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O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) depositou as maiores esperanças na reeleição de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para o Senado. Ele conquistou uma vitória sofrida, que foi compartilhada com o senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), recém-conduzido ao comando da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). No entanto, apesar da lealdade de Pacheco, a maioria governista desejada por Lula no Congresso não está garantida.
A decisão do governo de dar prioridade à relação com o Senado está ampliando obstáculos na Câmara, comandada por Arthur Lira (PP-AL). Hoje é lá que são decididas matérias prioritárias para o governo, como medidas provisórias (MPs) e a reforma tributária.
No momento, há um duelo de forças entre o Senado e a Câmara. A origem dele é uma discussão sobre como o Congresso deve votar as medidas provisórias criadas pelo governo Lula.
No rito em vigor, as medidas provisórias são debatidas e votadas no plenário da Câmara. Depois elas são ou não confirmadas pelo Senado. Porém, em teoria, os senadores não poderiam discutir os textos, fator que vem causando descontentamentos.
Contudo, na prática, medidas provisórias do governo Lula, como a reformulação do Bolsa Família e a criação dos novos ministérios, ainda não estão sendo debatidas no Congresso.
O Planalto quer a adoção de um rito que vigorava antes da pandemia. Nele, os textos das medidas provisórias seriam tratados em comissões mistas, compostas por deputados e senadores. A reportagem apurou que isso é uma investida do governo Lula para retirar poder do presidente da Câmara, Arthur Lira.
No momento, o presidente do Senado, fiel a Lula, está fazendo o jogo do Planalto. Há até o risco de Pacheco levar a questão à análise do Supremo Tribunal Federal (STF). A judicialização do assunto só levaria a mais desgastes e atrasos na apreciação de matérias essenciais ao governo.
O líder governista no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), afirmou que a base de sustentação de Lula na Casa está consolidada com 50 votos. Mas, na prática, esse número reflete apenas a votação para a Presidência do Senado em fevereiro, quando Pacheco foi reeleito por 49. O nível real de apoio pode variar conforme pautas em discussão e o cenário político e econômico e, sobretudo, sofrer influência do perfil dos blocos partidários. As próximas votações de interesse do Planalto podem confirmar isso.
Bloco do centrão tem maioria no Senado
Ou seja, apesar de Pacheco ter sido reeleito presidente, o Senado não está necessariamente nas mãos do Planalto. O maior bloco partidário da Casa é o Democracia, que reúne 30 senadores do MDB, União Brasil, Podemos, PDT, PSDB e Rede. Ele surgiu da articulação que garantiu a reeleição de Pacheco e a definição das comissões temáticas.
O líder do Democracia, Eduardo Braga (MDB-AM), destacou o peso político dessa nova correlação de forças no plenário apontando para a volta de Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) ao comando da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Sem refletir a base partidária do governo Lula, o Democracia superou o Resistência Democrática (PSD, PT e PSB) e o bloco oposicionista Vanguarda (PL, PP, Republicanos e Novo). Ao deixar de fora os partidos do presidente do Senado (PSD) e do presidente da República (PT), o grupo emitiu forte sinal de autonomia.
Com a liderança de Davi Alcolumbre, Eduardo Braga e Renan Calheiros, esses parlamentares poderão funcionar como um centrão, condicionando votações a acordos com o Planalto e ameaçando, inclusive, com rupturas.
Maioria que garantiu vitória a Pacheco se diluiu
Segundo um conselheiro do bloco majoritário ouvido pela Gazeta do Povo sob anonimato, o governo sabe que se encontra com sérias dificuldades não apenas na Câmara, mas também no Senado. Segundo ele, a "maioria virtual", obtida na vitória de Rodrigo Pacheco, já se diluiu. Um indício disso é a formação de blocos no Senado, na qual o MDB, por exemplo, está separado do PT.
Ele disse ver em Jaques Wagner, o líder governista no Senado, a melhor escolha como interlocutor do governo em razão de habilidade e experiência. Porém, o conselheiro disse que Wagner tem poucos recursos para atender às demandas de sua base.
Assim, a conclusão é que o o governo fez uma aposta alta, mas sem ter a certeza de retorno. Um gesto claro de fragilidade e dependência foi a decisão de Lula de dar sobrevida ao ministro Juscelino Filho, do União Brasil, apesar das muitas situações polêmicas e da pressão do PT para afastá-lo.
O ministro é acusado de usar um avião da Força Aérea para viajar e participar de um leilão de cavalos de natureza pessoal, receber diárias de viagem supostamente indevidas (que ele devolveu) e não declarar cavalos de raça para a Receita Federal.
Lula sofreu pressão não só do União Brasil (pois Juscelino Filho é apadrinhado de Alcolumbre), mas também do presidente da Câmara Arthur Lira, para não demitir seu ministro.
As três indicações de ministros do União Brasil foram costuradas por Alcolumbre e a própria bancada da Câmara não se sente contemplada. As indicações foram Juscelino Filho para as Comunicações, Waldez Góes para a Integração Nacional e Daniela do Waguinho para o Turismo.
Contudo, parte dos deputados do União Brasil faz oposição aberta ao governo federal.