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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem investido na aproximação com governadores para tentar ampliar a base do governo no Congresso Nacional. A troca de apoio passa pelas negociações para recompor o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e pela liberação de verbas para obras no estados.
Nos cálculos de lideranças do Palácio do Planalto, os governadores exercem certa influência sobre as bancadas de deputados e senadores em seus estados. Com isso, um alinhamento com o presidente Lula poderia atrair parlamentares para a base do governo em votações estratégicas, como a reforma tributária e o novo arcabouço fiscal que será apresentado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ainda nesse semestre.
Lula fez um encontro com todos os governadores no final de janeiro e indicou que não fará distinção entre aqueles que o apoiam ou fazem oposição ao governo federal. Na ocasião, os governantes apresentaram suas demandas e, desde então, técnicos do Planalto estão trabalhando nas pautas prioritárias.
Entre elas está a recomposição das alíquotas do ICMS, que passou a ser uma das prioridades do Palácio do Planalto junto aos governadores. Os chefes dos Executivos estaduais querem que o governo federal compense o rombo nos cofres dos estados, na ordem de R$ 38,6 bilhões. Na semana passada, Haddad esteve reunido com sete governadores de diferentes partidos e indicou que medida que fixou alíquota do ICMS e reduziu preço dos combustíveis foi ''lambança'' do governo anterior.
Recomposição do ICMS visa apoio para pautas no Congresso
No ano passado, o governo do então presidente Jair Bolsonaro (PL) encaminhou e aprovou no Congresso duas leis que impuseram mudanças na base de cálculo do tributo estadual sobre combustíveis, energia e telecomunicações. Com a medida, a alíquota passou a ser unificada, variando entre 17% e 18%.
Aos governadores, Haddad indicou que o Palácio do Planalto está empenhado em achar uma alternativa que atenda os estados. Uma das possibilidades seria a compensação pela perda de arrecadação dos valores retroativos ao segundo semestre de 2022 em até quatro anos.
Outro ponto defendido foi a imediata execução de uma portaria editada pelo próprio Ministério da Economia, em setembro do ano passado, que prevê a compensação caso a queda de receita seja acima de 5%. Com essa estimativa, a União desembolsaria cerca de 18 bilhões de reais na transferência de recursos.
O encontro reuniu os chefes do Executivo de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos); do Amazonas, Wilson Lima (União); do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB); do Maranhão, Carlos Brandão (PSB); do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB); e o do Piauí, Rafael Fonteles (PT).
"A gente sabe que a União tem seus próprios desafios fiscais e sabemos da situação difícil dos estados. Temos disposição de negociar uma solução que não sobreonere a União, mas que também não deixe os estados numa situação difícil", disse Eduardo Leite após o encontro.
Paralelamente, Haddad pediu apoio aos governadores para que o Congresso Nacional aprove as medidas de recuperação econômica. Além da proposta de reforma tributária e da proposta que vai substituir o teto de gastos, o Planalto tenta manter o texto da medida provisória editada por Lula que muda as regras de julgamento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Como a Gazeta do Povo mostrou, a MP enfrenta resistência por parte dos congressistas.
Estratégia de aproximação de Lula mira governadores aliados de Bolsonaro
Além do encontro de Haddad com Tarcísio para tratar da recomposição do ICMS, Lula esteve ao lado do governador paulista durante o feriado de carnaval para tratar das ações de recuperação do litoral norte de São Paulo após as fortes chuvas que atingiram a região. Durante seu discurso, Lula celebrou a união com Tarcísio durante o momento de crise.
"Essa parceria que estamos fazendo é uma fotografia boa para o nosso país. Eu sei em que partido Tarcísio disputou as eleições, vocês sabem em que partido eu disputei as eleições e veja que coisa bonita e simples: nós estamos juntos. Acabou a eleição", disse Lula puxando para seu lado Tarcísio e Felipe Augusto (PSDB), prefeito da cidade de São Sebastião (SP).
Além de Tarcísio, os articuladores de Lula também estão buscando se aproximar de outros governadores ligados ao governo anterior. Entre eles, os governadores Cláudio Castro (Rio de Janeiro), Mauro Mendes (Mato Grosso) e Ronaldo Caiado (Goiás).
"Lula reforça a importância da democracia e diz que questões políticas não podem estar acima do interesse da população", defendeu o senador Humberto Costa (PT-PE).
Recentemente, durante uma visita ao Rio de Janeiro, Lula indicou que pretende trabalhar ao lado de Castro para levar mais investimentos para o estado, que é reduto eleitoral da família Bolsonaro. Castro integra o mesmo partido de Bolsonaro, o PL, mas vem negociando uma filiação a outros partidos, entre eles o PSD, que conta com três ministérios no governo Lula.
“O que importa é que temos maturidade, presidente Lula, pois juntos temos a missão de trabalhar para esse povo”, disse Castro na ocasião.
O Palácio do Planalto criou o Conselho da Federação, uma entidade que terá Lula, o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), ministros, governadores e prefeitos e que vai organizar uma agenda prioritária de obras e parcerias.
Tarcísio apresentou como demanda, por exemplo, a concessão do Porto de Santos, obras como o Túnel Santos-Guarujá, investimentos em trens e metrôs, renegociação de dívidas de hospitais com bancos federais e mais verbas para a saúde. Já Mauro Mendes cobrou o destravamento da implantação do Ferrogrão em Mato Grosso.
Lula ampliou pressão para ampliar base do governo no Congresso Nacional
A avaliação dos articuladores de Lula é de que esse movimento será determinante para que os governadores articulem pelo governo federal junto aos deputados e senadores no Congresso Nacional. Até o momento, integrantes do governo não indicam qual seria o tamanho da base de apoio de Lula no Congresso Nacional.
Recentemente, durante uma reunião do conselho político, Lula disse que a falta de uma base fora dos partidos de esquerda pode deixar “mais caro” aprovar as medidas no Legislativo.
"Nós precisamos ser mais precisos, porque quanto mais a gente demora para encontrar uma solução, seja num acordo simples de votação de uma medida provisória, de um projeto de lei, de uma emenda constitucional, quanto mais tempo passa, mais fica caro você aprovar aquelas coisas. Ou seja, fica muito mais crivada entre nós a desarmonia e nós não queremos desarmonia”, afirmou Lula.
Estima-se que o apoio atual seja de 228 deputados e de cerca de 40 senadores. Assim, o governo teria dificuldades para aprovar, por exemplo, uma proposta de emenda constitucional, que depende dos votos de 308 deputados e 49 senadores.