O Ministério Público Federal (MPF) denunciou o jornalista Glenn Greenwald e seis investigados no âmbito da Operação Spoofing, que apura invasão de celulares e roubo de mensagens de celulares de autoridades brasileiras (entre as quais procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato e o então juiz Federal Sérgio Moro). A denúncia apontada prática de organização criminosa, lavagem de dinheiro, bem como as interceptações telefônicas planejadas e executadas pelos investigados.
No que se refere à responsabilização de Greenwald, o MPF ressalta que o jornalista não era alvo de investigações. A ressalva tem relação com uma decisão de Gilmar Mendes, de agosto de 2019: na ocasião, o ministro do STF proibiu que o jornalista fosse investigado para assegurar o sigilo da fonte, conforme previsto na Constituição. Segundo o procurador da República Wellington Divino de Oliveira, que assina a denúncia, a ordem não foi descumprida, entretanto, durante a análise de um MacBook apreendido com autorização da Justiça foi encontrado o áudio de um diálogo entre o jornalista e um dos investigados, Luiz Molição.
A conversa ocorreu logo após a divulgação, pela imprensa, da invasão sofrida pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro. Diz a denúncia que, "nesse momento, Molição deixa claro que as invasões e o monitoramento das comunicações telefônicas ainda eram realizadas e pede orientações ao jornalista sobre a possibilidade de 'baixar' o conteúdo de contas do Telegram de outras pessoas antes da publicação das matérias pelo site The Intercept". O procurador escreve ainda que "Greenwald, então, indica que o grupo criminoso deve apagar as mensagens que já foram repassadas para o jornalista de forma a não ligá-los ao material ilícito".
O MPF considera que restou comprovado que Glenn auxiliou, incentivou e orientou o grupo durante o período das invasões aos dispositivos. Ainda para os procuradores, essa atitude do jornalista caracteriza "clara conduta de participação auxiliar no delito, buscando subverter a ideia de proteção a fonte jornalística em uma imunidade para orientação de criminosos".
Os outros seis citados
De acordo com o MPF, as apurações realizadas permitiram esclarecer o papel, dentro do bando, de cada um dos denunciados. Walter Delgatti Netto e Thiago Eliezer Martins Santos atuavam como mentores e líderes do grupo. Danilo Cristiano Marques era "testa-de-ferro" de Walter, proporcionando meios materiais para que o líder executasse os crimes. Gustavo Henrique Elias Santos era programador, tendo desenvolvido técnicas que permitiram a invasão do Telegram e também perpetrava fraudes bancárias. Aparece ainda Suelen Oliveira, esposa de Gustavo, que segundo o MPF agia como laranja e "recrutava" nomes para participação nos ilícitos. Por fim, Luiz Molição invadia terminais informáticos, aconselhava Walter sobre condutas que deveriam ser adotadas e serviu de porta-voz do grupo nas conversas com Greenwald.
A denúncia relata que a suposta organização criminosa executava crimes cibernéticos por meio de três frentes: invasão de dispositivos informáticos (como, por exemplo, celulares), lavagem de dinheiro e fraudes bancárias, mas essa última não é explorada na peça em questão. Nesse sentido, a finalidade de citá-los seria apenas caracterizar o objetivo dos envolvidos e explicar as suas ligações. Conforme o MPF, uma ação penal apresentada posteriormente tratará tais crimes.
O que diz Glenn Greenwald, sua defesa e The Intercept
O jornalista divulgou pessoalmente uma nota sobre a denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal. O texto foi publicado no Twitter; confira na íntegra:
Em nota encaminhada ao Blog do Fausto Macedo no portal do jornal O Estado de S. Paulo, o advogado Rafael Borges, que defende o jornalista Glenn Greenwald, classificou de "expediente tosco" a denúncia MPF. Segundo a nota, o MPF intenta "desrespeitar a autoridade da medida cautelar" concedida pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), em defesa de Greenwald. "Recebemos com perplexidade a informação de que há uma denúncia contra o jornalista Glenn Greenwald, cofundador do The Intercept. Trata-se de um expediente tosco que visa desrespeitar a autoridade da medida cautelar concedida na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 601, do Supremo Tribunal Federal, para além de ferir a liberdade de imprensa e servir como instrumento de disputa política", diz a nota. A defesa do jornalista interpreta a denúncia do MPF como uma tentativa de "depreciar o trabalho jornalístico" feito pela equipe do site The Intercept Brasil, que divulgou as mensagens supostamente trocadas entre membros do MPF de Curitiba e o então juiz federal, hoje ministro da Justiça, Sergio Moro".
O site The Intercept Brasil, que publicou as reportagens produzidas com base nas informações interceptadas, também se manifestou:
Repercussão
Diversas autoridades e políticos se manifestaram, também, sobre denúncia contra Glenn. "Onde está esse cara? Está no Brasil, ele?", questionou o presidente Jair Bolsonaro, ao ser perguntado sobre a denúncia na saída do Palácio do Alvorada. Bolsonaro chegou a afirmar que "quem denunciou foi a Justiça, você não acredita na Justiça?", mas - de acordo com o UOL - foi corrigido, no local, por um repórter no local; quem oferece denúncia é o Ministério Público.
Um dos filhos do presidente, deputado federal Eduardo Bolsonaro, ironizou em seu perfil no Twitter: "Glenn Greenwald sempre disse que adorava o Brasil e queria conhecer o país a fundo. Quem sabe agora vai conhecer até a cadeia... talvez jogar futebol com o Freixo...".
Já o presidente da Câmara, deputado federal Rodrigo Maia (DEM), foi às redes sociais para escrever que ""Jornalismo não é crime. Sem jornalismo livre não há democracia". Criticou ainda a denúncia, chamada por ele de "ameaça à liberdade de imprensa".
Gleisi Hoffmann (PT-PR) classificou a denúncia como "vingança". "MP abusa do poder p/ se vingar de @ggreenwald que denunciou crimes da Lava Jato e parcialidade de Moro contra Lula. Querem estado policial, com mais farsas, ilegalidades e arbitrariedades. PT solidário com Glenn, em defesa da liberdade de imprensa", publicou a presidente do partido. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva também se solidarizou com o jornalista e falou em "evidente abuso" por parte do MPF.
Também na tarde de terça, a Ordem dos Advogados do Brasil emitiu nota na qual fala em criminalização da "mera divulgação de informações" e em risco à liberdade de imprensa. Durante o dia, as principais entidades de representação do jornalismo e dos jornalistas no país fizeram coro às críticas. Notas de repúdio foram divulgadas pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e a Associação Brasileira de Jornalismo (ABI), na qual se menciona "atentado à Constituição Brasileira, um desrespeito ao STF e à Polícia Federal, bem como uma tentativa grotesca de manipulação".
Por outro lado, o secretários de Direitos Humanos da Procuradoria-Geral da república, Aílton Benedito, defendeu a legalidade da denúncia oferecida pelo MPF contra o jornalista. “O HC que lhe foi concedido pelo STF é bastante claro, para quem quer ler e promover a verdade. O sujeito só não podia ser investigado por mera divulgação de fato que lhe chegara ao conhecimento. A decisão não o protege de ser denunciado pela participação nas próprias violações”, escreveu o procurador no Twitter.
Confira a íntegra da denúncia contra Glenn Greenwald:
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