O governo estuda como privatizar o serviço postal, prestado pelos Correios, uma das principais estatais na lista para uma possível venda.
Foi autorizada a contratação de pareceres para avaliar a regulação e legislação do setor, as condições de mercado e experiências internacionais e a necessidade de atendimento universal do serviço postal. Os estudos estão sendo feitos pelo BNDES e as conclusões serão avaliadas por um comitê interministerial, formado, entre outros, pelo Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) e pelos ministérios da Economia e da Ciência, Tecnologia e Comunicações.
O grande imbróglio a ser resolvido é o fato de a Constituição prever, no seu artigo 21, que compete somente à União manter a prestação do serviço postal e de correio aéreo nacional. E a Lei N.º 6.538, de 1978, regula como essa prestação do serviço postal será feita: por meio de empresa pública vinculada ao Ministério das Comunicações – no caso, os Correios, que deve seguir uma série de regras contidas na legislação. Por fim, a Lei n.º 12.490, de 2011, moderniza algumas das funções do Correios previstas na lei anterior.
A necessidade de mexer na Constituição para privatizar os Correios
Como o serviço postal está previsto na Constituição, a privatização total dos Correios precisa ser feita por uma proposta de emenda constitucional (PEC), afirmam dois especialistas em telecomunicações consultados pela Gazeta do Povo.
Essa PEC precisaria excluir da Constituição o trecho que prevê a competência exclusiva da União para prestar o serviço postal e de correio aéreo. Também tem de deixar claro que esses serviços podem ser explorados por empresas privadas, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão –como já acontece com aeroportos, portos e ferrovias, por exemplo.
“Os Correios exercem uma função constitucional [o serviço postal]. Para você privatizar, tem que mudar a Constituição. No artigo 21 diz que compete à União o serviço postal. E como a União faz isso? Através dos Correios”, explica Marcos César, vice-presidente da Associação dos Profissionais dos Correios (Adcap). Ele é servidor aposentado dos Correios e já foi membro do conselho de administração da empresa.
Um consultor legislativo da Câmara dos Deputados acrescenta que, na Constituição, não existe nenhuma menção de que o serviço postal e o correio aéreo nacional possam ser feitos por empresa privada, por meio de concessão, autorização ou permissão. “Em tese, é o tipo de atividade que teria que ser feito diretamente pela União”, diz esse consultor, ao falar reservadamente com a Gazeta do Povo.
Mas parte da equipe econômica quer tentar fazer a privatização dos Correios por projeto de lei, modificando apenas as leis 6.538, de 1978, e 12.490, de 2011. Eles querem evitar a necessidade de enviar para o Congresso uma PEC quebrando o monopólio da estatal no serviço postal. As propostas de emenda à Constituição têm tramitação mais longa e precisam ser aprovadas por três quinto dos parlamentares. Outros projetos precisam apenas de maioria simples ou absoluta.
Correios dividido em dois é opção para fugir de PEC
Para evitar uma PEC, dizem os especialistas consultados pela Gazeta do Povo, o governo teria de separar o Correios em duas empresas: uma que continuaria responsável pelo setor postal, correio aéreo nacional e encomendas simples, e outra pelo Sedex, pelo serviço de malote e pelo Banco Postal, que não são previstos na Constituição. Assim, o governo poderia propor a privatização somente da parte dos Correios que cuida do Sedex e do malote, mantendo o resto dos serviços na estatal.
Essa alternativa, contudo, pode não ser viável economicamente, avalia Marcos César, da Associação dos Profissionais dos Correios. Ele diz que o serviço postal não consegue pagar sozinho toda a infraestrutura que os Correios têm para manter o serviço em todo o Brasil. Segundo César, hoje os Correios conseguem bancar o serviço postal sem onerar o consumidor porque agregaram outros serviços que podem ser prestados pela mesma infraestrutura, reduzindo os custos como um todo.
“O correio brasileiro conseguiu uma forma de sucesso aqui quando ele juntou o serviço postal com o serviço de encomendas e com o serviço de banco postal. Você leva não só as cartas, mas leva também as encomendas. Isso é feito junto pelo mesmo carteiro. Em alguns lugares ainda menores, é o mesmo que atende na agência: de manhã ele entrega e à tarde ele fica na agência. Se você separar, como você vai fazer nessas cidades? Não tem como separar isso de forma simples e sem ser oneroso”, explica.
Procurado, o Ministério da Economia informou à Gazeta do Povo que “no atual estágio de avaliação, há cenários possíveis [para privatização dos Correios] tanto em projeto de lei como em proposta de emenda à Constituição”. “Os estudos vão indicar o caminho com maiores chances de sucesso”, diz a nota.
O Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) já autorizou a contratação de estudos por parte do BNDES, que tem até 180 dias para entregar os pareceres ao comitê interministerial.
Uma PEC propondo acabar com a titularidade da União – e consequentemente dos Correios – na prestação do serviço postal chegou a ser protocolada pelo deputado General Peternelli (PSL-SP). Se tivesse sido aprovada, permitiria que o serviço postal pudesse ser prestado por empresas privadas via concessão ou autorização, e deixaria o caminho do governo livre para propor a privatização da estatal por meio de projeto de lei. A PEC, porém, acabou não tramitando, pois teve várias assinaturas retiradas após a sua apresentação.
Marco regulatório
Caso o governo decida fazer a privatização dos Correios por inteiro – ou seja, incluindo o serviço postal –, terá de propor e aprovar uma PEC e também mudar as legislações que tratam da função da estatal. Mas o vice-presidente da Associação dos Profissionais dos Correios (Adcap), Marcos César, diz que, além de tudo isso, o governo precisaria fazer um marco regulatório para o setor.
“O marco regulatório é imprescindível. Você não pode pensar em mexer em uma infraestrutura nacional com é o serviço postal, que está no Brasil inteiro funcionando, sem ter um arcabouço regulatório todo montado, estruturado”, afirma. Seria, em linhas gerias, um processo parecido com o feito na privatização da Telebras, em 1998, quando o governo modificou a legislação, criou a regulação e também uma agência reguladora para fiscalização.
O consultor legislativo da Câmara especialista em telecomunicações consultado pela Gazeta do Povo não acredita que seja necessário fazer um marco regulatório do setor postal, o que seria mais complexo e demandaria mais tempo. Mas reafirma que é preciso mudar a Constituição, se for privatizar o setor postal, e, através de lei complementares, estabelecer como funcionará a prestação do serviço por empresas privadas.
“O ideal é que isso seja bem feito para que não haja qualquer tipo de insegurança dos agentes da economia que dependem dos Correios e para que não haja algum tipo de situação que uma empresa adquira o controle dos Correios e passe a ter um controle vertical do serviço postal e de encomendas”, explicou.
Procurado para saber se está no radar do governo a criação de um marco regulatório do setor, o Ministério da Economia respondeu que, em relação aos estudos em desenvolvimento no BNDES, “há um escopo amplo, contemplando condições regulatórias, modelos de negócio para companhia e para o setor, usando como referência os modelos internacionais explorados até hoje, assim como projeções do setor no futuro.”
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