Novas imagens da invasão ao Palácio do Planalto em 8 de janeiro, tornadas públicas neste final de semana após determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), trouxeram mais detalhes sobre a ação dos vândalos e as reações de autoridades federais ao episódio. O governo havia imposto sigilo de cinco anos à integra do material, após uma solicitação de acesso às imagens feita pela imprensa.
Depoimentos de nove agentes do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) à Polícia Federal (PF) neste domingo (23) também ajudaram a ilustrar o que ocorreu na sede do Executivo naquele dia. Veja a seguir as principais revelações sobre o caso.
Principal entrada do Planalto não foi arrombada
As imagens reveladas pelo próprio GSI no sábado (22) mostram um pequeno contingente de agentes civis e militares tentando conter a invasão ao Palácio do Planalto.
Por volta das 15h10, policiais militares tentaram fazer um cordão de isolamento na rampa que dá acesso da Praça dos Três Poderes ao Salão Nobre, porém, sem sucesso. Cerca de 15 minutos depois, a rampa é tomada pelos manifestantes e os militares são vistos recuando, enquanto fazem disparos de gás lacrimogêneo contra a multidão.
A invasão à sede do governo não se deu por este acesso principal do prédio, que fica no segundo piso, mas sim pelo andar térreo.
Também é possível ver que, nesta entrada, após o recuo, um dos vigias encosta a porta principal, mas deixa um vão aberto que posteriormente é ampliado pelos invasores. Outra câmera também flagrou pessoas destruindo computadores e equipamentos no salão, por volta das 15h25.
Agentes do GSI não demonstraram resistência aos invasores
Os invasores tomaram o terceiro andar, onde fica o gabinete presidencial, por volta das 15h30. Poucos agentes do GSI e funcionários são vistos circulando pelo Palácio do Planalto, sem esboçar uma tentativa de reprimir ou prender os manifestantes. O pequeno efetivo da Polícia Militar que estava dentro do Palácio do Planalto só conseguiu retirá-los deste andar por volta das 16h30, usando munição não-letal.
As gravações mostram, também, que um dos agentes do GSI na época, major José Eduardo Natale, ofereceu garrafas de água mineral aos invasores na antessala do gabinete presidencial, sem expressar reação à movimentação deles, apenas com orientações de que deveriam descer – nem mesmo no momento em que um deles pega um extintor de incêndio para usar em novos atos de vandalismo.
Os agentes disseram que adotaram um “protocolo de gerenciamento de crise” para evitar maiores danos que colocariam suas próprias vidas em risco. As afirmações foram dadas em depoimentos de nove militares no domingo (23) e do ex-ministro do GSI, general Marco Edson Gonçalves Dias, que pediu demissão na semana passada após a revelações de imagens que o mostraram circulando pelos corredores do Palácio do Planalto durante a invasão.
Os depoentes disseram ainda que trataram os manifestantes em um tom “amistoso” por conta de “ânimos exaltados”, tentando retirá-los dos terceiro e quarto andares do Palácio para o segundo nos primeiros momentos da invasão, onde deveriam ser presos.
“Indagado porque no 3° e 4° piso conduziu as pessoas e não efetuou pessoalmente a prisão, respondeu que estava fazendo um gerenciamento de crise e essas pessoas seriam presas pelos agentes de segurança no 2° piso tão logo descessem, pois esse era o protocolo”, retratou a PF sobre o depoimento do ex-ministro.
O ex-ministro disse, ainda, que não deu ordem para “evacuar os invasores do prédio, mas se por ventura algum de seus subordinados deu essa ordem, não foi de seu conhecimento”. Ele afirmou, também, que deu ordem de prisão e que “foram efetuadas mais de 200” após a chegada do reforço, contabilizando 487 militares e 520 policiais militares ao fim da operação.
Os primeiros registros de prisões, em vídeo, foram feitos apenas às17h48, mais de uma hora depois de ele ter ordenado aos manifestantes que se dirigissem ao segundo andar do prédio, onde fica o acesso principal do prédio. É preciso ponderar, porém, que nem todas as câmeras do Palácio do Planalto estavam funcionando naquele momento, várias foram destruídas pelos invasores.
As prisões foram registradas minutos depois da chegada do reforço da Polícia Militar ao Planalto, por volta das 17h30. O apoio ocorreu momentos depois que o então secretário executivo do Ministério da Justiça, Ricardo Cappelli, foi nomeado interventor da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal e ordenou a presença de mais policiais e da tropa de choque nas sedes dos Três Poderes.
Presidente se irritou com invasão e ministros discutiram entre si
As imagens reveladas no final de semana também mostram discussões entre os membros do governo, como no momento em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) inspecionou os danos causados ao Palácio do Planalto junto da primeira-dama, Rosângela da Silva, a Janja, de ministros, aliados e outros integrantes do Poder Executivo.
Os ministros Flávio Dino (Justiça), José Múcio (Defesa) e Rui Costa (Casa Civil), parecem ter conversas acaloradas, com dedos apontados e discussões enquanto analisavam os estragos no terceiro andar do prédio.
Em um primeiro momento, Dino se dirigiu a Múcio gesticulando enquanto este estava ao telefone, próximo aos senadores Jaques Wagner (PT-BA) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP), aliados do governo. Depois, o ministro da Justiça sai de cena e é Costa quem começa a discutir com seu par da Defesa.
Embora as imagens não tenham registrado o áudio das conversas, o ministro da Defesa foi cobrado por outros integrantes do governo pela retirada do acampamento montado em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília. O presidente havia determinado a desmobilização ainda naquele dia, mas a desocupação só ocorreu na manhã seguinte.
Agentes do GSI pararam de trabalhar em meio à invasão
Outro trecho das gravações mostra militares do GSI abrigados em um dos anexos ao Palácio do Planalto sem atuar na contenção aos manifestantes durante a invasão ao prédio principal. O registro foi feito por volta das 16h20 e mostra agentes desmobilizando equipamentos como escudos e capacetes enquanto mexem nos telefones celulares sem expressar preocupação com o que ocorria a poucos metros de distância.
Pouco depois, por volta das 16h34, militares da Força Nacional de Segurança passam entre eles com cães farejadores e, novamente, não expressam reação. Minutos depois, um dos agentes do GSI faz um aceno com as mãos que provoca risos, seguido de outro mostrando algo na tela do celular, em um clima de descontração – seis agentes formam um círculo para assistir ao que é exibido no aparelho.
Por volta das 17h07, militares do GSI aparecem sentados nas cadeiras do anexo como se estivessem aguardando ordens para voltar a agir. Seis minutos depois, os agentes começam a sair do anexo carregando caixas de equipamentos.
Ex-ministro diz que houve “apagão geral” do sistema
O baixo efetivo de segurança no Palácio do Planalto foi justificado por Gonçalves Dias por um “apagão geral do sistema pela falta de informações para a tomada de decisões”. No depoimento à Polícia Federal, ele disse que os relatórios da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) não informaram o grau da classificação de risco para o dia das autoridades.
“Indagado se recebeu informações de inteligência da Abin a respeito do aumento de fluxo de ônibus e chegada de pessoas após 6 de Janeiro a BSB [Brasília], informou que não recebeu qualquer relatório de inteligência”, relata a PF sobre o depoimento.
E reclamou, ainda, que o GSI não havia sido chamado pela Secretaria de Segurança Pública do DF para participar da elaboração do esquema de segurança para aquele dia, em que haveria a manifestação dos integrantes do movimento acampados em frente ao QG do Exército.
As dúvidas levantadas sobre a atuação do GSI, no entanto, não mudaram a imagem de “homem de confiança” que Gonçalves Dias tinha com o presidente Lula. Em entrevista publicada no fim de semana, Ricardo Cappelli disse que as imagens divulgadas na íntegra vão demonstrar que “não há qualquer possibilidade de ilação” à conduta dele.
“O general Gonçalves Dias é um servidor com décadas de serviços prestados ao Estado brasileiro. Agora é muito importante que as pessoas vejam as imagens sem os cortes, sem a edição, porque foram feitos cortes com claro intuito de atingir o governo e o general”, disse.
Já o presidente apenas se limitou a falar que o ex-ministro “saiu por conta própria”, sem entrar em detalhes sobre a conduta do aliado.
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