O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, deu início a uma operação para tentar contornar a crise do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com o agronegócio. A gestão petista já vinha enfrentando resistências por parte do setor, mas o desgaste ficou acentuado nos últimos dias, depois que ministros ameaçaram cortar o patrocínio do Banco do Brasil à Agrishow, maior feira agrícola da América Latina.
A Agrishow teve início nesta segunda-feira (1º) e segue até a próxima sexta-feira (5), na cidade de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo. Tradicionalmente, o ministro da Agricultura sempre participa da abertura do evento, mas Fávaro cancelou sua ida depois que os organizadores convidaram o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Com a ausência do governo Lula na abertura do evento, a participação e o discurso do ex-presidente acenderam um alerta em integrantes do Palácio do Planalto. Cercado de apoiadores e do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), Bolsonaro defendeu que o "agro precisa de políticos que não atrapalhem".
Após a repercussão da participação de Bolsonaro, Fávaro se movimentou no intuito de reduzir os desgastes de Lula com o setor. Nesta terça-feira (2), o ministro da Agricultura se reuniu com a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) para estabelecer uma ponte com os representantes do agronegócio. O encontro, que durou cerca de quatro horas, foi o primeiro de Fávaro com essa bancada desde o início do governo Lula.
Ao final do encontro, Fávaro negou que o governo federal tenha promovido cortes ao setor e defendeu a ampliação de recursos. O ministro citou, por exemplo, a liberação da linha de crédito em dólar com taxa fixa feita pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
"Não há, em hipótese alguma, nenhuma retirada de investimento. Ao contrário, os R$ 2 bilhões [da linha de crédito em dólar] já foram tomados e agora vamos providenciar mais recursos. Já estamos providenciando mais recursos, para que possamos incentivar o crescimento da agropecuária", defendeu Fávaro.
O presidente da FPA, deputado Pedro Lupion (PP-PR), afirmou que a visita de Fávaro mostrou a "boa vontade" do ministro em estabelecer uma ponte com o setor do agronegócio. "Nós deixamos as fofocas e intrigas pro lado de lá. O que nós queríamos era poder discutir temas importantes para o agro e nessa reunião falamos de diversos setores, desde a borracha ao leite. Ou seja, temas específicos de diversos setores", afirmou Lupion.
Ainda de acordo com o deputado paranaense, o ministro se comprometeu em ser o "bunker" do setor junto ao governo Lula. "Eu ouvi do ministro com todas as letras, publicamente pelo microfone, que as pautas da FPA serão apoiadas e defendidas pelo seu ministério. Isso é efetivamente o que nós precisamos, de ter o ministério da Agricultura como nosso "bunker" dentro do governo", completou Lupion.
Apesar dos acenos do ministro, o presidente da FPA ressaltou que, até aqui, a gestão petista não demonstrou apreço pelo agronegócio. "Nosso objetivo é fortalecer o ministério da Agricultura. Durante todos os governos do PT tivemos ministros alinhados com a FPA. Mas esse governo tem demonstrado desde o começo um sentimento muito ruim em relação à agropecuária", disse Lupion.
"É óbvio que a gente fica extremamente preocupado. Estamos no mês de maio, mas foram cinco meses intensos de defesa do nosso setor contra os ataques constantes. A gente tem que justamente trabalhar nessa construção de pontes para estancar essa sangria contra a agropecuária brasileira, que infelizmente o governo não tem demonstrado qualquer apreço ao nosso setor", completou o presidente da FPA.
Patrocínio mantido à Agrishow e possíveis anúncios ao setor
Após a desistência de Fávaro de ir à Agrishow, ministros do governo Lula chegaram a defender publicamente que o Banco do Brasil cortasse o patrocínio ao evento. Além da ausência do ministro, a presidente do Banco do Brasil, Tarciana Medeiros, também cancelou sua participação em uma palestra da programação.
"Descortesia e mudança de caráter de um evento institucional de promoção do agronegócio para um evento de características políticas e ideológicas. Ou é uma feira de negócios plural e apartidária ou não pode ter patrocínio público", defendeu o ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Paulo Pimenta.
Apesar disso, o Banco do Brasil informou que manteve sua estrutura na Agrishow por meio de sua atuação comercial para realização de negócios e atendimento aos seus clientes. Há um stand do banco e várias bandeiras e anúncios espalhados pelo local da feira. E dezenas de funcionários da instituição federal seguem trabalhando junto aos produtores. O BB afirmou que a expectativa é de gerar R$ 1,5 bilhão em negócios ao longo de todo o evento.
O Banco do Brasil é uma das principais fomentadores do agronegócio no país e na última safra 2022/2023 liberou R$ 154 bilhões em crédito para o setor.
Para tentar mitigar os efeitos da crise com o agro, uma das opções ventiladas pelo governo petista é o de apoiar, por exemplo, a volta da Companhia Nacional de Abastecimento para a pasta de Fávaro. (Leia mais abaixo.)
Além disso, Lula pretende anunciar nas próximas semanas o valor de crédito para financiamento do Plano Safra. O montante ainda não foi anunciado, mas o petista pretende turbinar a linha de crédito como forma de aceno ao agronegócio.
"O presidente Lula vive me falando: 'Fávaro, me traz o agro aqui para uma reunião, eu quero saber o que preciso fazer para estar mais próximo dele'. Não me faltará respaldo político do presidente Lula, ele respeita muito o agro", disse Fávaro durante o encontro de ex-ministros da Agricultura promovido na semana passada, em Brasília.
Ministro compara invasões do MST ao atos de 8 de janeiro; movimento terá vaga no "Conselhão"
Em uma nova tentativa de aceno ao setor, Fávaro usou o encontro da FPA para criticar as invasões de terras feitas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). De acordo com o ministro da Agricultura, as ações do movimento podem ser comparadas aos atos de vandalismo do 08 de janeiro em Brasília.
"O direito por um pedaço de terra é legítimo, um plano nacional de reforma agrária é legítimo dentro do rigor da lei. Tudo o que transpassa o rigor, não te meu apoio. Considero invasão de terra produtiva tão danosa quanto à invasão do Congresso Nacional”, declarou Fávaro.
Apesar disso, o MST segue ganhando mais espaço na gestão petista e fará parte do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República, o chamado “Conselhão”, a convite de Lula. A informação foi divulgada pelo ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, em suas redes sociais, na tarde deste sábado (29). O conselho assessora o presidente da República na formulação de políticas públicas. O convite foi aceito pelas lideranças dos sem-terra.
O governo federal é alvo de críticas por sua proximidade com o MST. As críticas partem especialmente de representantes do agronegócio, que condenam as recentes invasões de propriedades rurais promovidas pelo movimento por todo o país. Essas ações podem ser alvo da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do MST.
Conab é alvo de disputa entre ministérios do governo Lula
Fávaro tem defendido que "não existe Ministério da Agricultura sem Conab [Companhia Nacional de Abastecimento]". Atualmente, a Conab está vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e é alvo de uma intensa disputa interna no governo Lula.
O assunto deverá ser resolvido pelo Parlamento durante a votação da Medida Provisória 1.154/2023, que reestruturou a Esplanada dos Ministérios. Fávaro pediu apoio da bancada do agro no Congresso, para que a estatal retorne ao Ministério da Agricultura.
"O que é fundamental e falo com muita transparência é que não existe Mapa [Ministério da Agricultura] sem Conab, sem apoio à política pública de comercialização", afirmou aos parlamentares e representantes de entidades do agronegócio.
Fávaro disse que não está "conspirando contra o governo" e que a sua posição é muito clara sobre a importância de a companhia de abastecimento estar vinculada ao seu ministério.
Além da Agrishow, governo Lula esteve ausente em outras feiras do agro
Após o encontro de Fávaro com a FPA, o ministro da Agricultura se reuniu com o presidente Lula no Palácio do Planalto para apresentar um balanço sobre a crise com o agro. O petista ampliou nas últimas semanas as cobranças sobre o chefe da pasta por uma maior aproximação com o setor.
Além da ausência na Agrishow, nenhum representante do governo federal esteve presente no principal evento do agro no Centro-Oeste, em Rio Verde (GO), em março, quando foram vendidos mais de R$ 11 bilhões em máquinas e implementos agrícolas.
O governo petista também esteve ausente na abertura da Expozebu, em Uberaba, no Triângulo Mineiro, neste sábado (29), na maior feira de gado zebu do mundo, que prevê movimentar R$ 350 milhões em negócios até o dia 7.
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