O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), adiou em uma semana a sessão do Congresso Nacional, postergando, assim, a instalação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar os atos de vandalismo de 8 de janeiro, contra as sedes dos Três Poderes. O motivo citado é a viagem à China. Pacheco deve compor a comitiva oficial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que embarca para Pequim nesta terça-feira (11). Mas além de atrasar a abertura do colegiado, a visita dará ao governo uma última chance de tentar reduzir o largo apoio de congressistas à investigação.
Incialmente marcada para 28 de março, a visita de Lula à China acabou sendo adiada devido à pneumonia do presidente e foi remarcada para a próxima semana. Pacheco, que já havia sido convidado para compor a comitiva presidencial, também deve ir – embora ainda não tenha confirmado presença oficialmente.
A instalação da CPMI terá que esperar o retorno do presidente do Senado, pois cabe a ele convocar a sessão no Congresso e ler o requerimento, assinado por 192 deputados e 37 senadores, para que se iniciem aos trabalhos de investigação parlamentar.
O governo Lula já deixou claro ser contra a CPMI, por entender que ela serviria como palco político para a oposição e porque a investigação sobre os atos em Brasília está sendo feita por outras instituições.
Porém, na sessão plenária da última terça-feira (4), Pacheco admitiu que, caso a viagem se confirme, a sessão conjunta da Câmara e do Senado será mesmo reagendada para 18 de abril. Ele disse que manterá o compromisso que firmou com mais de 200 parlamentares favoráveis à CPMI de ler o requerimento do deputado André Fernandes (PL-CE) na nova data.
“Faremos a sessão do Congresso ao meio-dia do dia 18, com até mais disponibilidade de tempo e quórum”, anunciou ele em resposta ao questionamento feito pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Pacheco também disse que os vetos presidenciais devem ser apreciados na oportunidade. Contudo, existe a possibilidade de que a instalação da comissão possa ser mais uma vez adiada.
Em ocasiões anteriores, Pacheco deixou claro aos parlamentares favoráveis a CPMI que é preciso que a apuração seja “isenta, com fato determinado e número de assinaturas suficientes”. Ele também vem adotando o mesmo tom do governo Lula e do Judiciário sobre o 8 de janeiro, ressaltando o papel da CPMI para apurar os fatos “graves, antidemocráticos e análogos ao terrorismo”.
Como o governo tentará inviabilizar a CPMI do 8 de janeiro
Para Erich Decat, coordenador do time de análise política da corretora Warren Renascença, Pacheco, em associação com o Planalto, ainda tentará inviabilizar a CPMI com medidas protelatórias. Ele prevê que Pacheco usará pretextos e manobras regimentais para retardar a leitura do requerimento, deixando-a sempre à margem da sessão do Congresso, enquanto o governo segue buscando envolver deputados e senadores no processo de enfraquecimento da comissão.
“Quanto mais o 8 de janeiro fica distante no tempo, mais a proposta de CPMI perde força”, avalia.
Além disso, acrescenta Decat, o Congresso deverá acelerar nos próximos dias os embates em torno da agenda econômica, começando pela proposta de uma nova regra fiscal, seguido da reforma tributária e avaliando medidas do governo para elevar a receita tributária, como a taxação de jogos eletrônicos, pré-condição para colocar o novo teto de gastos do governo de pé.
Assessores jurídicos do Senado não veem, contudo, chance de sabotagem da CPMI, pois a leitura do seu requerimento é expediente preliminar da sessão, fora da pauta.
A CPMI é apoiada pela oposição e visa investigar responsáveis e, sobretudo, as autoridades omissas no vandalismo na Praça dos Três Poderes. Desde o começo da busca por assinaturas para o requerimento, o governo tem agido para barrá-la com todos os meios ao seu alcance.
No dia 15, o deputado Fernandes acionou a Procuradoria-Geral da República (PGR) com notícia-crime contra Lula e o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, acusando-os de condicionar o pagamento de emendas individuais ao Orçamento à retirada de apoio à CPMI e de oferecer cargos do segundo escalão.
O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), informou por meio de sua assessoria que não comentaria o tema da comissão. Outros líderes, como Eduardo Braga (AM), do MDB, também seguem a mesma linha, na expectativa de que a comissão não prospere.
Analistas consultados pela Gazeta do Povo constataram que o uso de verbas federais para produzir desistências em apoios à CPMI teve alcance limitado até agora. Isso se deve ao fato de que a parcela mais atraente dos recursos, provenientes do extinto orçamento secreto, foi reservada a deputados de primeiro mandato. No entanto, eles já têm garantidas emendas impositivas nas áreas de saúde e educação, que são obrigatoriamente pagas pela União. Portanto, não veem necessidade de encarar o desgaste de tirar as suas assinaturas para acessar benesses colocadas à mesa.
Os analistas avaliam que o governo só reverteria apoios com mais facilidade se conseguisse avançar nas nomeações políticas de estatais e autarquias, de modo a contemplar demandas de deputados da base. Eles advertem, contudo, para o risco de o PT, partido do presidente e que tem 10 titulares de ministérios, mostre resistência em ceder futuros postos de influência na máquina federal, mesmo que seja para impedir a criação dessa CPMI.
Recentemente o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), facilitou a nomeação de políticos para cargos em empresas públicas ao suspender uma quarentena de três anos prevista na Lei das Estatais. A decisão monocrática, proveniente de uma ação protocolada pelo PCdoB, ainda será analisada pelos demais ministros da corte, mas o julgamento foi suspenso pelo ministro Dias Toffoli na sexta-feira passada (31), o que mantém a validade da liminar de Lewandowski.
Parlamentares da oposição preferem não antecipar a estratégia a ser adotada diante do adiamento na instalação da comissão. O discurso comum ainda é o compromisso de Pacheco de fazer a leitura do requerimento após o feriado da Semana Santa, que acabaria estendido por mais alguns dias ou semanas em razão da viagem do presidente do Senado como integrante de comitiva oficial. Mas pressões podem voltar caso a marcação da sessão siga incerta ou emerja um contexto favorável ao governo.
Espaço de manobra de governistas ficou restrito
Segundo o estrategista político de um partido que está fora da base governista, a retirada de assinaturas agora ficou ainda mais difícil. Para ele, que preferiu não ser identificado nesta matéria, o governo ganhará apenas mais algum tempo tentando adiar o que parece inevitável.
A avaliação leva em conta todo o esforço que os negociadores do Planalto fizeram nas últimas semanas, mediante a liberação de emendas e de cargos de segundo escalão, sem conseguir mudar a posição de sequer metade das duas dezenas a mais de deputados que apoiam o requerimento.
O cerco feito pela oposição para blindar a CPMI também é favorecido pela dificuldade que o próprio Pacheco tem de segurar indefinidamente a sessão do Congresso, em virtude de outras matérias relevantes que precisam ser deliberadas, com vetos presidenciais.
Soma-se a isso crescente insatisfação da própria base, que não se esforçar muito para conter a investigação. Para os oposicionistas, o governo já queimou todos os cartuchos institucionais que dispunha para barrar a iniciativa, restando brigar para tentar emplacar presidente ou relator da CPMI, de modo a tentar minimizar os danos.
A previsão é que a comissão seja composta por 30 membros, sendo metade de suplentes. A composição deve buscar contemplar a proporcionalidade dos partidos ou blocos parlamentares nas duas Casas, e cabe aos líderes indicar representantes após o presidente ler o requerimento de criação.
Depois da instalação, a mesa diretora dos trabalhos será eleita, composta pelo presidente e pelo vice-presidente, eleitos por voto secreto da maioria dos membros da CPMI. O relator será escolhido pelo presidente, respeitando a proporcionalidade partidária.
Inversão de posições entre oposição e governo
Durante os quase dois meses após a invasão das sedes dos três Poderes, o governo mudou radical e rapidamente de posição, passando de defensor inicial da abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado para opositor da iniciativa. Enquanto isso, a oposição investiu fortemente em uma comissão composta por senadores e deputados para investigar se houve omissão do Planalto no dia 8 de janeiro.
A estratégia da oposição ao optar pela CPMI foi combinar o peso dos seus representantes nas duas casas legislativas com a dificuldade do presidente do Congresso em contornar o regimento comum, que manda abrir a comissão durante a sessão conjunta, desde que requisitos formais sejam cumpridos – assinaturas de no mínimo 171 deputados e 27 senadores.
Após o arquivamento da proposta de CPI da senadora Soraya Thronicke (União-MS), que contou com o apoio inicial dos governistas e depois foi sabotada por eles mesmos, os líderes do governo e o ministro das relações institucionais, Alexandre Padilha, estão empenhados em tentar impedir a instalação da CPMI proposta pelo deputado André Fernandes (PL-CE).
Os textos dos dois requerimentos mostram enfoques diferentes sobre os fatos ocorridos na praça que simboliza a República. Enquanto a CPI de Soraya repetia o discurso do governo para rotular os atos como “terroristas, golpistas e antidemocráticos”, a CPMI enfatiza a importância de identificar os responsáveis dentro do devido processo legal, individualizando culpas e dando espaço ao contraditório.
Além disso, a iniciativa do deputado cearense destaca a necessidade de investigar não só os culpados diretos – o que já está sendo feito pela Justiça –, mas especialmente a eventual omissão das autoridades federais no episódio.
Investigações antecipadas e uma segunda CPMI a caminho
Enquanto aguarda a instalação da CPMI, a oposição já antecipa medidas para investigar suposta omissão de autoridades. O recente depoimento do ministro da Justiça, Flávio Dino, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara foi uma amostra dos embates que a CPMI pode produzir. Na ocasião, ele foi questionado sobre a postura do governo no 8 de janeiro.
Integrantes das legendas oposicionistas também estão usando as comissões temáticas da Câmara para exigir explicações da gestão petista, como a de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC) e de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, comandadas pela oposição.
Eles também pretendem criar outra CPMI, focada em investigar o crime organizado. A comissão proposta pelo senador Eduardo Girão (Novo-CE) e outros parlamentares visa investigar organizações criminosas do país e sua relação com os ataques no Rio Grande do Norte e atentados planejados contra o senador Sergio Moro (União-PR). Contudo, o número mínimo de assinaturas para a instalação deste colegiado ainda não foi alcançado.
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