O ministro Fernando Haddad, da Fazenda, errou ao dizer, na última segunda (25), que o Brasil poderia ser barrado de entrar na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) – conhecida como o “clube dos ricos” – se não restituísse o chamado “voto de qualidade” ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).
A fala foi concedida a jornalistas após a participação em um evento promovido pelo Centro de Estudos do Novo Desenvolvimentismo da FGV-EAESP, em que disse ter recebido uma carta da organização de que a adesão do Brasil deixaria de ser discutida. A afirmação, no entanto, não condiz com a realidade, como revelado pela Gazeta do Povo em abril.
“É uma coisa que a OCDE chegou a mandar uma carta para a gente dizendo o seguinte: 'se mantiver essa regra, nós não vamos mais discutir a entrada do Brasil na OCDE'. Uma carta formal, que foi endereçada a todos os parlamentares no Congresso Nacional. E nós conseguimos reaver o chamado voto de qualidade”, disse Haddad no evento.
No entanto, Haddad disseminou uma fake news ao citar a suposta ameaça da OCDE à adesão do Brasil. A carta enviada ao governo do país no final do mês de março apenas faz um diagnóstico de como o “voto de qualidade” impactaria nos contribuintes brasileiros e se há semelhança em outros países que fazem parte da organização.
O documento é assinado pela diretora da OCDE, Grace Perez-Navarro, emitido após uma consulta feita por Haddad. Ela afirmou que não há paralelo entre os países avaliados de adoção do mesmo mecanismo em vigor no Brasil. A retomada do “voto de qualidade”, no entanto, não prejudicaria os contribuintes, mas também não imporia nenhuma sanção à adesão.
“O secretariado da OCDE continuará o processo de consulta de dados sobre estes recursos administrativos fiscais e práticas para compartilhá-las. Também estamos prontos para fornecer mais informações em práticas e experiências internacionais que também podem ser úteis”, mencionou a entidade na carta (veja na íntegra).
A carta da OCDE faz, ainda, uma ampla análise sobre como funcionava o Carf sem o “voto de qualidade” e as vantagens de adotar o mecanismo, diminuindo o tempo de litígios “intermináveis”.
Esta não foi a primeira vez que Haddad errou ao citar o documento fora do contexto original. Em maio, durante uma audiência pública, o ministro afirmou que a OCDE iria “suspender o processo de adesão, porque nós vamos ter problemas com uma regra administrativa dessa”.
A retomada do “voto de qualidade” faz parte de uma das estratégias do governo para aumentar a arrecadação de impostos e cumprir a promessa de diminuir até zerar o déficit das contas públicas, mas sem cortar despesas. A expectativa é de que o mecanismo injete mais de R$ 54 bilhões nos cofres em 2024.
Mais recentemente, Haddad gerou revolta de conselheiros representantes de contribuintes no Carf ao compará-los a “detentos” nos processos que tramitam no conselho. Ele disse que as ações eram julgadas por “quatro delegados e quatro detentos” que decidiam por um “habeas corpus”, “sendo que o empate favorece o detento”.
Isso porque, sem o “voto de qualidade”, os empates nas disputas tributárias beneficiavam os contribuintes, e agora passam a ser favoráveis ao governo.
A Gazeta do Povo entrou em contato com o Ministério da Fazenda sobre as declarações do ministro Fernando Haddad, e aguarda retorno.
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