Presidente Jair Bolsonaro e o governador de Minas, Romeu Zema: alinhamento político não se reflete nas ações de combate à pandemia.| Foto: Alan Santos/PR
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As principais sugestões do presidente Jair Bolsonaro para o combate à pandemia de coronavírus, como seu posicionamento contra medidas de isolamento e a favor do "tratamento precoce" à base de cloroquina e ivermectina, são desconsideradas pela maior parte dos governadores – inclusive daqueles mais alinhados com o chefe do Executivo federal.

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A Gazeta do Povo levantou as políticas sobre Covid-19 nos estados e principais cidades do Brasil e identificou em quase todos ações de toque de recolher, fechamento de comércio não essencial e outras iniciativas para restringir a circulação de pessoas. Há ainda muita ênfase de governadores e prefeitos na vacinação da população, proposta recentemente encampada por Bolsonaro, mas que até pouco tempo era criticada pelo presidente e parte de seus aliados.

A defesa das restrições de circulação é feita por um dos governadores mais próximos de Bolsonaro, o mineiro Romeu Zema (Novo). No último dia 17, ao anunciar decretos para inibir o tráfego de pessoas e a atividade comercial, Zema declarou: “estamos obrigados a optarmos entre continuar vivendo como se nada estivesse acontecendo ou termos um isolamento para salvarmos vidas. E eu sou favorável a salvar vidas”.

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Eleito em 2018 pelo PSL (mesmo partido de Bolsonaro à época), o governador de Rondônia, Coronel Marcos Rocha, foi ainda mais enfático em uma fala a favor das restrições, que fez em fevereiro. No pronunciamento, veiculado em seu perfil nas redes sociais, Rocha chamou a Covid-19 de "doença maldita", criticou as pessoas que "não levam a doença a sério", exibiu um gráfico que mostrava a redução de casos da doença quando a quarentena foi mais obedecida no estado, pediu o uso de máscara e destacou que "45% dos óbitos registrados são de pessoas sem comorbidade alguma". "Por que nos arriscarmos em aglomerações?", questionou o governador.

Coronel Marcos Rocha prossegue alinhado com Bolsonaro, e no último domingo (21) fez uma postagem em referência ao aniversário do presidente. Bolsonaro celebrou seu aniversário em Brasília, no Palácio da Alvorada, com a presença de apoiadores.

Já o governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), outro aliado de Bolsonaro, instituiu no estado um toque de recolher que restringe a circulação de pessoas entre as 20h e 5h. O presidente é um crítico desse tipo de medida.

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Governadores de esquerda e Bolsonaro costumam trocar farpas

Governadores pertencentes a partidos de oposição – como Camilo Santana (PT-CE), Flávio Dino (PCdoB-MA) e Paulo Câmara (PSB-PE) – não apenas implantam políticas em desacordo com o presidente como também trocam farpas públicas com Bolsonaro.

Santana e o presidente da República trocaram críticas mútuas em fevereiro, quando Bolsonaro visitou o Ceará. O presidente contestou as medidas de fechamento do comércio e disse que governadores que restringem atividades deveriam custear o auxílio emergencial; o petista rebateu declarando que “aqueles que debocham da ciência, ignoram a luta dos profissionais de saúde para salvar vidas, e, principalmente, desrespeitam a dor das milhares de famílias vítimas da Covid, receberão o justo julgamento”.

Governadores de centro também adotam medidas restritivas

Já entre integrantes de siglas de centro ou até entre partidos com maior proximidade com o governo – como PSDB, DEM e MDB – o posicionamento não é sempre de conflito aberto, mas de implantação de medidas que vão em desacordo com o defendido por Bolsonaro.

É o que ocorre, por exemplo, no Tocantins, onde o governador Mauro Carlesse (DEM) e a prefeita de Palmas, Cinthia Ribeiro (PSDB), têm promovido medidas restritivas, como um "megaferiado" para inibir a circulação de pessoas.

Vizinho do Tocantins, o Mato Grosso também é governado pelo DEM, com Mauro Mendes, e igualmente registra ações de fechamento do comércio – além de toque de recolher, o estado deve adotar uma antecipação de feriados.

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O PSDB é o partido dos governadores João Doria (SP) e Eduardo Leite (RS), dois dos mais criticados na atualidade por Bolsonaro e seus apoiadores. O paulista se tornou um dos principais adversários do presidente pouco após a posse de ambos, em janeiro de 2019, e a rivalidade se acentuou ao longo da pandemia. Já Leite se tornou alvo de Bolsonaro e dos bolsonaristas justamente por promover medidas restritivas no estado.

Leite, o governador da Bahia, Rui Costa (PT), e o do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), foram os objetos de uma ação movida por Bolsonaro na semana passada, em que o presidente contestou, justamente, as ações de restrição de circulação. O chefe do Executivo chegou a dizer que os governadores estariam promovendo "estado de sítio". Nesta terça-feira (23), o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), rejeitou a ação de Bolsonaro.

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Prefeitos de parte das capitais têm mais proximidade com Bolsonaro

Já nas capitais brasileiras, ao menos parte das medidas defendidas por Bolsonaro têm mais adesão dentre os prefeitos – embora eles façam isso sem deixar de lado a adoção de algumas medidas restritivas.

É o caso do prefeito de Natal, Alvaro Dias (PSDB). Ele, que é do mesmo partido de Doria e Leite, é um entusiasta da cloroquina e da ivermectina. Seu apoio aos medicamentos chegou a render a ele uma investigação do Ministério Público, que está em curso. O prefeito, que é médico, alega que continuará com o "kit tratamento precoce" até que a vacinação esteja massificada.

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Outro prefeito que adotou posicionamento parecido foi o de Rio Branco, Tião Bocalom (PP). Em uma audiência recente na Câmara de Vereadores da cidade, ele disse que toma ivermectina e cloroquina de modo preventivo há mais de um ano. E afirmou que o governador do Acre, Gladson Cameli (PP), também faz uso dos medicamentos. Em nota oficial, Cameli não confirmou nem desmentiu Bocalom.

Já o prefeito de Teresina, Doutor Pessoa (MDB), é um opositor das medidas de restrição do comércio e da circulação de pessoas. Ele tem entrado em conflitos constantes com o governador do Piauí, Wellington Dias (PT) – que é o coordenador nacional do fórum de governadores voltado para a vacinação.

A defesa pública do "tratamento precoce" é uma política de poucos prefeitos e governadores, mas isso não significa que os demais rejeitam o uso de cloroquina e ivermectina. Grande parte deles adota o discurso de que a decisão sobre os medicamentos deve ser tomada por médico e paciente, sem que seja transformada em política de saúde pública.

A abordagem não é apenas de políticos de centro ou direita. Mesmo administradores mais distantes do governo, como o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), e prefeito de Campo Grande, Marquinhos Trad (PSD), se posicionaram nesse sentido.

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