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Censura ao X

Governo Lula transforma suspensão do X em briga contra “vilão estrangeiro” 

Lula Elon Musk banimento X censura Juscelino Filho
Presidente Lula e o ministro das Comunicações, Juscelino Filho (Foto: Foto: Ricardo Stuckert / PR)

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O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem buscado emplacar o discurso de que as decisões do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), contra o X e a Starlink são uma disputa entre o Brasil e um inimigo estrangeiro. Puxadas pelo petista, as falas de aliados do Palácio do Planalto, desde então, colocam o empresário Elon Musk como uma ameaça, que busca acabar com a soberania nacional e não como uma figura pública que tenta debater a liberdade de expressão internacionalmente.

Além da suspensão do X, o ministro Alexandre de Moraes determinou o bloqueio das contas da Starlink no Brasil para o pagamento de multas e ameaçou multar em R$ 50 mil qualquer brasileiro que acessar a rede social usando VPN (rede privada virtual de internet).

A busca pela narrativa da soberania nacional começou a ser gestada no Palácio do Planalto ainda no começo desta semana, quando o presidente Lula abordou publicamente o fato de Elon Musk questionar a decisão judicial de Alexandre de Moraes. Na ocasião, o petista afirmou que a suspensão do X era um recado para a comunidade internacional. 

"A Justiça brasileira pode ter dado um importante sinal de que o mundo não é obrigado a aguentar o vale tudo de extrema-direita do Elon Musk só porque ele é rico", disse Lula em entrevista à CNN Brasil

Nem o jornal americano Washington Post, crítico conhecido de Musk, deu a razão a Lula e classificou em editorial sua fala de demagógica e não democrática.

Segundo o analista político Fidelis Fantin, especialista em coordenação e tramitação de leis no Congresso, Lula tenta desqualificar Musk, possivelmente, porque a figura do empresário é associada ao apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). "Quando você discute a pessoa e não o assunto, é sinal de que você não tem argumentos para discutir. Musk é rico e estrangeiro, então, por isso ele está errado? Por ser rico e estrangeiro?"

"Ele [Musk] me parece ser bem inteligente para ter chegado onde chegou e criar as empresas que criou, mas o que deve ser discutido é que, pelo que ele está falando, esse processo contra o X não foi feito adequadamente. Ele diz que tudo correu de forma secreta e informal no STF, quando na verdade tudo tinha que constar no processo judicial", afirmou Fantin.

Desde que comprou o X, em 2022, Musk vem revelando como países tentaram censurar perfis na rede social. Ele vazou conversas entre membros do STF com funcionários do então Twitter, as quais mostram que Moraes mandava censurar perfis aparentemente sem a devida fundamentação jurídica em prazos muito curtos. Segundo o X, os pedidos visavam perseguir desafetos políticos de Moraes.

Ministros fazem coro com Lula contra empresário Elon Musk

Assim como Lula e o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, o chefe da Casa Civil, ministro Rui Costa, também entrou em campo para alegar que Elon Musk queria tratar o Brasil como uma "republiqueta".

"Não é porque alguém é muito rico que pode se dar ao luxo de desobedecer às instituições e aos ordenamentos jurídicos de um país. Não vejo as mesmas bravatas desse empresário em relação à Índia ou à China, em relação a outros países onde eles atuam", disse Costa à Globo News.

Musk e o X afirmam que não estão descumprindo as leis brasileiras. Para eles, seguir as decisões de Moraes é que significaria desobedecer a legislação do Brasil.

Ainda dentro do Palácio do Planalto, o ministro Alexandre Padilha, das Relações Institucionais, afirmou que o Brasil não é terra sem lei. “Tenho certeza absoluta de que ele [Musk] só pode operar em outros países cumprindo a lei dos países. O Brasil não é uma terra sem lei. Quer ter atividade empresarial no país, cumpra as leis brasileiras”, disse.

Segundo o analista Juan Gonçalves Arruda, CEO do think thank Ranking dos Políticos, Lula e o PT pensam sempre no ponto de vista do partido e não nos interesses do Estado ao lidar com relações internacionais, tanto com governos como com empresas e indivíduos. "Nesse caso, Lula e os seus aliados querem ajudar o Supremo a qualquer custo", afirmou.

Com dificuldades para aprovar pautas de seu interesse no Congresso, o Executivo tem recorrido ao apoio dos ministros do STF para aumentar seu poder, impor pautas e derrubar decisões tomadas pelos parlamentares. Segundo analistas, o caso mais recente foi a decisão do Supremo de suspender as emendas parlamentares para ajudar o Executivo a tentar retomar o controle sobre o Orçamento. Mas houve muitos casos, como o marco temporal das demarcações de terras indígenas e a desoneração da folha de pagamentos.

Segundo Arruda, além disso, a escolha de um "inimigo externo" como Musk também ajuda Lula a desviar a atenção do público dos problemas do Brasil e de sua gestão.

Maioria dos brasileiros discorda do bloqueio ao X

Uma pesquisa de opinião realizada pelo instituto Atlas Intel, publicada na quinta-feira (5), mostrou que 50,9% dos brasileiro discordam do ato de bloquear o X, enquanto 48,1% concordam com a medida.

O levantamento também abordou o bloqueio das contas da Starlink, outra empresa de Elon Musk, relacionada à operação de internet via satélite. Mais da metade dos brasileiros (55,1%) considera a decisão como um abuso de poder, enquanto 44% a veem como uma medida justificável, especialmente no contexto das multas aplicadas pelo STF ao X.

Já 52,3% acreditam que o país terá mais a perder do que ganhar caso as duas empresas de Musk parem de operar no Brasil; 43,1% discordam, enquanto 4,5% não souberam responder. Os dados foram coletados entre 3 e 4 de setembro, a margem de erro é de 2 pontos porcentuais e o nível de confiança de 95%.

A Atlas Intel ouviu 1.617 pessoas entre os dias 3 e 4 de setembro, nas cinco regiões do país. A margem de erro da pesquisa é de dois pontos percentuais para mais ou para menos, com um nível de confiança de 95%

Ministro das Comunicações ameaça cassar licença da Starlink, mas não explica como substituiria o serviço

O ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União-MA), foi outro aliado de Lula que repetiu as críticas a Musk. "Temos soberania, temos democracia, temos os poderes, legislação, Constituição que é obedecida por todos. E não é um sujeito por maior poderio econômico, não é um ricaço de fora do país que vai vir querer afrontar o brasil dessa forma e não vamos admitir isso jamais", disse ele no programa do governo federal "Bom dia, ministro", da agência de notícias estatal, na quarta-feira (4).

O ministro também disse que Musk merece repulsa e ameaçou cassar a concessão de prestação de serviço das empresas de Musk no Brasil.

Inicialmente, a provedora de internet via satélite de Musk, Starlink, havia dito à Anatel que não iria tirar o X do ar, mas voltou atrás na terça-feira (3). No comunicado, a empresa chamou a decisão de Moraes que foi confirmada pela Primeira Turma do STF de "ilegal", mas disse que daria cumprimento à determinação e pedirá à Corte o desbloqueio de seus bens.

Questionado sobre a eventual suspensão da operação da Starlink no Brasil, Juscelino Filho disse que o governo Lua sabe “da importância dessa provedora satelital para a região da Amazônia, como várias outras”. Porém, ponderou que a empresa de Elon Musk é contratada, majoritariamente, para uso pessoal, e que a contratação institucional, como para uso em escolas e órgãos públicos, “é mínima”. 

“A gente sabe que alguns milhares de brasileiros usam esse serviço, mas, naturalmente, a gente não pode pôr isso à frente do respeito ao Brasil, da soberania nacional e das decisões judiciais que têm que ser cumpridas”, disse.

O ministro disse ainda que a Telebras poderia substituir a Starlink em áreas remotas do país, mas não explicou como a estatal conseguiria fazer isso. Atualmente, a conexão de internet em áreas como a selva amazônica em paralelo a Starlink depende de cabos instalados pelo Exército que não atendem toda a região.

A Starlink recebeu sinal verde da Anatel para operar no Brasil em 2022, durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. A concessão vai até 2027. Atualmente, existem 224,5 mil clientes da empresa em território nacional e cerca de um terço deles estão no norte do país. Órgãos públicos, como as Forças Armadas e tribunais eleitorais, têm contratos com a companhia.

Em abril deste ano, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom) desmentiu informações veiculadas de que o ministro da pasta, Paulo Pimenta, teria falado em rever contratos do governo federal com a Starlink. Segundo informações do jornal O Estado de S. Paulo, um procurador do Ministério Público de Contas teria pedido ao Tribunal de Contas da União (TCU) a suspensão. A representação teria afirmado que os vínculos deveriam ser desfeitos por causa de “afronta à soberania nacional” por parte de Musk, após críticas do bilionário sul-africano ao STF e ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Governo pode tentar usar caso do X para regular outras redes sociais

Em outra frente, outra ala do governo busca usar o caso envolvendo o bloqueio ao X para tentar retomar a discussão sobre a regulação das redes. O Palácio do Planalto chegou a tentar por diversas vezes avançar com o projeto de lei apelidado de PL da Censura, mas recuou diante da ofensiva da oposição. 

Recentemente, a Justiça Eleitoral baixou uma resolução onde determina que as empresas devem identificar e remover conteúdos “notoriamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral”. 

Agora, integrantes do Planalto admitem que o debate poderia ser usado para discutir uma nova proposta de regulação das redes. Além disso, o governo pretende propor a taxação das Big Techs, as multinacionais de tecnologia que operam redes sociais, ainda neste semestre. “Há maturidade desse processo no mundo que a gente precisa trazer para o Brasil”, disse o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan.

Em entrevista à Gazeta do Povo, em 2023, o advogado Giuliano Miotto, presidente do Instituto Liberdade e Justiça, já destacava que os discursos do atual governo estavam alinhados ao de membros de outros poderes no sentido de aumentar o controle prévio e abusivo sobre a opinião pública e sobre a imprensa. "Isso tem o óbvio objetivo de blindar essa classe política de críticas ou questionamentos. Tudo indica que virão tempos sombrios para a liberdade de expressão", avaliou à época.

Segundo as primeiras estimativas da equipe econômica, a taxação das big techs deve render cerca de R$ 5 bilhões anuais ao governo federal. Uma das opções seria o aumento da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), o mesmo tributo cobrado dos combustíveis, mas Durigan não respondeu sobre essa possibilidade.

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