O Ministério da Saúde sob a gestão da ministra Nísia Trindade assinou dois contratos com uma empresa de táxi aéreo investigada pela Polícia Federal e Ministério Público Federal (MPF) por envolvimento em garimpo ilegal em terras indígenas da Amazônia. A Piquiatuba Táxi Aéreo foi contratada pelo governo por R$ 14,4 milhões para servir aos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) de Tapajós e Kaiapó Redenção, além de ter outros dois renovados para os distritos Amapá/Norte do Pará e Guamá-Tocantins no valor de R$ 9,3 milhões.
De acordo com a apuração publicada pelo jornal Estadão nesta segunda (11), a empresa é sediada em Santarém (PA) e suspeita de auxiliar um garimpo dentro da Reserva Biológica Maicuru, no mesmo estado, respondendo a uma ação penal e a uma civil pública, além de ter sido apontada em relatórios da Controladoria-Geral da União (CGU) por irregularidades em licitações e execução de contratos.
A Gazeta do Povo procurou o Ministério da Saúde e a Piquiatuba Táxi Aéreo para explicar os contratos. Os dados dos contratos foram confirmados pela reportagem junto ao Portal da Transparência (veja aqui).
O ministério afirmou à reportagem que não pactua com ações de garimpo ilegal e que "aplicará rigorosamente a legislação cabível no sentido de suspender imediatamente quaisquer relações com empresas comprovadamente envolvidas com atividades ilegais".
"A pasta acompanha com atenção, junto aos órgãos competentes, a conclusão dos inquéritos conduzidos e está à disposição para colaborar com os órgãos de controle e autoridades judiciais. Conforme a legislação brasileira, empresas só podem ser excluídas de processos licitatórios quando é identificado registro de irregularidade grave nas bases da Justiça ou da Receita Federal", escreveu.
Já a Piquituba Táxi Aéreo ainda não se pronunciou.
Os contratos firmados com os DSEIs de Tapajós e Kaiapó Redenção têm como objetivo o serviço de fretamento de aeronaves para atendimento em comunidades indígenas. Já entre os renovados, a apuração aponta que a CGU encontrou irregularidades no contrato relativo ao DSEI Guamá-Tocantins, com um prejuízo estimado em R$ 790 mil.
Ainda segundo a apuração, a Piquiatuba teria usado os aviões para auxiliar as atividades de uma área conhecida como Garimpo do Limão em cerca de 200 voos entre os anos de 2015 e 2018. A empresa foi denunciada pelo MPF em 2021.
“Fora identificada uma ampla gama de danos à unidade de conservação, que vão desde o emprego absolutamente inadequado de substâncias tóxicas à saúde e altamente poluentes ao meio ambiente – no caso, mercúrio e cianeto –, ao revolvimento do solo e supressão vegetal, todos estes danos diretamente relacionados à atuação dos denunciados”, diz o MPF na denúncia em que a Procuradoria-Geral da República (PGR) pede a condenação e uma multa de R$ 395,4 milhões por venda ilegal de ouro, danos ambientais e danos coletivos aos povos indígenas da terra Paru D'Este.
O fundador da empresa, Armando Amâncio da Silva, teria vendido e esquentado em torno de R$ 13,4 milhões em ouro ilegal, segundo relata o Estadão com base em relatos de investigadores. Ele é pai dos atuais sócios da Piquiatuba, Edson Barros da Silva e Patrick Paiva da Silva.
Além da atual relação com o Ministério da Saúde, a Piquiatuba também foi apontada pela CGU por favorecimento em uma licitação feita em 2019 pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) para atendimento na região da Terra Indígena Yanomami. A investigação conduzida pela Polícia Federal aponta que a empresa foi escolhida antes mesmo da elaboração do projeto básico.
A relação com o governo federal vem antes ainda, desde o último ano da segunda gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o transporte de indígenas do DSEI Rio Tapajós/Core-PA (veja aqui). Na época, a Piquiatuba disputou a licitação com outras quatro empresas, e levou o contrato inicialmente orçado em R$ 1,4 milhão com duração de um ano.
À Gazeta do Povo, o ministério afirmou, ainda, que o fretamento de aeronaves "é de fundamental importância para a condução das ações de atenção à saúde dos povos indígenas, já em que várias aldeias o acesso é realizado apenas por via aérea".
"Sem esses serviços, os profissionais de saúde que prestam assistência aos indígenas ficam impossibilitados de acessar as aldeias nos territórios, além de resgates para remoção de indígenas que precisam de atendimento especializado. A contratação desses serviços segue o rito legal e os procedimentos administrativos regulares, e o Ministério adotará as medidas cabíveis assim que tomar conhecimento das decisões judiciais", completou.
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