.