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Governo Lula pode demarcar 23 terras indígenas em 2024
Governo Lula pode demarcar 23 terras indígenas em 2024.| Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Em 2024, mais 23 terras indígenas podem ser demarcadas no Brasil. O Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) analisa os processos e pode dar o aval para a homologação de áreas em dez estados (confira a lista no final da matéria). Sete desses processos são de terras indígenas que estão localizadas no estado de São Paulo. Logo após, estão os estados da Bahia e do Pará que têm quatro e três processos, respectivamente.

Somadas, as áreas que podem ser demarcadas como terras indígenas totalizam mais de 1,7 milhão de hectares e devem abrigar cerca de 25 mil indígenas, de acordo com dados do Instituto Socioambiental (Isa). A área é dez vezes maior do que a cidade de São Paulo onde vivem aproximadamente 12 milhões de pessoas, ou três vezes o tamanho do Distrito Federal, que tem 3 milhões de habitantes.

O Brasil já possui 117.537.905 hectares demarcados em 477 terras indígenas já regularizadas. Dados do Censo 2023, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontam que Brasil tem hoje 1.652.876 indígenas. Sendo assim, cada indígena brasileiro, em média, tem direito a uma área equivalente a 99 campos de futebol com as demarcações atuais de terras indígenas.

A etapa do processo de demarcação que compete ao Ministério da Justiça, que passará a ser comandado pelo ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski a partir desta quinta (1º), é quando ocorre a declaração dos limites das terras indígenas. Antes disso, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) já elaborou estudos de identificação e delimitação e a etapa que prevê a possibilidade de contraditórios administrativos serem apresentados também já foi superada.

Após a decisão do Ministério da Justiça sobre as áreas, a demarcação física, a cargo da Funai, já pode ser iniciada. Com a demarcação física concluída, que ocorre por meio da colocação de placas indicando os limites da terra, são feitos levantamentos fundiários para identificação de benfeitorias de não indígenas que possam estar vivendo nas áreas. Por fim, a demarcação é homologada por meio de decreto assinado pelo presidente da República.

Os processos, no entanto, devem encontrar entraves, já que a lei do marco temporal para demarcação de terras indígenas, promulgada após uma longa batalha entre o Congresso e o Executivo, determinou que deve haver indenizações prévias aos proprietários de áreas que forem destinadas a terras indígenas.

Além disso, decisões recentes do STF no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1017365, que tratava do marco temporal, e na decisão do ministro Edson Fachin no caso da Terra Indígena Tekoha Guasu Guavira, em Guaíra, no Paraná, devem mobilizar a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) em busca de ações que garantam o direito de propriedade dos agricultores.

“É mais um ataque frontal ao direito de propriedade. Demarcações com laudos antropológicos fajutos, já questionados, e que, agora, ficam com seus processos suspensos pela decisão do ministro Fachin. Insistimos que a lei é válida e precisa ser cumprida, e trabalharemos para que assim seja feito”, afirmou o presidente da FPA, deputado Pedro Lupion (PP-PR) durante audiência pública realizada em Guaíra.

Bancada do agro deve se mobilizar contra demarcações 

A possibilidade de demarcação de 23 terras indígenas em 2024 deve mobilizar ações da bancada do agro no Congresso Nacional. Embora os processos tenham avançado, a FPA afirma que a lei do marco temporal, Lei 14.701/2023, é válida e deve ser respeitada. A lei, no entanto, está sendo questionada no STF. Partidos de esquerda e associações indígenas apresentaram ações para torná-la inconstitucional. Ao mesmo tempo, a bancada do agro, por meio de partidos de oposição, apresentou uma ação para garantir a constitucionalidade da lei. 

Além disso, entraves como o gerado após conflitos entre indígenas e produtores rurais em Guaíra, no Paraná, também podem intensificar a necessidade de ação da bancada do agro. Na região, indígenas reivindicam a demarcação de 24 mil hectares. Desde setembro, quando indígenas invadiram uma fazenda, confrontos com os agricultores da região acabaram com pessoas feridas. A Força Nacional chegou a ser acionada depois que um agricultor foi feito de refém pelos indígenas. A decisão do ministro Fachin, no caso do Paraná, suspendeu decisões anteriores que impediam a demarcação da terra indígena.

O fato preocupou a bancada do agro. “O Congresso, ao regulamentar a demarcação, buscou equilibrar os direitos de todas as partes envolvidas. A Lei 14.701/2023, em seu artigo 9º, assegura o pleno exercício dos direitos sobre a terra pelos não índios até o término do procedimento administrativo, algo ignorado pela decisão do ministro Fachin. Assim, a manifestação judicial parece desconsiderar a própria lei e minimiza as decisões das instâncias inferiores, priorizando a visão pessoal do ministro em Brasília em detrimento dos magistrados locais que têm conhecimento direto da situação.”, pontuou a FPA em nota.

As ações judiciais contra as demarcações podem se somar a ações legislativas. Caso as demarcações nos estados da Bahia, Pará, São Paulo, Paraná, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Maranhão, Alagoas e Rio Grande do Sul (confira a lista abaixo) tenham andamento no Ministério da Justiça e sejam publicadas por meio de portarias, os parlamentares podem apresentar projetos de decreto legislativos para sustar a decisão. Após apresentados, os projetos precisam passa pela análise da Câmara e do Senado.

Lewandowski deve seguir orientação de Lula para “demarcar o maior número de terras possível” 

No início de seu terceiro mandato, Lula propôs que a atribuição sobre a delimitação das terras indígenas ficasse a cargo do recém criado Ministério dos Povos Indígenas, comandado pela indígena Sonia Guajajara. O Congresso, no entanto, foi contrário e manteve a atribuição vinculada ao Ministério da Justiça.

As demarcações que aguardam despachos na pasta devem fazer parte das primeiras ações do novo ministro, Ricardo Lewandowski, que será empossado em fevereiro. Ao indicar Flávio Dino para o cargo de ministro do STF, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), escolheu Lewandowski para o cargo que Dino ocupava. Tendo em vista os posicionamentos de Lewandowski enquanto ministro do STF, a tendência é de que as demarcações tenham andamento.

Embora Lewandowski não tenha participado do julgamento do Recurso Extraordinário que derrubou a tese do marco temporal, votos e decisões anteriores do ex-ministro indicam que a promessa de Lula de “demarcar o maior número de terra indígenas possível” pode se confirmar.

Um dos julgamentos relacionados a questão indígena dos quais Lewandowski participou foi o do caso da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Na oportunidade, o então ministro do STF votou pela constitucionalidade dessa demarcação em área contínua. Durante o julgamento, Lewandowski defendeu a tese de que os não indígenas que ocupavam as terras não tinham amparo legal para reivindicar o direito de posse nem mesmo indenização da União. “Não podem as terras indígenas serem de posse legítima por quem quer que seja, a não ser dos índios”, afirmou o então ministro do STF durante o julgamento realizado em 2008.

Lula reafirmou a promessa de campanha para demarcar o máximo de terras indígenas possível em abril de 2023, durante evento que reuniu cerca de seis mil indígenas em Brasília, ao assinar a homologação de seis, das oito terras indígenas demarcadas no ano passado. A promessa, no entanto, era de que 14 terras indígenas seriam demarcadas durante 2023.

A tese do marco temporal, que prevê a data de 5 de outubro de 1988 como limite para que indígenas reivindiquem as áreas que ocupavam até então, foi derrubada pelo STF, mas retomada por meio de uma lei aprovada no Congresso Nacional. Embora o presidente Lula tenha vetado mais de 30 partes do projeto, o Congresso derrubou a maior parte dos trechos vetados e a lei acabou sendo promulgada e está em vigor.

Confira a lista com as 23 terras indígenas que estão em processo no Ministério da Justiça: 

  • 1- TI Barra Velha do Monte Pascoal (BA), municípios de Itamaraju, Porto Seguro e Prado - 44 mil hectares
  • 2- TI Tupinambá de Olivença (BA), municípios de Ilhéus, Buerarema e Uma/BA -47 mil hectares
  • 3- TI Tupinambá de Belmonte (BA), município de Belmonte - 10 mil hectares
  • 4- TI Sawré Muybu (PA), municípios de Itaituba e Trairã - 178 mil hectares
  • 5- TI Sambaqui (PR), município de Pontal do Paraná - 3 mil hectares
  • 6- TI Djaiko-aty (SP), município de Miracatu - 1 mil hectares
  • 7- TI Amba Porã (SP), município de Miracatu - 7 mil hectares
  • 8- TI Ka'aguy Mirim (SP), município de Miracatu e Pedro Toledo/SP - 1 mil hectares
  • 9- TI Peguaoty (SP), município de Sete Barras - 6 mil hectares
  • 10- TI Pindoty - Araça-Mirim (SP), município de Cananéia - 1 mil hectares
  • 11- TI Tapy'i/Rio Branquinho (SP), Município de Cananéia - 1 mil hectares
  • 12- TI Boa Vista do Sertão do Promirim (SP), município de Ubatuba - 5 mil hectares
  • 13- TI Cobra Grande (PA), município de Santarém - 9 mil hectares
  • 14- TI Xakriabá (MG), municípios de São João das Missões, Itacarambi e Cônego Marinho - 46 mil hectares
  • 15- TI Ypoi Triunfo (MS), município de Paranhos, Estado do Mato Grosso do Sul - 20 mil hectares
  • 16- TI Pontal dos ApiaKas e Isolados (MT), município de Apiakás - 982 mil hectares
  • 17- TI Kanela Memortumré (MA), municípios de Barra do Corda e Fernando Falcão - 100 mil hectares
  • 18- TI Wassú-Cocal (AL), municípios de Joaquim Gomes, Colônia Leopoldina, Matriz de Camaragibee Novo Lino - 3 mil hectares
  • 19- TI Paukalirajausu (MT), municípios de Nova Lacerda e Vila Bela da Santíssima Trindade - 8 mil hectares
  • 20- TI Maró (PA), município de Santarém - 42 mil hectares
  • 21- TI Votouro/Kandóia (RS), municípios de Faxinalzinho e Benjamin Constant do Sul - 6 mil hectares
  • 22- TI Menkü (MS), município de Brasnorte - 146 mil hectares
  • 23- TI Tumbalalá, municípios de Abaré e Curaçá/BA - 45 mil hectares
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