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Fernando Haddad
Ministro da Fazenda vê que essa dificuldade abriu espaço para o questionamento de movimentos de direita.| Foto: Fábio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil

O ministro Fernando Haddad, da Fazenda, reconheceu que a esquerda brasileira – seu próprio partido, o PT, principalmente – vem enfrentando uma grande dificuldade de pensar em um projeto de futuro desde a crise financeira de 2008, em que os movimentos de direita em todo o mundo passaram a questionar os sucessivos solavancos das políticas progressistas e neoliberais.

Essa dificuldade, na visão dele, abriu um vácuo para a direita e a “extrema-direita”, e que a esquerda não se preparou para uma renovação após aquela crise. E isso aconteceu tanto no Brasil, no segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) – que dizia que a crise seria apenas uma “marolinha” – como no resto do mundo.

“A esquerda não estava preparada para 2008, com um programa renovado, com um sonho renovado. [...] E, a bem da verdade, a esquerda ainda não está dialogando com um projeto de futuro. Quando você não tem um sonho, um horizonte utópico que guia as pessoas, você tem um horizonte distópico. E a extrema direita é distópica”, disse Haddad em uma entrevista publicada pela Folha de S. Paulo nesta sexta (18).

Haddad ressaltou que a política sempre foi sobre promessas e projetos, mas que hoje o mundo está “devendo para si mesmo horizontes emancipatórios”, o que abre espaço para, na visão dele, figuras populistas e movimentos extremistas.

O ministro também criticou a falta de uma reflexão mais profunda dentro do campo progressista, com a necessidade da esquerda fazer uma autocrítica e formular novas propostas para a sociedade.

“A esquerda está se devendo a isso. Mais formulação teórica, mais aprendizado, mais ousadia na reflexão sobre o que é possível fazer”, afirmou.

Haddad vê na ausência dessa reflexão um dos motivos para o crescimento de movimentos e figuras que, segundo ele, são produtos de um contexto de crise e de uma nova mídia, como as redes sociais – “quando isso acontece, e já aconteceu cem anos atrás, a distopia toma conta”.

“Os clowns [palhaços] tomam conta do picadeiro. E começam a surgir esses movimentos que assustam. E nos perguntamos: ‘De onde saiu essa pessoa? De onde saiu esse sujeito? Como é que essa pessoa tem 30% dos votos?’”, questionou.

“Direita iliberal”

O ministro da Fazenda também mencionou que a crise não afeta apenas a esquerda, mas também o liberalismo, que, em sua opinião, está em crise e sendo substituído por uma “direita iliberal”, com práticas que, no Brasil, ganham “requintes de crueldade”. Ele criticou as privatizações recentes, como as da Eletrobras e Sabesp, considerando-as “escandalosas” sob qualquer análise internacional isenta.

Sobre o futuro da esquerda e o papel de Lula, Haddad afirmou que o presidente ainda desempenha um papel central como líder do campo progressista, mas fez um alerta sobre a necessidade de renovação.

“Desde 2016, eu já dizia que, se a esquerda não se reformular, não expandir os seus horizontes, não oxigenar o debate político, vai sofrer os efeitos da crise política atual”, disse reconhecendo que a esquerda quase ficou de fora do segundo turno nas eleições presidenciais de 2018, e que, embora tenha conseguido se manter competitiva, a margem foi estreita tanto no nível federal quanto no municipal.

Fernando Haddad ainda fez uma autocrítica sobre o que o PT e Lula estão oferecendo como projeto de futuro. Ele se diz pertencente “ao campo progressista”, mas reconhece que é preciso congregar ideias e que a esquerda precisa de um novo projeto “para evitar distopia, você precisa ter uma utopia”.

Ele vê em Lula a liderança mais animada e capaz de reunir condições políticas para buscar a reeleição, mas reconhece que é cedo para prever se essa renovação será centrada no atual presidente.

Sucessão em 2026

Apesar do diagnóstico de que a esquerda precisa se renovar, Haddad não acredita que o “grupo extremista” da direita tenha sido isolado após as eleições municipais, especialmente em São Paulo. Para ele, figuras como Michelle Bolsonaro (PL), Tarcísio de Freitas (Republicanos), Romeu Zema (Novo) e Ronaldo Caiado (União), que estão despontando como possíveis candidatos à presidência, ainda representam o bolsonarismo, mesmo que haja brigas internas.

“Não tem ali uma disputa ideológica. É um grupo extremista”, afirmou.

Por fim, Haddad refletiu sobre a configuração política atual, destacando que o Centrão, como era conhecido o grupo de partidos que negociam com todos os governos da vez, praticamente desapareceu e foi substituído por uma nova realidade, na qual o PL, partido de Jair Bolsonaro, desempenha um papel central na direita.

“O PL não é Centrão. Ele é o partido do Bolsonaro”, concluiu o ministro.

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